Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2017-12-18
Resumo
INTRODUÇÃO: Falar sobre a morte não é uma tarefa fácil, tais palavras acionam mecanismos cerebrais que afloram nossas referências de vida. Aceitar o fato de que nossa existência, assim como a das pessoas que amamos, tem um “prazo de validade” desconhecido é árduo, e esse medo do desconhecido torna a morte uma questão difícil de ser discutida, enfrentada e pesquisada. A morte em si significa a interrupção definitiva da vida de um organismo, porém, pode ter outros significados de acordo com cada pessoa, cultura, e outros fatores, modificando assim a forma como cada indivíduo lida com esse processo. A morte e o morrer são mais que eventos simplesmente biológicos, eles possuem dimensões sociais, psicológicas, físicas, culturais, antropológicas, pedagógicas, religiosas/espirituais e sobre eles recaem inúmeros sentidos, ritos e crenças. A Tanatologia é a ciência ou estudo da morte em seus aspectos psicológicos e sociais, que busca também entender o processo de luto, não enfocando seu estudo apenas na complexidade da morte, mas também nos desdobramentos desta, no que diz respeito às perdas e como as pessoas lidam com as mesmas. O morrer no âmbito hospitalar desafia os profissionais de saúde a lidarem com todo o cenário e as pessoas envolvidas, cabendo a eles a responsabilidade de manter o controle da situação. Ao ingressar na Universidade, os acadêmicos da área da saúde são surpreendidos com a naturalidade com que a morte e o processo de morrer são abordados durante a vivência acadêmica. No decorrer desse processo de formação de profissionais de saúde, muito se fala sobre morte, porém, a abordagem é quase sempre voltada para o aspecto de evitá-la, dispondo de métodos científicos e condutas que previnam esse evento. Contudo, há situações em que a morte não pode ser evitada, muito menos prevenida, haja vista que se trata de um processo natural. Todavia, a crescente institucionalização da morte, associada à baixa relevância conferida ao estudo da mesma nos cursos de graduação da área de saúde, levanta a seguinte questão: estariam os futuros profissionais de saúde preparados para conviver com os pacientes à beira da morte, compreendê-los e prestar-lhes a melhor assistência? A partir dessas colocações, questiona-se ainda, como o profissional de saúde lidará com esses eventos se durante a formação acadêmica não foi enfatizado o que fazer quando a morte não pode ser evitada? Vale ressaltar que a assistência não termina após o óbito, é neste âmbito que se destaca a importância do diálogo sobre morte/morrer durante o processo de formação dos profissionais de saúde, pois há necessidade de inserção de mais diálogos sobre a temática durante a formação acadêmica, a fim de formar profissionais aptos e capacitados para lidar com essa realidade, garantindo uma assistência de qualidade e melhor enfrentamento por parte do profissional. OBJETIVO: Relatar a experiência vivenciada por acadêmicos da área da saúde que cursaram a disciplina Tanatologia. METODOLOGIA: Trata-se de relato de experiência produzido a partir da vivência na disciplina optativa Tanatologia, ofertada durante o ano de 2016 no período de agosto a dezembro, aos alunos dos cursos de Enfermagem, Odontologia e Medicina, da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESA) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). A disciplina abordou os seguintes temas: construção história do processo de morte e morrer; principais teorias psicológicas sobre a morte/morrer; cuidados paliativos; comunicação de notícias difíceis com base no protocolo Spikes, visando melhorar a tarefa de transmiti-las; humanização das práticas de cuidado e os ritos; formas de morrer; suicídio e comportamento suicida. A disciplina buscou desenvolver nos discentes habilidades e competências para interpretar concepções de vida e morte presentes na assistência em saúde contemporânea, bem como problematizar serviços oferecidos e construir novas formas de atuação. Foram utilizadas metodologias ativas, destacando-se problematizações, mesas redondas, rodas de conversa, exposição de fotos e opiniões diante do tema, aulas de campo/visita ao cemitério, relato de vivências, encenação/aula vivencial sobre ritos e expressão obrigatória dos sentimentos, quando foi realizado um teatro pelos alunos no qual cada grupo era responsável por representar uma cultura, a fim de conscientizar os alunos diante das diferenças de significados do processo morte/morrer de acordo com as peculiaridades culturais, sociais e religiosas, além de aulas expositivas dialogadas. Dentre as estratégias de ensino foram utilizados recursos como: projetor de imagem, notebook, vídeos, documentários e filmes, como por exemplo o documentário ‘The bridge’ (“A ponte”), seguido de debate, com intuito de favorecer didaticamente o aprendizado dos alunos. RESULTADOS: No decorrer da disciplina, o processo de morte/morrer foi abordado em suas diversas dimensões, proporcionando experiências únicas aos alunos. Contudo, por ser uma disciplina optativa, ou seja, não estar inclusa na matriz curricular, a adesão não foi significativamente grande, apesar de se tratar de uma temática de relevância e importância para os futuros profissionais da área da saúde. Os temas abordados na disciplina ampliaram o olhar dos discentes sobre o processo de morte/morrer, pois, incialmente, era notório o desconhecimento acerca do conteúdo, devido a morte ser considerada um tabu tanto no ambiente acadêmico quanto na sociedade em geral. Inicialmente, havia temor em relação ao tema por parte dos estudantes, aliado ao primeiro contato com o diálogo direto sobre morte. Porém, ao longo da disciplina foi perceptível o impacto e a aceitação após o conhecimento do que realmente se tratava, observando-se grande interesse por parte dos discentes, através da ativa participação durante as aulas, especialmente, nas aulas em que as metodologias ativas eram implementadas. A partir de então, os alunos demonstraram compreender a importância de se conversar sobre morte em todas as esferas sociais, perceberam que a morte e o luto podem ser enfrentados de diferentes formas as quais devem ser levadas em consideração durante o processo de cuidar; a importância de um diálogo adequado na comunicação de notícias difíceis, direcionando a atuação dos discentes frente a essa necessidade, respeitando os aspectos biopsicossociais e espirituais de cada cliente e seus familiares; despertaram sobre a necessidade de humanização da assistência em casos de tentativa de suicídio e situações relacionadas, sendo instigados a repensar o tabu construído pela sociedade referente ao tema. Os conteúdos abordados e as atividades acadêmicas desenvolvidas no decorrer da disciplina Tanatologia, contribuíram para a desmistificação da visão da morte como algo sombrio e sempre negativo. CONCLUSÃO: Salienta-se a importância da necessidade de ampliar a discussão da temática tanto em sala de aula quanto em campo de estágio, pois, durante a formação acadêmica, a ênfase recai sobre os procedimentos técnicos e o cuidado do corpo físico, deixando uma lacuna no que diz respeito ao cuidado psicossocial e a terminalidade da vida. Não restam dúvidas de que a experiência vivenciada na disciplina ampliou o olhar dos futuros profissionais da saúde sobre a temática, conferindo mais confiança para dialogar tanto com os clientes quanto com seus familiares, pois a morte é algo que sempre estará presente no cotidiano pessoal e profissional. Portanto, é preciso que o processo de formação desses profissionais facilite o enfrentamento, buscando estratégias de ensino e aprendizagem para amenizar sentimentos de medo, impotência, insegurança, através da implementação de disciplinas tal como esta, que aborda assuntos relacionados ao processo de morte e morrer, visando promover o preparo do futuro profissional de saúde, ainda na graduação, para assegurar uma assistência qualificada e profissionais com visão holística em relação ao ser humano.