Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Uma análise do processo de trabalho de uma equipe do Núcleo de Apoio à Saúde da Família
Arthur Grangeiro do Nascimento, Joselma Cavalcanti Cordeiro

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


Apresentação: O Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF), criado através da portaria 154/2008, constitui-se como mais um esforço de reestruturação do processo de trabalho em saúde. Tem o objetivo de apoiar a Equipe de Saúde da Família (ESF) ampliando o escopo de atuação das equipes, proporcionar uma retaguarda especializada nas ações de saúde e de aumentar a resolutividade do cuidado em saúde na atenção básica. O modo de organizar o processo de trabalho do NASF é norteado, principalmente, pela lógica do apoio matricial, clínica ampliada, cogestão e por ferramentas que subsidiem o trabalho como, por exemplo, o Projeto de saúde no território e o Projeto Terapêutico Singular

Perguntar-se como se desenvolve o processo de trabalho das equipes NASF e buscar meios de fortalecer esse modelo constitui uma atitude necessária para a transformação do modo de produzir saúde. Por isso, o presente artigo tem o objetivo de analisar a micropolítica do processo de trabalho de uma equipe Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF) como subsídio ao planejamento de sua reorganização e estratégia de educação permanente em saúde.

Método do estudo: O presente trabalho é parte de uma “pesquisa-ação” realizada durante a experiência de um dos autores em um Programa de Residência Multiprofissional em Saúde. Trata-se de uma pesquisa de caráter analítico-descritiva, onde os observados também foram os observadores e fizeram, coletivamente, a análise do processo de trabalho do NASF no formato de grupos focais. Os sujeitos da pesquisa foram os profissionais de uma equipe NASF, implantado no ano de 2010, responsável por apoiar 9 equipes de saúde da família distribuídas em 4 Unidades Básicas de Saúde, de um município de Pernambuco, composta por uma Assistente Social, uma Nutricionista, um Psicólogo, duas fisioterapeutas, uma Farmacêutica e uma Fonoaudióloga. Quanto aos vínculos empregatícios, apenas um profissional da equipe possui vínculo estável através de concurso público, enquanto os demais são contratos sem garantia de estabilidade. Em relação à formação especializada na área, dois profissionais possuem título de especialista em Saúde da Família, através de Programa de Residência em Saúde da Família.

O estudo foi dividido em três momentos: 1- Descrição do processo de trabalho, 2- Identificação e priorização dos problemas, 3- Construção de alternativas. Entretanto, o presente trabalho irá discutir apenas o primeiro momento da pesquisa-ação, que foi o processo de descrição e análise do processo de trabalho da equipe.

Uma técnica de coleta de dados utilizada foi a do grupo focal por estar de acordo os objetivos de análise do presente estudo e da transformação de práticas de saúde, configurando, assim, um espaço propício para educação permanente.

Para auxiliar na coleta de dados se utilizou os mapas analíticos, um instrumento para análise do processo de trabalho para ser utilizado pelos próprios trabalhadores no cotidiano de seus serviços. Com o objetivo de disparar e registrar as discussões, eles foram utilizados como ponto de partida do processo de análise e construídos em todo o primeiro momento em três eixos: descrição dos elementos do processo de trabalho: os agentes, os instrumentos, os objetivos, os produtos e objetos de trabalho; potencialidades e dificuldades; atos inúteis e indispensáveis. Todo o processo foi gravado, transcrito e submetido à análise dos dados.

O procedimento utilizado para tratamento dos dados coletados foi a do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). É uma técnica de tabulação e organização de dados qualitativos que permite agregar depoimentos sem reduzi-los a quantidades, consiste em analisar o material verbal dos discursos proferidos pelos participantes da pesquisa extraindo de cada um deles “expressões-chave”, “ancoragens” e “ideias centrais” semelhantes para compor “discursos sínteses”. A elaboração do DSC necessita de algumas figuras metodológicas:

A construção do DSC se deu a partir de expressões-chave que agregavam ideias centrais consensuais no grupo pesquisado. As opiniões individuais e dissensos não compõe a construção do discurso. Com o discurso síntese construído, se tece comentários interpretativos de acordo com o referencial teórico adotado, tendo como parâmetro de comparação o preconizado pelo Ministério da Saúde (MS) no Caderno de Atenção Básica nº 39.

 

 

Resultados: Os resultados foram categorizados em cinco ideias centrais:

  1. Concepção de saúde
  2. Cultura assistencialista e a aceitação do NASF
  3. Características e dinâmica do trabalho em equipe
  4. Tecnologias de trabalho e a proposta do NASF: dos atos inúteis aos indispensáveis
  5. Construção da agenda, planejamento, (des)vigilância em saúde e rede de serviços

 

O conteúdo de cada ideia central revelou que as concepções expressadas no discurso da equipe são de um “dever ser” pautado pela clínica ampliada, trabalho em equipe, colocando como tecnologia central o matriciamento e tendo as reuniões de equipe como espaço privilegiado para utilizá-lo. A dificuldade encontrada foi transformar o “dever ser” em “fazeres”. As principais dificuldades envolvem o matriciamento, o trabalho fragmentado e com foco assistencialista, a dinâmica das pactuações realizadas nas reuniões de equipe, a utilização de instrumentos de abordagem familiar e territorial. Fatores internos e externos à equipe influenciam na situação apresentada e é de extrema importância que ambos sejam enfrentados de maneira estratégica, partindo do diagnóstico realizado pela própria equipe, contribuindo para o fortalecimento do trabalho do NASF. O problema prioritário destacado pela equipe foi o pouco espaço de atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde na agenda da equipe, contudo, outros pontos de grande importância se revelaram como a não utilização de tecnologias de análise e intervenção familiar e populacional, e a escassa prática de planejamento das práticas. Pontos necessários para o alcance de resolutividade no trabalho do NASF e que configuram um escopo de atuação para transformação do processo de trabalho.

 

Considerações Finais: A descrição dos elementos do processo de trabalho revelou uma percepção concordante com o CAB 39 em relação aos agentes e objetos do trabalho do NASF. A percepção das finalidades e produtos foi muito semelhante aos do parâmetro utilizado, entretanto, reconhecem a dificuldade que se alcançar a resolutividade esperada. Quanto aos instrumentos de trabalho é consenso o foco em tecnologias leve-duras voltadas para aspectos burocráticos e consideradas inúteis para toda equipe. As demandas que mais compõe a agenda da equipe são assistenciais e, apesar de reconhecerem a necessidade do trabalho de vigilância da saúde, não há tecnologias ou comportamentos para organização da demanda baseado no território. O estudo contribui para compreender a dinâmica do trabalho nesta equipe NASF, e seus achados são corroborados com outros estudos encontrados na literatura científica. Cabe destacar que, para além dos aspectos internos à equipe, outro ponto precisa ser qualificado para que o modelo de atenção do NASF se fortaleça: a condução da gestão do processo de trabalho precisa ser permanente sobre os pontos aqui discutidos, integrando o NASF, a equipe de saúde da família, a comunidade e os gestores, de modo que haja uma sistematização de informação e de planejamento estratégico, necessário para a atuação dos profissionais nas mudanças e aperfeiçoamento do processo de trabalho voltado para outro paradigma.