Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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JOVENS HOMENS QUE FAZEM SEXO COM HOMENS: A ATUALIDADE DA EPIDEMIA DE HIV/AIDS NO BRASIL
Diego da Silva Medeiros, Malena Gadelha Cavalcante, João Bosco Feitosa dos Santos, Paulo César de Almeida

Última alteração: 2017-12-21

Resumo


Apresentação: A quarta década da epidemia de aids traz alguns desafios para as análises sociológicas e de Saúde Coletiva. A tecnologia no campo da aids teve avanços significativos, no diagnóstico e no tratamento medicamentoso fomentando grande vivacidade à discussão no campo e esperança às pessoas que vivem com HIV/aids (PVHA). No entanto, este agravo, ainda hoje, é profundamente marcado pelo estigma, preconceito e discriminação que tornam complexo o enfrentamento da epidemia, requerendo um olhar ampliado. No Brasil, segundo Boletim Epidemiológico de 2017, estudos preliminares apontam que os homens que fazem sexo com homens (HSH) possuem uma taxa de prevalência de 19,8% e os jovens HSH de 18 a 24 anos de 9,4%, em contrapartida, a população geral de homens possui 0,7% e de homens jovens de 17 a 21 anos de 0,1%. Entre os homens jovens da faixa etária de 15 a 24 anos, as taxas de detecção apresentam aumento significativo. Entre os homens, nos últimos dez anos, destaca-se o aumento das infecções entre jovens de 15 a 24 anos, sendo que de 2006 para 2015 a taxa entre aqueles com 15 a 19 anos mais que triplicou (de 2,4 para 6,9 casos/100 mil hab.) e, entre os de 20 a 24, dobrou (de 15,9 para 33,1 casos/100 mil hab.). Os dados oficiais apontam para o incremento da infecção de HIV/aids entre os jovens de 15 a 24 anos, superior, inclusive, as outras faixas etárias. Este recorte etário se enquadra no segmento de adolescentes e jovens da Organização das Nações Unidas (ONU) para fins estatísticos e políticos. Este cenário se constitui diante de uma onda conservadora que toma força no Brasil. A investida de segmentos biomédicos capitaneados pelo slogan “testar e tratar” torna-se hegemônico na resposta brasileira à epidemia. A disseminação de técnicas de diagnóstico como testes rápidos (TR), profilaxia pré-exposição (Prep), tratamento como prevenção (Tasp) e combinação de medicamentos em um único comprimido são ilustrativos deste cenário. O objetivo desta pesquisa é a compreensão do porquê a epidemia de HIV/aids tem recrudescido entre jovens HSH entre 15 e 24 anos. Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de um estudo bibliográfico, cuja trajetória metodológica percorrida apoiou-se na leitura exploratória e seletiva do material de pesquisa, bem como em sua revisão integrativa-narrativa. O levantamento dos artigos foi realizado em junho de 2017, através dos descritores “aids” e “hsh”. Utilizou-se como base de dados o Portal Periódicos Capes e a busca foi definida para artigos completos em português, produzidos nos últimos cinco anos. Foram excluídos os trabalhos repetidos, os editoriais e os que estavam fora da temporalidade. Os artigos enquadrados nos referidos critérios foram considerados potencialmente relevantes. Após o levantamento bibliográfico, realizou-se a leitura exploratória do material encontrado, objetivando obter um panorama brasileiro sobre o tema. Resultados: A política pública que se dedica à prática de prevenção, promoção e tratamento às populações de HSH por vezes se insere em amarras de prescrições de cuidado que buscam regular o corpo, bem como suas práticas sexuais. A vida das pessoas, no entanto, não se processa por protocolos. A complexidade de uma vida e a multiplicidade de interações que ela suscita nas redes sociais das populações mais vulneráveis requer ferramentas mais autônomas para serem utilizadas pelos profissionais de saúde; o cuidado protocolar ainda tem a hegemonia nos atendimentos desde a testagem/diagnóstico até o tratamento nos serviços especializados em HIV/aids. As políticas públicas precisam incidir nas dimensões individual, social e programática, as quais estão profundamente interligadas quando tratamos da temática do HIV/aids. A epidemia tem avançado sobre os jovens homens, mais precisamente, os HSH. Na seara individual há um baixo autocuidado por parte destes jovens, os insumos de prevenção, todavia, devem estar disponíveis sem barreiras de acesso. As escolas ainda apresentam dificuldades em tratar da temática da sexualidade e das IST e o acesso aos serviços de saúde apresenta-se precário em virtude de fatores sociais como os modelos de masculinidade e juventude que exaltam a potência e negam a “fraqueza”. O discurso que justifica o avanço da epidemia de aids entre os adolescentes e jovens somente com o argumento que os mesmos não dispõem de informações sobre prevenção ou uso correto do preservativo não atende à complexidade do fenômeno. A persistência de preconceitos e discriminações associada ao discurso hegemônico da heteronormatividade pode contribuir para a ausência de cuidado adequado aos jovens homossexuais nos serviços de saúde. Os adolescentes e jovens HSH associam alguns sentidos quando se reportam às IST e aids: a sensação que o uso do preservativo pode diminuir a sensibilidade e consequentemente o prazer; a parada para colocar o preservativo dificulta a ereção e é preciso dar mostras de potência sexual; os homens seriam mais descontrolados sexualmente, precisam ser viris; as primeiras relações sexuais são mais propícias a não utilização pela postura submissa, o medo de perder o parceiro e o momento de prazer; os conhecidos e parceiros fixos são mais confiáveis, a confiança dispensa o uso do preservativo e pode ser uma “prova de amor”; as redes sociais virtuais e sites de relacionamentos proporcionam facilidades de encontros sexuais para sexo sem compromisso e geralmente sem preservativo. O acesso aos serviços de saúde destes adolescentes e jovens HSH é atravessado por uma série de elementos que facilitam ou obstruem o cuidado formal nos serviços de saúde, tais como: o medo de contrair aids conduz os adolescentes e jovens HSH para realizar os testes diagnósticos após as relações sexuais sem preservativo; a questão do sigilo sobre a sexualidade, medo de sofrer discriminação por ser homossexual; preconceito por parte dos profissionais quanto a prática do sexo anal; alguns profissionais de saúde atendem os homossexuais reproduzindo a lógica heteronormativa; adolescentes e jovens declaram que para ser bem atendidos precisam esconder a homossexualidade; para o padrão hegemônico heterossexual a revelação de uma identidade gay pode causar constrangimento. Em artigo recentemente publicado, os resultados apontaram que as principais fontes de suporte para as pessoas vivendo com HIV/aids foram familiares e amigos que não residem com a pessoa; o medo do estigma e preconceito esconde a condição sorológica; o suporte do profissional de saúde interfere na adesão ao tratamento; rede social de apoio permite a redução de estigma e discriminação decorrente da doença; o suporte melhora o autocuidado, a qualidade de vida e afastam sentimentos de incapacidade. Considerações Finais: A contemporaneidade da epidemia de aids no Brasil aponta para o recrudescimento das infecções pelo HIV entre homens, jovens e HSH. A política prescritiva que objetiva homogeneizar as práticas de saúde e regular corpos e subjetividades não potencializa o cuidado. No entanto, a produção de cuidado singular, sempre inventada no encontro e em relação pode ser uma ferramenta alvissareira na resposta à epidemia de HIV/aids. A ofensiva conservadora capitaneada por lideranças políticas no parlamento brasileiro e ecoada entre a sociedade civil também é um obstáculo para os direitos humanos. A prática heteronormativa das instituições estatais precarizam o acesso da população LGBT, mais precisamente de HSH, aos serviços de saúde e educação. A aids ainda é uma síndrome estigmatizada e mesmo o conhecimento teórico sobre as formas de infecção e do tratamento constatado pela pesquisa não impede a discriminação e preconceito sistemático sobre as PVHA, por isso, a dificuldade de expor sua condição sorológica.


Palavras-chave


HIV/aids; HSH; jovens