Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Reflexões sobre a construção de um instrumental como mecanismo de aproximação a integralidade do cuidado as pessoas em situação de rua
Thinally Ribeiro Abreu, Maria Elisabeth Sousa Amaral, Talita de Lemos Araujo, Erica Maria Alves do Nascimento, Raiane Xavier Madeira Chaves

Última alteração: 2017-12-27

Resumo


Pretende-se pensar as determinações do processo de saúde-doença como elementos cruciais na atenção à saúde, realizada em uma unidade hospitalar em Fortaleza, que atende pessoas com doenças infecciosas. Além disso, esta é regulamentada pela Secretaria de Saúde do Ceará como uma instituição de referência estadual no tratamento de pessoas vivendo com HIV/Aids. Assim, atribui-se esta percepção sobre tais determinantes, devido a uma multiplicidade de perfis epidemiológicos que emergem de distintas populações usuárias. Dentre estas, se encontram, com relevante incidência, as pessoas em situação de rua que se apresentam imbuídas por especificidades sócio-históricas essenciais ao campo do cuidado. Neste sentido, este estudo aponta a construção de experiências na produção de instrumentos e análises, no contexto de estágio, orientadas de sucessivas aproximações às refrações desta complexa realidade na qual estes sujeitos estão imersos. Destaca-se que desta esfera emanam múltiplas dimensões da desigualdade social, imbricadas as origens de classe desta população, que se caracteriza por sua imersão num contexto de extrema pobreza, pelo rompimento ou fragilização dos vínculos familiares e pela ausência de possibilidade de moradia. Estas pessoas, que se encontram, preponderantemente, nos centros urbanos, resistem a incessante exposição às variações climáticas, à violência, ao preconceito e a condições de acesso inconstantes no cuidado de si. Tais aspectos desencadeiam recorrentes suscetibilidades a doenças e agravos que precisam ser apreendidos no atendimento integral à saúde. Destarte, a percepção destes como sujeitos de direitos e a construção de políticas públicas que visam o seu atendimento revelam-se como frutos da luta desta população em superar as concepções sob traços higienistas, repressivos e assistencialistas, quando não os enquadram na invisibilidade. No que concerne ao campo da saúde tais garantias são asseguradas pelo caráter universal acerca do acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS). Contudo, a efetivação de tais conquistas devem ser reafirmadas no cotidiano das ações e serviços do implementados dentro deste cenário hospitalar. Nesta perspectiva, investigar as singularidades que se desvelam no cotidiano destes usuários permite a identificação e o alcance de suas demandas. Possibilita a estruturação de efetivas formas de intervir mediante ao processo de promoção, proteção e recuperação da saúde. Questiona ainda a eficácia dos tratamentos instituídos sob moldes, restritamente, biólogos e as definições de diagnósticos desconectadas da totalidade do real. Para tanto, se faz essencial uma atuação interdisciplinar que contemple a saúde em seu sentido ampliado ao não esgotar-se na superação imediata das doenças, mas que atente de modo integrado, as demandas e especificidades sociais, físicas, ambientais e mentais. Dentro deste prisma, o Serviço Social deve reformular, de maneira contínua e coletiva seu fazer profissional ao considerar que atuar na viabilização de direitos, frente expressões da questão social, requer um olhar crítico acerca dos processos de trabalho. Portanto, estes devem ser vistos em permanente reconfiguração, estabelecendo novas possibilidades mediante as necessidades dos usuários da política de saúde pública que estão em situação de rua. Acerca da produção da instrumentalidade do Serviço Social, foi implementada uma experiência que procurou qualificar caráter investigativo e interventivo na atenção a este seguimento populacional, superando as lentes do conservadorismo e resignificando categoriais nas seis unidades de internação do hospital, com seus cento e vinte leitos. Entende-se que a instrumentalidade, imersa neste espaço sócio-ocupacional, não se restringe apenas a instrumentação técnica, mas fundamenta-se nas dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativa em meio a uma processualidade dialética transpassadas por movimentos contínuos de construção, rupturas e continuidades do cotidiano. Salienta-se ainda que esta permite que os assistentes sociais materializem suas intencionalidades a partir de respostas profissionais orientadas por um projeto político coletivo. Esta tessitura abriu precedentes para a produção de um instrumental específico para embasar outros instrumentos como a linguagem e a escuta qualificada no cotidiano de atuação profissional do Serviço Social. Este foi construído e pensado, junto a profissionais, por bolsistas do Programa de Bolsa de Incentivo à Educação na Rede da Secretaria de Saúde do Ceará (PROENSINO - SESA), sob a supervisão das assistentes sociais do setor. Tais bolsistas atentaram-se para esta demanda devido ao fluxo constante de pessoas em situação de rua internadas no hospital que apresentavam um longo histórico no equipamento. Assim, foram pensados pontos centrais que responderiam as investigações inerentes às demandas sociais a partir dos instrumentais existentes que se referiam aos usuários, de modo abrangente ao momento da internação, foram realizados contatos e visitas a instituições da Assistência Social, como o Centro para População em Situação de Rua, com vistas a conhecer os percursos intersetoriais em que os usuários são vinculados e com isso ampliar os campos de apreensões do conhecimento acerca dos protagonistas deste estudo. Foram identificadas como relevantes a inserção do nome, nome social, identidade de gênero, idade, naturalidade, procedência, raça e etnia, considerando que estas devem ser autodeclaradas. Foram pensados também o estado civil, escolaridade. No tocante ao cotidiano na rua foram pensadas análises sobre a religião e aos endereços, serviços e instituições de referência. Também foram pontuados discussões sobre os vínculos familiares e as configurações da renda e do trabalho, pensando se estes se estabelecem de forma instável ou contínua. Ressaltou-se a existência de vínculos previdenciários e sobre a ocorrência de recebimentos de auxílios e benefícios públicos e privados. No que concerne às questões de saúde e doença, foram destacados os históricos de internação referentes a está ou a outras instituições. Assim, pretende-se incitar um diálogo sobre as motivações destas internações, indagar acerca dos diagnósticos, do período de conhecimento destes, uso de medicação, para entender sobre processos de adesão e abandono de tratamentos. Ainda colocaram questões pertinentes ao uso de substâncias psicoativas, caso existam, devem ser tratadas em uma perspectiva que adentre nas possibilidades voltadas a redução de danos. Pondera sobre documentações e formas de articular contatos com pessoas de referência para o usuário. Por último, sinaliza para colocações sobre informações complementares, procedimentos e encaminhamentos. Ao longo do processo constitutivo do instrumental este foi exposto em reunião administrativa do setor na qual as assistentes sociais o estudaram e teceram ponderações que foram inseridas nas reflexões de produção. Logo após foi estabelecido um período de teste no qual alguns pontos foram reanalisados. Em seguida, este foi alocado na dinâmica de atuação. É válido ressaltar que o instrumental é de uso privativo do Serviço Social, deve ser realizado de forma associada a admissão social e as evoluções decorrentes aos cursos do atendimento e deve ser arquivado, em virtude de possíveis reinternações, pensando a formulação de um acúmulo de informações referentes aos usuários, em revisitar os processos de trabalho ocorridos anteriormente e na construção de vínculos com estes sujeitos que tendem a enfrentar, diariamente, um arcabouço de violação de direitos. Este instrumental pretende contribuir no enfrentamento a estas violações que se evidenciam neste cenário de retração dos direitos sociais e que provocam a intensificação do imediatismo e da fragmentação do fazer profissional que se distanciam das necessidades dos usuários das políticas públicas da Seguridade Social. Dessarte, a produção deste instrumental reafirma que os sentidos da atenção à saúde devem emanar da luta pela universalidade e equidade previstas no SUS que foram preconizadas no Movimento de Reforma Sanitária e que estabelecem a defesa do acesso a sujeitos que se encontram em diferentes processos de realidade.


Palavras-chave


Saúde; População em Situação de rua; Serviço Social