Trata-se de um relato da experiência desenvolvido pelo Programa PETGraduaSUS UFRGS e SMS/Porto Alegre, o qual pretende contemplar os projetos que proponham desenvolver mudanças curriculares alinhadas às Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para todos os cursos de graduação na área da Saúde. Assim, o objetivo deste relato foi realizar uma análise da interação Universidade e Serviços de Saúde na formação dos alunos, a partir de Rodas de conversas entre usuários, professores e profissionais de saúde. Partiu-se de um recorte geográfico na cidade de Porto Alegre compreendido pelas equipes que compõem as Gerencias Distritais Centro e Glória Cruzeiro Cristal. Elegeu-se os serviços vinculados a atenção básica (UBSs; ESFs; NASFs; Consultório na Rua) e a média complexidade (CAPS; Serviço de Geração de Renda; Ambulatório Especializado em HIV/AIDS e Hepatites Virais), que recebiam alunos de graduação dos cursos envolvidos no PetGraduaSUS UFRGS, sendo eles enfermagem, fisioterapia, medicina, nutrição, odontologia e psicologia.

O processo de trabalho, iniciado em 2016, a partir da aprovação de projeto apresentado ao edital do PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PELO TRABALHO PARA A SAÚDE PET-SAÚDE/GRADUASUS - 2016/2017- vem se desenvolvendo pelo subgrupo Psicologia/Enfermagem, composto por duas professoras e duas alunas do curso de enfermagem; duas professoras do curso de psicologia e três trabalhadoras da rede municipal de saúde (uma dentista, uma psicóloga e uma terapeuta ocupacional). A organização deu-se em cinco etapas: 1ª: Realização das rodas de conversas compostas por alunos, professores, trabalhadores e usuários vinculados aos serviços definidos em cada gerência distrital; 2ª: análise do material produzido nas rodas de conversa; 3ª: A devolução dos elementos da análise aos participantes das rodas; 4ª: apresentação da análise dos elementos específicos de cada curso para as COMGRADS respectivas; 5ª: Apresentação das análises para os colegiados das Gerências Distritais.

Na 1ª etapa foram realizadas três rodas de conversa, nas datas de 28/09/2016 (Atenção Básica) e 13/10/2016 (Atenção Especializada) do Distrito Centro de POA); e 25/10/2016 (Atenção Básica) do distrito Glória/Cruzeiro/Cristal.

Na 2ª etapa, após a realização das rodas de conversa,  houve a transcrição e análise do material por categorias, com o apoio do software de pesquisa Nvivo. As categorias resultantes da análise foram: Atores envolvidos no processo de formação; Estrutura dos cenários de prática para a formação; Corresponsabilização no processo de formação; Estratégias de ensino e aprendizagem; Valorização da experiência; Desafios e dificuldades da interação universidade/alunos/serviços; Interação universidade/cenários de prática e usuários na formação e avaliação do aluno; Modelo de formação; Oportunidades oferecidas pelo campo de prática para desenvolver conhecimento, habilidade, atitudes e ética; Potencialidades da interação universidade, aluno e serviço.

Na 3ª etapa, foi realizada a devolução dos resultados aos participantes das rodas de conversa, por meio de um novo encontro com os participantes das rodas, realizado em de março a junho de 2017.

Na 4ª etapa, a partir dos resultados obtidos na análise dos elementos emergentes das rodas de conversa, foi elaborado um relato com os aspectos que dizem respeito à interação entre universidade, cenários de práticas e usuários, na formação e avaliação dos alunos, comuns a todos os cursos, bem como destacados aspectos específicos, pertinentes a cada um dos cursos envolvidos. A partir deste material, foram agendadas reuniões com as COMGRADs de cada curso para apresentação, discussão e possibilidade de inserção das sugestões levantadas nas Rodas, na formação do futuro profissional de saúde. Até o momento foram realizadas discussões com as COMGRADs dos cursos de Nutrição, Enfermagem, Fisioterapia e Odontologia nas quais foram apresentados os aspectos referentes a cada núcleo profissional. Em dezembro (2017) estaremos realizando ainda encontros com as COMGRADs da Psicologia e, em Janeiro de 2018, com o curso de Medicina.

Na 5ª etapa será realizada a apresentação das análises para os colegiados das Gerências Distritais. Esta atividade está agendada para janeiro de 2018 para Gerência Centro.

Como resultados e impactos indica-se a possibilidade de inserção em equipes multiprofissionais, onde se produzem ações com outros núcleos profissionais, em uma perspectiva interprofissional, vem possibilitando o crescimento dos alunos em termos de habilidades sociais e relacionais e no desenvolvimento da empatia. Além disso, o aluno pode obter a experiência de gestão de responsabilização e da ampliação da visão no cuidado do usuário, quanto às questões sociais e de vida de cada um no Sistema Único de Saúde.

As análises dos materiais das rodas evidenciaram alguns elementos comuns quanto às potencialidades produzidas no encontro entre alunos e cenários de práticas. Entre estas potencialidades, destacaram-se as equipes de ESF como excelentes espaços de aprendizagem para os alunos, especialmente no que se refere à compreensão da proposta do SUS. Os estágios são vistos como espaços de integração entre os diferentes elementos teóricos e teórico/práticos que são oferecidos na universidade, permitindo a compreensão da integralidade do cuidado e a possibilidade de ampliação da visão sobre a clínica. Outro elemento ressaltado é a experiência de tutoria exercida por profissionais com formação diferente do aluno, principalmente no cuidado a ser oferecido por cada núcleo profissional.

Por outro lado, alguns elementos indicam fragilidades na relação ensino/serviço, especialmente no que se refere ao distanciamento entre os professores e os profissionais dos serviços. Esta distância, por vezes, produz uma sensação “utilitarista” na relação entre universidade e serviço, tendo em vista que a aproximação busca oferecer espaços de aprendizagem em serviço para os alunos, algumas vezes sem o adequado conhecimento a respeito das rotinas e modos de funcionamento dos serviços. Outro aspecto refere-se ao entendimento de que a formação acadêmica está centrada na técnica profissional, mas por vezes afastada da realidade de vida dos usuários e dos processos de trabalho em uma equipe de saúde, produzindo angústias nos profissionais, alunos e professores quando as condições não são as “ideais” do ponto de vista técnico. A estrutura física deficiente dos serviços e número reduzido de trabalhadores são também identificados como um impedimento ao acolhimento de um maior número de alunos, mesmo nos locais onde há um desejo dos trabalhadores dos serviços em ofertarem espaços de formação.

Considerações finais

A experiência de discussão da integração entre os diferentes atores envolvidos no processo ensino/aprendizagem trouxe elementos que podem ser indicadores para a qualificação da relação entre a universidade e os cenários de práticas.  A valorização da experiência é um tema que transversaliza toda a discussão, pois é o ponto de encontro entre a universidade e os serviços: estudantes e professores levam sua experiência acadêmica e os profissionais agregam suas experiências no serviço.

Os modos como estas experiências podem produzir trocas e ampliar os horizontes é o ponto que parece tomar relevância em nossas análises. Além disso, os espaços de discussão com as COMGRADs dos cursos e com gestores das gerências distritais são meios que possibilitam avançar na superação das fragilidades apontadas. A partir disso, pode-se atingir transformações que se anunciam como necessárias para a qualificação da integração entre universidade e serviços de saúde, na formação de trabalhadores para o SUS.

Mais do que nunca, o momento em que vivemos exige o engajamento de todos os atores envolvidos, na defesa dos princípios do SUS, e a formação de profissionais comprometidos é fundamental para a sustentação deste projeto.