Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2017-12-26
Resumo
Apresentação: As Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) ainda são elencadas como um problema de Saúde Pública, que atinge uma diversidade de pessoas em todo o mundo, mediante a pluralidade nas formas de transmissão do patógeno. O ato sexual desprotegido, o compartilhamento de seringas para o uso de drogas e o contato direto com secreções e fluídos sanguíneos estão entre as formas mais significativas de contrair tais infecções. A população feminina é a mais vulnerável às IST/HIV/aids, devido à suscetibilidade biológica e à reduzida autonomia sexual, sendo acentuada pela vulnerabilidade individual, social e programática na atualidade. As transformações no perfil de acometimento das IST/HIV/aids com o processo de interiorização, pauperização e feminização faz com que populações antes não atingidas, como as remanescentes de quilombos, deparem-se com condições e situações de desvantagem social, acentuadas pelas disparidades regionais, que obstacularizam a construção de respostas de combate à epidemia, evidenciando sua condição de marginalização em relação à maioria das Políticas Públicas de Saúde. Objetivo: Identificar e analisar as vulnerabilidades de mulheres quilombolas do Rio Trombetas (PA) para as IST/HIV/aids. Desenvolvimento: Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, prospectivo, transversal com abordagem quantitativa. A coleta de dados deu-se por meio de entrevista individual realizada no domicílio, a partir de um questionário semiestruturado, após aprovação do Comitê de Ética da Escola de Enfermagem da USP, sob o parecer: 1.667.309. Para a análise dos resultados foi adotado como referencial o conceito de vulnerabilidade. Esta pesquisa foi realizada em oito comunidades quilombolas do alto Trombetas, localizadas no município de Oriximiná, região Oeste do Estado do Pará. Resultados: Participaram do estudo 139 mulheres, todas se autodeclaram negras (63,3%) ou pardas (36,7%), a idade das pesquisadas compreendeu entre 16 e 55 anos, (34,5%) possuíam o ensino fundamental completo, (30,9%) o ensino médio e (4,3%) o ensino superior. Quanto ao estado civil, 69,1% estavam em união estável ou casada, 28,1% solteiras. Em relação à religião, 73,4% eram católicas e 26,6% evangélicas. Das 139, 38,1% tinham emprego fixo, sendo assalariadas, possuíam renda individual menor que um salário mínimo (60,4%) e 61,9% não apresentavam renda fixa, dependiam do trabalho da agricultura, do artesanato ou da renda do companheiro. O tipo de moradia predominante foi a de madeira (48,9%), com menos de três cômodos (56,8%), com água para consumo oriunda do abastecimento comunitário (61,2%). O celular foi o meio de comunicação mais utilizado (43,0%). A faixa etária da menarca foi de 11 a 14 anos (79,8%), do primeiro coito de 15 a 17 anos (46,0%), 71,9% já tinham realizado o exame de PCCU, 56,8% já haviam apresentado sinais de IST, como corrimento (32,4%) e dor pélvica (30,9%). O número de parceiro sexual nos últimos doze meses foi de um a dois parceiros (79,1%), o uso do preservativo masculino entre as casadas foi de apenas 16,7% e do feminino de 13,5%, entre os motivos para o não uso preservativo feminino está a indisponibilidade (52,5%). Quanto aos saberes sobre os IST/HIV/aids, encontramos que 69,1% já haviam recebido informações, sendo que 55,4% sabiam o que são IST, 80,6% que o uso da camisinha é um meio de prevenção, porém, 18,0% informaram não saber acerca da temática. Para 43,0% a relação sexual sem proteção é uma forma de contrair as IST/HIV/aids. 44,7% consideram que existe risco individual para contrair uma IST/HIV/aids e que a infidelidade do parceiro (45,2%) contribui para o risco. Apenas 8,1% classificaram o risco como alto e 64,6% como baixo e ainda 9,6% asseguram não apresentar risco nenhum para contrair uma IST/HIV/aids. Em relação ao conhecimento sobre a aids, 84,3% responderam que é “Doença que destrói o sistema de defesa do organismo causando a morte” e 40,3% não têm conhecimento sobre aids, 87,8% acreditam que a doença é transmitida através da relação sexual sem camisinha, 82,8% responderam que as secreções corpóreas (sangue, leite materno e sêmen) contêm o vírus HIV, porém 64,1% ainda acreditam que a picada de insetos transmite a aids. No que concerne a realização do teste anti-HIV, 74,1% já tinham feito em algum período, sendo que 89,3% realizaram no serviço público na cidade. Não há UBS nas comunidades e a conduta em situação de enfermidade é a de utilizar remédios caseiros (58,3%). Quanto ao enfrentamento das mulheres quilombolas, verificou-se que frente às limitações apontadas nas dimensões individual, social e programática o processo de enfrentamento é inexistente, mostrando quão vulneráveis e suscetíveis essas mulheres estão frente às IST/HIV/aids. Considerações Finais: Diante dos resultados encontrados, o principal desafio é traduzir as soluções para a superação dos diferentes contextos de vulnerabilidade das mulheres quilombolas às IST HIV/aids, implementando políticas efetivas e ações concretas que assegurem o acesso aos programas de promoção e prevenção, disponíveis no sistema de saúde, com garantia de assistência holística e integral para a saúde da mulher. Estudos nas áreas de IST/HIV/aids contemplando a vulnerabilidade das populações, somados ao processo de interiorização e pauperização, favorecem a resolução de problemas como a falta de serviços e ações de saúde, assim como são importantes instrumentos para mapear as reais necessidades e expectativas deste grupo, que se caracteriza por possuir crenças e culturas próprias e estar em um contexto geográfico diferenciado. Ao estudar a vulnerabilidade de mulheres quilombolas às IST/HIV/aids foi possível analisar o papel dessa mulher enquanto sujeito ativo no processo de promoção da saúde, tanto a nível individual e social, como no programático, uma vez que, de posse de condições de educação e de saúde, a mesma possa elaborar representações que orientem o seu comportamento, seus conhecimentos e suas práticas, que a torne menos vulnerável às IST/HIV/aids, transformando futuras gerações para o seu enfrentamento. Neste contexto, vale ressaltar que os enfermeiros, principais agentes da comunidade, devem considerar esses aspectos ao planejar intervenções de promoção, prevenção e controle dessas doenças. Partindo do princípio que a identificação das necessidades em saúde realizada pelos profissionais de saúde permite enfrentar vulnerabilidades com maior propriedade e conhecimentos, é extremamente relevante repensar nossas práticas profissionais junto às populações tradicionais, através da escuta sensível, possibilitando que a mulher seja protagonista de sua saúde, o que fortalecerá políticas públicas inerentes a sua realidade e vulnerabilidades.