Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Estudo reflexivo sobre as taxas de doenças diarreicas em crianças Munduruku no estado do Amazonas, Brasil.
Andrew Georg Wischneski, Bahiyyeh Ahmadpour, Daniel Scopel, Raquel Paiva Dias-Scopel Paiva Dias-Scopel, Luigi Bruno Peruzo Iacono

Última alteração: 2018-01-02

Resumo


Apresentação:

As doenças diarreicas caracterizam-se pela eliminação abrupta de fezes de conteúdo líquido acima do habitual, podendo ter aumento da frequência de evacuações. A etiologia desta doença, em sua maioria, é infecciosa. Quando a diarreia ocorre no período de até 14 dias, pode ser classificada como aguda e denominada, como também, infecção intestinal, diarreia aguda infecciosa e gastroenterite. Tal enfermidade, trata-se de uma problemática de distribuição universal, de evolução potencialmente autolimitante e necessita de terapêutica específica para seu controle.

Apesar da comunidade científica, nas últimas quatro décadas, ter chegado num consenso sobre quais são as medidas mais efetivas para reduzir a incidência e a morbiletalidade, ainda é considerada uma das principais causas de mortalidade em crianças nos países em desenvolvimento ou locais onde a pobreza predomina.

A elevada ocorrência de diarreia nas populações pobres está diretamente associada às precárias condições de saneamento básico, higiene ambiental e pessoal, visto que a via de transmissão dos enteropatógenos é fecal-oral. Um cenário comum a grande maioria das aldeias indígenas no Brasil são as condições ambientais favoráveis à transmissão de parasitas e microrganismos veiculados pela água e alimentos contaminados, como helmintos e protozoários intestinais, enterobactérias e rotavírus. Ademais, onde há grande deficiência de infraestrutura adequada para moradias, nas crianças, além da via fecal-oral, outras formas de transmissão são também comuns, tais como andar descalço, contato com solo e com extratos subungueais contaminados.

As políticas públicas de saúde voltadas aos povos indígenas no Brasil reconhecem que os indígenas articulam saberes relativos à saúde e doença, apontando a estreita relação entre estes saberes e a dimensão sociocultural e geográfica de cada povo e a relevância destes saberes no enfrentamento das enfermidades cotidianas, entretanto, as políticas de estado operam reproduzindo uma imagem caricatural e estereotipada do que identificam como medicina indígena.

Este trabalho objetiva descrever os dados de morbidade das doenças diarreicas agudas em crianças indígenas da etnia Munduruku no estado do Amazonas e refletir sobre as condições sanitária que levam a esses números.

Desenvolvimento do trabalho:

Trata-se de um estudo teórico-reflexivo, construído com base na análise crítica da Incidência de doenças diarreicas em crianças Munduruku no estado do Amazonas, Brasil, e em estudos científicos, que referenciam a configuração atual da saúde dos povos indígenas no Brasil. Essa construção teórica aproxima-se da abordagem qualitativa, tendo em vista a interpretação e a análise dos elementos teóricos obtidos por meio do levantamento bibliográfico realizado.

Para o alcance dos objetivos propostos foram realizados os levantamentos de dados secundários através do Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (SIASI), disponibilizados eletronicamente pelos dados disponíveis no Distrito Especial Indígena (DSEI) de Manaus, os quais contemplaram os casos de morbidade de diarreias em crianças entre 0 a 10 anos de idade da etnia Munduruku da Terra Indígena (TI) Kwatá.

As variáveis analisadas contemplaram: idade, sexo, mês e ano de ocorrência (da doença), faixa etária (menor de 1, 1 a 4 anos e 5 a 9 anos) e aldeia indígena proveniente. Todas as varáveis contemplaram crianças da etnia Munduruku.

A análise descritiva dos dados foi realizada mediante a geração de frequências relativas e absolutas. A entrada de dados realizou-se através do aplicativo Microsoft Excel 2010 e com o auxílio do software SPSS 22.0.

A análise teórico-reflexiva deu-se através dos apontamentos do I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição Indígena e estudos recentes das condições socioambientais que se fazem relevantes ao perfil epidemiológico de grupos e subgrupos sociais específicos, como as populações indígenas.

Este estudo, está vinculado ao projeto de pesquisa intitulado “Saneamento em áreas indígenas a partir de uma perspectiva antropológica” do Programa de Desenvolvimento Científico Regional – DCR/AM, edital n. 024/2013 (CAAE: 52217215.5.0000.5020) e ao projeto de pesquisa intitulado “Morbimortalidade por doenças diarreicas em crianças Munduruku no estado do Amazonas, Brasil.” do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/UFAM (CAAE:69378317.5.0000.5020).

Resultados e/ou impactos:

A maior incidência de casos de diarreia concentra-se na faixa etária de 0 a 5 anos. Nos anos analisados, as crianças entre 0-1 ano apresentaram 125 casos (11,8%) e aquelas entre 1-5 anos 620 casos (58,5%). Portanto, mais da metade dos casos de diarreia em crianças estão concentrados nas <5 anos. A média anual de casos na população estudada é de 262, acometendo 43,2% das crianças até 10 de idade.

Crianças de até 5 anos de idade corresponderam à 33,6% de todos os atendimento realizados por diarreia anualmente, sendo que, em 2013, chegou 45,7% e, em 2015, 28,3%, respectivamente os anos de maior e menor frequência. Esses dados estão em confluência com os apresentados no I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição Indígena, onde, além de mostrar a criança indígena em posição de larga desvantagem quando comparada à criança brasileira não indígena, relata que a prevalência de internações por diarreia chega à 37,2%, ao ano, para mesma faixa etária e a incidência semanal chega à 23,6%.

Os episódios repetidos de diarreia também colocam as crianças em maior risco de piorar o estado nutricional devido à diminuição da ingestão de alimentos e redução da absorção de nutrientes, combinada com o aumento dos requisitos nutricionais da criança durante os episódios repetidos, assim como aumenta a incidência de desnutrição.

A maioria dos agentes patogênicos que causam diarréia compartilha um modo de transmissão, fecal-oral. Assim, as altas taxas encontradas justificam-se ao verificar que na Região Norte, apenas 0,6% dos domicílios indígenas possui instalação sanitária dentro de casa, as aldeias indígenas praticamente não dispõem de infraestrutura sanitária e a origem da água utilizada para beber vem de fontes locais, sem indicação de qualquer tratamento prévio.

Os indígenas utilizam os igarapés para banhos. Neste mesmo local, também fazem suas necessidades fisiológicas, assim como em áreas peri-domiciliar, roças e rios. Quanto aos resíduos sólidos, não há coleta, por conseguinte fazem uso de queimada e enterramento para seu fim, porém não é raro encontrá-los dispersos no meio ambiente de forma irregular.

Lavar as mãos com o sabão é uma barreira importante para a transmissão dos patógenos e foi citada pela Organização Mundial de Saúde como uma das intervenções de saúde pública de maior custo-benefício, reduzindo a incidência de doenças diarreicas em mais de 40%. Porém, é necessário um entendimento da dimensão sociocultural e geográfica de cada povo para inserção de novos hábitos.

Este trabalho pode contribuir para o planejamento das ações e serviços para a Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena, além disso traz subsídios adicionais para o conhecimento das condições e das demandas de saúde das populações indígenas.

Considerações finais:

As análises deste estudo não somente confirmam o perfil de precárias condições de infraestrutura de saneamento básico das aldeias indígenas, causa determinante dessa problemática, como traz um alerta pois as doenças diarreicas em crianças têm como principal consequência a desnutrição infantil, a qual, em casos mais graves, pode levar a mortalidade. Como também aponta a necessidade de entendimento das características socioculturais e geográficas dos povos indígenas para implementar ações de melhora das condições sanitárias das aldeias e a necessidade de ações de que promovam o intercâmbio entre os saberes tradicionais e científicos interrompendo o ciclo de contaminação.


Palavras-chave


Saúde Indígena; Diarreia Infantil; Epidemiologia.