Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2018-01-21
Resumo
Apresentação: A política de saúde mental do País tem como marco a Lei nº 10.216/2001, que impulsionou a construção de um modelo humanizado de atenção integral, redirecionando o foco da atuação profissional, com o cuidado hospitalar passando a ser considerado apenas quando as medidas terapêuticas extra-hospitalares forem insuficientes, tornando, assim, o modelo de assistência ao paciente com transtorno mental adotado pelo Brasil inovador, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, pois se baseia no cuidado à comunidade, defesa aos direitos do paciente com transtorno mental, respeito à sua dignidade e liberdade individual. A supracitada lei explicita as modalidades de internação hospitalar, sendo elas: voluntária quando é solicitada ou permitida pelo paciente, involuntária quando solicitada por outrem e sem a concordância do usuário e compulsória quando é determinada pelo juiz e por acontecer por vias da justiça não pode ser legalmente questionada. No entanto no âmbito da saúde a internação compulsória é fonte de inúmeros debates, uma vez que esta é apresentada como contraditória a luta antimanicomial, pois a internação passa a ser uma forma de aprisionamento, constituindo-se em uma prática higienista e salientando a ideia de periculosidade do portador de transtornos mentais que por sua vez trás implicações negativas para a relação paciente/profissional pois a ideia da criminalização da doença gerou uma cultura de estigmas no imaginário social que ainda é uma barreira a ser ultrapassada pela luta antimanicomial, especialmente em profissionais que tem maior contato com os pacientes, destacando-se a enfermagem. Diante do exposto, este trabalho tem como objetivos relatar a experiência da acadêmica em uma roda de conversa com profissionais de Enfermagem sobre internação compulsória, verificar a percepção dos profissionais sobre a internação compulsória e identificar se há a diferença da assistência ao paciente inserido no âmbito hospitalar diante dessa modalidade. Desenvolvimento do trabalho: Através da observação da realidade durante a prática do componente curricular de Saúde Mental II em uma clínica psiquiátrica do município de Belém- PA identificou-se um paciente internado compulsoriamente, partindo do pressuposto de que uma competência e habilidade a ser desenvolvida pelo acadêmico de enfermagem é o senso-crítico, a discente elencou como questionamento: qual seria a percepção dos profissionais de enfermagem sobre a internação compulsória e se havia diferença na assistência ao paciente internado a partir dessa modalidade. Com o intuito de solucionar as questões levantadas, foi realizada uma roda de conversa com os profissionais de enfermagem que trabalham na instituição hospitalar. O espaço ocorreu no mês de dezembro do ano de 2017, no período da manhã contando com a presença de seis enfermeiros, sendo um professor de uma instituição de ensino superior e quatro acadêmicas de enfermagem; com intuito de facilitar o diálogo, foi produzido um folder contendo os assuntos a serem abordados na roda de conversa, sendo que esta foi seccionada em momentos baseados na ordem do folder: no primeiro momento abordou-se a Lei 10.216/2001, o segundo momento foi voltado para a explanação sobre a internação compulsória e o terceiro momento sobre o cuidado de enfermagem ideal ao usuário em internação compulsória. Resultados e/ou Impactos: Durante a explanação sobre a lei da reforma os profissionais mostraram domínio sobre o que estava disposto no regulamento, como a proteção dos direitos do portador de transtorno mental e o redirecionamento do modelo assistencial do País, sabiam quais as modalidades de internação e o fluxo da rede de atenção à saúde mental. Quando abordado sobre a internação compulsória os enfermeiros sabiam que essa modalidade era prevista em casos de drogadição associada a transtorno mental, quando comprovadamente houve crime durante crise ou quando a internação era solicitada por outrem diretamente ao juiz, que ao analisar os motivos da solicitação dava parecer favorável, no entanto os profissionais relataram que esse ideal não acontecia na prática e se referiram a situações em que o usuário internado de forma compulsória não possuía indicações para ser tratado em uma clínica psiquiátrica; casos em que essa modalidade era usada como forma de internação de dependentes químicos perigosos que não eram doentes mentais, sendo assim, uma punição a sua condição de saúde; também foi abordado o cenário de falta de autonomia da equipe para a liberação do paciente e seu retorno à rede de atenção à saúde mental. Diante do terceiro momento, em que se explanou sobre o cuidado de enfermagem ideal frente ao paciente com esse perfil ouviu-se relatos de insegurança e fragilidade diante do sistema de saúde que não verifica as reais necessidades do usuário e submete a equipe a riscos, porém os enfermeiros evidenciaram que mesmo diante do quadro apresentado tentam uma relação humanizada, ética e baseada no respeito mútuo para com esse paciente. Uma profissional utilizou o momento para desabafar sobre a falta de recursos materiais e humanos na instituição que também dificulta a qualidade da assistência prestada aos usuários presentes no local. Finalizada a roda de conversa identificou-se que o uso dessa tecnologia leve é importante para o diálogo, que por considerar todos os participantes como seres detentores do saber, facilita a troca de conhecimento horizontal. Considerações Finais: Com os resultados advindos deste relato, considera-se que com a conjuntura atual, na qual a Lei 10.216/2001 sofre impugnação, é fundamental defende-la enquanto regulamentadora do direito do portador de transtorno mental e de um modelo assistencial inovador. Salientamos que a internação compulsória precisa ser revista, sua prática ainda está pautada nos estigmas que cerceiam o portador de transtorno mental, com a internação sendo utilizada como punição e na qual a equipe de saúde não possui autonomia para real avaliação das necessidades do usuário. Através dos relatos apresentados acredita-se que o objetivo foi alcançado e que esta compreensão dos profissionais de enfermagem sobre a internação compulsória é fundamental para se (re) construir as práticas assistenciais ao paciente inserido no âmbito hospitalar compulsoriamente, qualificando o fazer profissional pautado nos ideais da reforma psiquiátrica. Além disso, a troca desse conhecimento entre profissionais e as acadêmicas permite que haja um (re) conhecimento sobre o tema e aprofundamento dos debates, sendo que os dilemas apresentados não ficam estagnados no serviço, uma vez que são apresentados a comunidade acadêmica.