Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Promovendo Saúde através do Teatro do Oprimido: experiência com jovens indígenas Amanayé
Álvaro Pinto Palha Júnior, Ana Marceliano, Eluana Carvalho, Isabela Ramos, Camila Rodrigues, Bianca Tsubaki, Marcela Acioli, Maycon Correia Pinto

Última alteração: 2017-12-28

Resumo


O texto é um relato de experiência de uma vivência que consistiu numa oficina de Teatro do Oprimido realizada com jovens indígenas da Etnia Amanayé, aldeia Barreirinha, no município de Paragominas no Pará, no mês de março de 2016. Esta ação é fruto da parceria entre o Distrito Sanitário Especial Indígena Guamá Tocantins da Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (DSEI/GUATOC/MS) - e oficineiros do Curro Velho, instituição vinculada a Fundação Cultural do Pará, facilitada pela professora de teatro daquela instituição.  O DSEI GUATOC tem dedicado especial atenção à construção de ações que com o objetivo de prevenir agravos e promover saúde entre os povos indígenas no seu território. Diante da crescente ocorrência de violências e uso abusivo de álcool e outras drogas nas aldeias, se fez necessário construir junto a estas comunidades, estratégias de intervenção que reduzam os danos destes agravos contemporâneos de saúde. Neste contexto, o teatro do oprimido de Augusto Boal foi o caminho encontrado enquanto estratégia de mobilização, encontro e diálogo entre os indígenas da etnia Amanayé acerca das problemáticas da aldeia Barreirinha. O Programa Bem Viver, assim nomeado em março de 2015, é responsável pelas demandas de saúde mental dos povos indígenas do DSEI GUATOC, definidas pelo Ministério da Saúde, tendo como proposta ações voltadas prioritariamente à promoção do bem viver indígena, compreendendo saúde de maneira diretamente proporcional aos níveis de autonomia e protagonismo dos sujeitos e comunidades. Desde então as propostas para ações de saúde têm sido construídas junto aos indígenas, nas aldeias e com abertura para propostas que extrapolam as clínicas tradicionais de saúde. Dentro desta perspectiva de cuidado ampliado é que está inserida a experiência de teatro dentro da aldeia Barreirinha. Nesta e em outras aldeias apresentavam-se relatos de uso abusivo de álcool e ocorrência de violências diversas, contexto que pode provocar a fragilização dos sentimentos de pertencimento ao grupo e dos vínculos de solidariedade entre os integrantes da comunidade, diminuindo o poder de resposta dos mesmos a estes novos agravos, gerando a necessidade de construir coletivamente respostas sustentáveis. Em diálogo com a comunidade indígena o DSEI GUATOC identificou a necessidade de ação direcionada aos jovens e então construiu articulação com a Fundação Cultural do Pará para realização de oficina de teatro para este público alvo, na perspectiva do Teatro do Oprimido de Augusto Boal. Proposta que objetivou provocar os diversos projetos de vida e expectativas sociais a tornarem-se ato criativo e projetos comunitários de futuro, promovendo autonomia e protagonismo destes povos para fortalecimento de soluções locais aos entraves sociais cotidianos. A oficina de teatro teve carga horária de 90 horas, destinada aos jovens da etnia Amanayé e ocorreu no período de 14/03/2016 a 31/03/2016 dentro da aldeia Barreirinha. O Teatro do Oprimido de Augusto Boal trabalha as situações de opressão vividas dentro da realidade em que os participantes estão inseridos, para suscitar o empoderamento dos participantes e incentivar o protagonismo até mesmo do público, isto é, para que todos os envolvidos assumam o papel de espectatores (atores-espectadores). Participaram desta turma 39 pessoas, principalmente jovens, havendo ainda a presença de alguns adultos e crianças.. Neste encontro os jovens registraram no quadro suas impressões a cerca da aldeia, da vida dos homens e da vida das mulheres de Barreirinha, movidos pela pergunta geradora: “O que tem e o que não tem?”. Ex.: “O que tem em Barreirinha?”; “O que tem nas mulheres?”; “O que não tem nos homens?”. Assim foi possível iniciar um debate sem focar a princípio no julgamento de valor, no que seria certo ou errado, bom ou ruim, mas sim criar um espaço de escuta e receptividade das falas destes jovens. Nos encontros que se seguiram foram trabalhados principalmente jogos teatrais - Jogos para Atores e Não Atores de Augusto Boal. Na vida cotidiana somos condicionados a viver no mínimo de nossa energia, no mínimo de reflexão, no mínimo de expressão da subjetividade, no mínimo de liberdade, o teatro estimula os participantes à expansão de todos estes fatores, por isso os jogos teatrais são as maiores armas para libertação à partir do teatro, permitem instaurar a atmosfera de liberdade e ludicidade necessárias para auto expressão e desenvolvimento da consciência de si e do outro. Assim foram aplicados principalmente jogos que estimulassem o trabalho em grupo, uma vez que foi preciso criar uma conexão emocional entre os participantes para que pudessem se concentrar nas atividades e zelar futuramente pelo espaço coletivo criado durante as aulas, sentir-se parte de algo coletivo gera união e fortalecimento da comunidade, bem como o sentimento de proteção produzido no exercício em grupo que permite que aos poucos cada participante se sinta à vontade para expressar sua individualidade. Foram trabalhados também jogos teatrais de Viola Spolin, voltados para extroversão, consciência corporal, foco, concentração, projeção de voz, dicção, ritmo, canto, criatividade, fisicalização (mostrar com o corpo suas próprias idéias), controle da respiração e a auto-confiança. Na segunda semana de trabalho foram introduzidas práticas do Teatro Fórum de Augusto Boal como forma de suscitar o aparecimento de problemáticas. Algumas delas já haviam surgido naturalmente em exercícios despretensiosos, isto é, exercícios que não tinham especificamente o objetivo de suscitar essas temáticas (ex.: aquecimento corporal, vocal, jogos de improviso...). Assim, surgiram os temas: - Conflito de Terras; Álcool; Drogas; Violência Contra a Mulher; Preconceito; Violência Sexual contra criança. Cada uma dessas temáticas foi desdobrada em várias cenas improvisadas pelos participantes e cada uma destas cenas foi debatida até decidirmos coletivamente nos concentrar em apenas três cenas a serem apresentadas abertamente para toda a aldeia: 1. Cena de Abuso sexual infantil; 2. Cena onde bêbado agride a esposa e a filha; 3. Cena de overdose de drogas na festa. A oficina promoveu grande encontro na aldeia em sua culminância, em que foram apresentadas as três cenas de problemas cotidianos da comunidade, para então estabelecer diálogo entre todos sobre possíveis soluções para cada caso. Momento potente que mobilizou diversos sujeitos da aldeia e promoveu diálogos singulares sobre acontecimentos invisibilizados pelo cotidiano local. Todos os envolvidos avaliaram a intervenção como exitosa e após um ano e meio o grupo de teatro dos jovens segue ativo, participando e promovendo momentos de diálogos entre a comunidade Amanayé, da aldeia Barreirinha, no Estado do Pará. A provocação de reflexões e produções de ações voltadas para os jovens da etnia Amanayé, na aldeia de barreirinha foram propostas a partir de diálogo da comunidade com a equipe de saúde do polo base de Paragominas, com o intuito de provocar autonomia e protagonismo dos sujeitos e da comunidade para com as demandas levantadas pelos mesmos de violência e abuso de álcool e outras drogas. A concepção de cuidado ampliado dentro do Programa Bem-Viver visualiza e transversaliza os saberes e epistemologias, utilizando o teatro do oprimido de Augusto Boal como uma forma de proporcionar promoção de saúde, fortalecimento de soluções locais e autonomia da comunidade. Revela-se a importância de funcionamento da rede de atenção à saúde indígena e a busca de novas ligações intersetoriais/interinstitucionais que possam beneficiar e contribuir com promoção de saúde da comunidade.


Palavras-chave


Saúde Indigena; Teatro do Oprimido; Fortalecimento de Grupos