Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Gestão do cuidado em urgência e emergência: entre protocolos e dilemas da avaliação de risco e produção de saúdes
Alcindo Antonio Ferla, Marcia Fernanda de Mello-Mendes, Eloisa Solyszko Gomes, Heider Aurélio Pinto, Ana Paula Soares Kleemann, Elisangela Martins da Rosa Silveira, Greice Laitano, Marco Aurélio Cruz da Silva

Última alteração: 2018-01-06

Resumo


Este trabalho apresenta os primeiros resultados de uma pesquisa que pretende qualificar a linha de cuidado em urgência e emergência em serviços da Região Metropolitana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. A pesquisa é coordenada pelo Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) campus Alvorada, em parceria com Fundação Universitária Cardiologia – Hospital de Alvorada, Secretaria Municipal de Saúde de Alvorada, Fundação Hospitalar Getúlio Vargas, Secretaria Municipal de Sapucaia do Sul, Secretaria Municipal de São Leopoldo, Hospital Centenário e Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Os serviços participantes, muitos mantidos pelas instituições que compõem a rede científica que se envolve na pesquisa, estão localizadas em municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre com diferentes indicadores socioeconômicos e demográficos, composições da rede de atenção em saúde e oferta de serviços. No entanto, quando se refere ao acesso os serviços de Urgência e Emergência, percebe-se dilemas semelhantes no cotidiano do trabalho, parte significativa dos quais referida à dificuldade dos processos de cuidado no interior dos serviços de reconhecerem a diversidade dos contextos em que se originam os usuários.

A pesquisa, do tipo pesquisa-intervenção, objetiva analisar o estado da arte em relação ao acolhimento com classificação de risco na urgência e emergência, identificar diferentes estratégias de modelagem de processos de trabalho de acolhimento segundo características clínicas do usuário e outras situações que caracterizam risco e vulnerabilidade, articulações internas e externas do serviço, e também, validar novos fluxos, que considerem questões clínicas e a análise ampliada da situação de risco e vulnerabilidade e a capacidade operacional dos serviços e da rede. A pesquisa busca reconhecer e desenvolver tecnologias de organização do trabalho capazes de lidar mais construtivamente com a complexidade de fatores associados à produção de saúde no contexto do cotidiano dos usuários e dos territórios nos quais andam a vida. A metodologia de pesquisa prevê dispositivos iniciais como a construção de grupo condutor da pesquisa e do grupo condutor local, a realização de inventário de problemas e estratégias de resposta, os seminários de troca de experiências e validação de fluxos/processos de trabalho. Ou seja, a intervenção no contexto é tomada como educação permanente, seja sobre o trabalho de cuidar e organizar o cuidado no interior dos serviços, seja na produção de análises da própria pesquisa, que envolve a participação ativa dos trabalhadores dispostos a essa atividade. Considerando-se as dimensões relacionais do cuidado, a mobilização dos atores do cotidiano do trabalho na urgência e emergência busca o compartilhamento de saberes e o desenvolvimento conjunto de conhecimentos e tecnologias úteis e oportunos para qualificar o cuidado. Para alcançar os objetivos da pesquisa-intervenção, estão previstas outras estratégias como grupos de discussão, oficinas de especialistas, entrevistas, caso-guia, análise documental.

Como resultados da pesquisa até o presente momento, identificou-se que os protocolos utilizados por estes serviços, em geral são o Protocolo de Manchester e o Protocolo de Acolhimento de Avaliação de Risco do Humanizasus. No entanto, um dos serviços já formalizou uma adaptação do protocolo para atender questões de saúde mental em consonância às necessidades percebidas. Um outro serviço iniciou um trabalho de construir um protocolo próprio, de acordo com a realidade local, produzindo variações ainda pouco compartilhadas entre os trabalhadores. A necessidade de adaptação dos procedimentos protocolizados é marcada por todos os serviços, e se dá porque os protocolos de Manchester e Humanizasus estão focados na verificação de sinais e sintomas de âmbito biológico, sendo pouco sensíveis para captar questões de vulnerabilidade social, saúde mental e outras equidades. Surgiu também que profissionais com escuta qualificada, sentem necessidade de avaliar o risco considerando aspectos integrais dos sujeitos e muitas vezes o fazem, o que gera conflitos entre os membros das equipes. Constatou-se, assim, que os protocolos são insuficientes para organizar o cuidado nos serviços, gerando, muitas vezes, uma sobrecarga nos processos de trabalho para contornar inadequações ao perfil dos serviços, do sistema local de saúde e dos usuários. Por outro lado, há intensa produção de redes de saber e desenvolvimento de tecnologias a partir das questões que são mobilizadas pelos problemas identificados pelos trabalhadores.  Outro aspecto importante é o distanciamento entre os serviços de urgência e emergência e a atenção básica e especializada dos municípios, que gera déficits relevantes em relação à qualidade e continuidade do cuidado. Percebe-se que mesmo em ambientes com grande demanda como os serviços em que se desenvolve o projeto, o trabalho vivo reivindica espaço na organização dos processos de cuidado, produzindo-se uma inteligência rizomática para abordar os problemas do cotidiano. A mobilização dos trabalhadores em torno da análise dos processos de trabalho e das tecnologias utilizadas, mostra a importância de um dispositivo participativo de gestão do trabalho, fortemente alicerçado em estratégias de educação permanente em saúde, aproveitando as aprendizagens sistematizadas pelos trabalhadores no cotidiano e potencializando a inteligência que se produz coletivamente para superar as questões colocadas pela complexidade do trabalho. Aos serviços, constituir dispositivos participativos de análise dos problemas no cotidiano do trabalho, gera um ganho em termos de fluxos e resolutividade e, na prática, os serviços de urgência e emergência, tradicionalmente considerados também observatórios das condições de saúde dos territórios, transformam-se em laboratórios de desenvolvimento de tecnologias de cuidado e gestão. Diferentemente de sequestrar o trabalho vivo por meio de rotinas e abordagens estruturadas, o protocolo pode tornar-se dispositivo para a análise e produção de conhecimentos e tecnologias para o desenvolvimento da capacidade de cuidar, quer nos atendimentos de urgência e emergência, quer para matriciar o trabalho nos demais serviços da rede. Ou seja, trata-se de não apenas considerar o serviço de urgência e emergência como parte de uma rede de atenção territorial, senão de constituir neles laboratórios de experimentação e desenvolvimento da rede de cuidados. A parceria, no formato de rede científica, envolvendo instituições de ensino e pesquisa e serviços se mostra potente para o desenvolvimento do trabalho na organização de linhas de cuidado, articulando serviços e ações de cuidado, e também na produção de conhecimento significativo no cotidiano dos serviços e das instituições de ensino e pesquisa, materializando produtivamente a articulação entre ensino, pesquisa e o trabalho nos serviços que está prevista em diversos documentos legais. Esta pesquisa, desde a fase inicial, mostra-se potente em promover espaços de troca de experiências e discussão entres os diferentes níveis de atenção dos municipios.



Palavras-chave


Linha de Cuidado; Urgência e Emergência; Classificação de Risco; Gestão do Cuidado