Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
"A construção da saúde mental como campo na Estratégia de Saúde da Família"
Silvana Amaral dos Reis, Clara da Silva Camatta, Caroline Gradim Moraes, Beatriz Farias do Nascimento, Hannah Carolina Tavares Domingos, Marcelo Pereira Gonçalves

Última alteração: 2017-12-26

Resumo


Este trabalho se propõe a discutir, tomando como referência a noção de clínica ampliada trabalhada por Gastão Wagner e Emerson Merhy, o cuidado em saúde mental na Estratégia de Saúde da Família (ESF). Para tanto, partimos da nossa experiência de inserção como residentes multiprofissionais em uma equipe de saúde da família, que nos provocou a pensar sobre a separação produzida entre a saúde e a saúde mental nas práticas experimentadas. Essa separação se baseia historicamente em uma divisão sócio-técnica do trabalho que, no contexto da ciência moderna, produz especialistas, restringindo o acesso a saberes e fazendo operar uma relação poder-saber que legitima o conhecimento de uns sobre os outros, num jogo de produção de verdade. Esse processo tornou a saúde mental um campo de saber restrito ao núcleo das categorias psis, o que possui efeitos até hoje. No contexto da ESF, trabalhamos segundo uma noção de saúde ampliada, que compreende a saúde como um objeto complexo, polissêmico e multideterminado, não sendo apenas a ausência de doenças. Essa noção ecológica de saúde como completo bem-estar biopsicossocial inclui uma dimensão da saúde mental em sua própria definição. No entanto, quando nos deparamos com a realidade dos serviços, observamos práticas ainda muito médico-centradas, pautadas em uma lógica queixa-conduta que dificulta o vínculo e a longitudinalidade: elementos essenciais para o cuidado em saúde mental. Desse modo, pela sobrecarga dos serviços acaba-se por considerar que os sofrimentos afetivos (ou psíquicos) devem ser todos trabalhados em conjunto com o Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF), mais especificamente, ao núcleo de saúde mental do NASF (psicólogas e psiquiatras). O caderno 27 do Ministério da Saúde, ao orientar sobre a atuação do NASF apresenta o trabalho desses profissionais segundo os núcleos de especialidades. Já o caderno 39, mais atual, apresenta uma proposta de trabalho em equipe NASF que desmonta a lógica dos especialismos, compreendendo que processos de saúde-doença-cuidado como compostos por diferentes saberes, borrando as linhas do núcleo e investindo novamente na concepção de saúde como campo – aqui inclusa a saúde mental. Nessa perspectiva, a produção de atos de cuidado envolve não apenas o corpo biológico, orgânico que adoece, mas também o sujeito que o habita. Como construir um trabalho na ESF que inclua esse sujeito e outras categorias profissionais, entendendo saúde mental como saúde ampliada? A proposta do matriciamento em saúde mental parece querer indicar a produção dessa sensibilidade, no entanto, será que essa sensibilidade é restritiva ao campo psi ou o próprio campo psi reforça esse lugar restritivo? Se a proposta da ESF é trabalhar com tecnologias leves e leve-duras, não estaria aqui já pressuposta tal sensibilidade? Como desmontar entre os profissionais essa ideia de que a saúde mental se conforma como núcleo distinto do campo da saúde? Nos parece, que a ESF precisa urgentemente introduzir a saúde mental no campo da saúde, sem desmontá-la completamente enquanto núcleo. Há algo que borra as fronteiras entre os saberes, mas há algo, historicamente, que permanece, dificultando o transitar entre as diferentes perspectivas sobre a saúde.


Palavras-chave


Saúde; Saúde mental; Clínica ampliada; Divisão sócio-técnica do trabalho.