Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Reflexões sobre a difusão dos conhecimentos de plantas medicinais com jovens de uma comunidade ribeirinha
Thaline Castro de Lima, Marcelo Gustavo Aguilar Calegare, Débora Cristina Bandeira Rodrigues, Evelyn Barroso Pedrosa, Mayara dos Santos Ferreira, Paulo Ricardo de Oliveira Ramos, Rommel Gonçalves de Sá

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


Introdução

O alicerce dos conhecimentos de povos residentes em comunidades tradicionais rurais na Amazônia é majoritariamente oriundo de povos indígenas que fizeram e ainda se fazem presentes na região. Estes conhecimentos são herdados e perpassam através das relações sociais e históricas, demonstrando um processo dinâmico e complexo, entendendo que os segmentos sociais que compõe esse contexto não são homogêneos, o que representa uma diversidade de práticas, identidades e culturas em conjunto às peculiaridades regionais. Um dos elementos da cultura dessas comunidades é a utilização de plantas medicinais no trato com a saúde, cujas práticas baseiam-se principalmente nos conhecimentos de sociedades tradicionais e a da medicina tradicional e/ou popular em diferentes culturas.

Comunidades tradicionais são definidas como grupos diferenciados pela cultura que reconhecem, e por possuir organização social, cultural e econômica própria, através da utilização de conhecimentos e práticas mantidos pela tradição oral e transmitidos de geração a geração. Particularmente, as populações tradicionais não-indígenas da Amazônia, dentre as quais as comunidades ribeirinhas, caracterizam-se por proporcionar relevante contribuição para manutenção da diversidade biológica devido às diversas formas de uso e manejo dos recursos naturais dispostos no seu ambiente, baseados nos princípios da sustentabilidade e dos conhecimentos tradicionais que possuem.

O conhecimento tradicional das comunidades ribeirinhas está relacionado aos saberes transmitidos oralmente e às atividades desenvolvidas, adaptadas a cultura local e o ambiente, que acabam por assumir tanto valor de uso, como valor simbólico. Ademais, no decorrer da propagação deste conhecimento de geração a geração, um papel essencial é exercido por todos os grupos etários, sejam jovens, adultos ou crianças. Diante disto, questionamos quais os processos psicossociais envolvidos no reconhecimento, valorização e preservação destes conhecimentos para os jovens.

Os conhecimentos tradicionais sobre plantas medicinais, bem como sua utilização no tratamento em saúde são amplamente utilizados na Atenção Primária à Saúde (APS), considerados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como importantes instrumentos da assistência farmacêutica. A prática de oferecer à população brasileira a utilização de produtos à base de plantas medicinais nos seus cuidados com a saúde incentiva o desenvolvimento comunitário, a solidariedade e a participação social.

Sendo assim, o presente trabalho visa refletir com base na pesquisa de iniciação científica e um projeto de intervenção de trabalho de conclusão de curso, os conhecimentos tradicionais sobre plantas medicinais como um elemento importante à promoção de saúde dentro da comunidade ribeirinha a partir da participação de jovens nesse contexto.

Desenvolvimento

Utilizou-se de observação participante, através de inserção na comunidade ribeirinha localizada no rio Manacapuru – AM realizando registros em diário de campo para posterior análise. Além disso, foi realizado um grupo focal como parte do projeto de iniciação científica, e em seguida iniciou-se o trabalho interventivo que dispôs de duas etapas: 1) uma excursão pela comunidade para conhecer as plantas medicinais; 2) realização de um jogo de tabuleiro humano para testar o conhecimento adquirido na excursão.

O acesso a comunidade se deu por meio da participação da pesquisadora no projeto de extensão vinculado ao Grupo Inter-Ação (UFAM), que atua em comunidades ribeirinhas da região. A equipe foi formada por múltiplas áreas de conhecimento no decorrer da implementação deste projeto, sendo composta por seis pessoas do serviço social, sendo a professora coordenadora, duas mestrandas e três estudantes em serviço social e uma estudante de psicologia.

Resultados

Inicialmente, com a proposta do grupo focal observou-se pouco relato dos jovens sobre o manuseio das plantas medicinais. Verbalizaram sobre a importância de utilizá-las, porém, não identificaram situações que tenham por conta própria utilizado desse conhecimento. Por outro lado, no trabalho interventivo, que se deu através da excursão, as jovens puderam identificar as plantas medicinais e qual o uso delas no tratamento da saúde, sob orientação de duas comunitárias.

Finalizada a excursão, foram formados grupos e realizado um jogo de perguntas e respostas, em que a cada acerto o grupo ganhava pontos. Neste momento as jovens demonstraram conhecimentos relevantes sobre as plantas medicinais, bem como seu manejo para a saúde.

Sobre os processos psicossociais envolvidos no reconhecimento, observou-se que as participantes atribuem efeitos positivos ao uso das plantas medicinais. Quanto a questão de valorização, as jovens relataram que as plantas medicinais são elementos centrais dentro da comunidade para o tratamento na saúde. No entanto, demonstraram pouco conhecimento sobre as plantas e suas aplicações, caracterizando então que o processo de preservação e valorização não ocorre amplamente, pois, os mesmos não se efetivam em suas práticas.

Além destas questões elucidadas no momento da realização da pesquisa através do grupo focal, as jovens verbalizaram preferência por outras alternativas de medicamentos em razão de considerarem desagradável ingerir os oriundos de plantas medicinais, além do longo intervalo de espera que precisam dispor para obter melhora. Foi possível perceber que as jovens não dispunham de tantas experiências práticas no manejo das plantas medicinais, uma vez que não verbalizaram situações cotidianas do uso.

Observou-se que as jovens percebem que a promoção de saúde baseada nos conhecimentos tradicionais sobre plantas medicinais são importantes para a comunidade. Porém, verificamos que aparentemente as jovens não se reconhecem como atores na propagação e aplicação desse conhecimento ou na promoção da saúde através deste recurso, apontaram os adultos como os detentores desses saberes e os responsáveis pela eficácia do uso de plantas medicinais.

Considerações finais

Considerando que os conhecimentos tradicionais são construídos através de gerações, das relações sociais e históricas, dinâmicas, complexas e não homogêneas, através da pesquisa para elucidar o caráter contextual dos jovens, foi possível observar que as mesmas reconhecem os conhecimentos tradicionais sobre plantas medicinais, mas não têm desempenhado o papel de mantenedoras desse conhecimento, bem como o de promoção de saúde a partir deste recurso natural. Acredita-se que o cerne dessa problemática é a cisão de um diálogo entre os detentores desse conhecimento com as jovens.

Ademais, percebemos que o trabalho interventivo fortaleceu o caráter da oralidade presente como característica fundamental do conhecimento tradicional sobre plantas medicinais. Posto isso, adentrar os conhecimentos tradicionais sobre plantas medicinais através de recursos lúdicos e atividades em grupo mostrou-se como uma ferramenta importante à promoção de saúde dentro da comunidade ribeirinha a partir da participação de jovens nesse contexto. Consideramos também importante a extensão dessas experiências para as equipes de saúde da região, uma vez que a parceria com a comunidade nos encontros e reuniões de educação em saúde permite a identificação de líderes locais, formação de alianças e o aumento da autoestima dos indivíduos e do coletivo.

Portanto, nesse contexto, o psicólogo (a) pode atuar em espaços interdisciplinares considerando as singularidades e similaridades de cada grupo ribeirinho, direcionando a devida importância aos aspectos étnicos e identitários que contribuem com a constituição das subjetividades locais, assim como também, na reflexão e sugestão de estratégias para trabalhar promoção de saúde com jovens a partir da realidade de seu próprio contexto.


Palavras-chave


Conhecimento tradicional, comunidade ribeirinha, jovens ribeirinhos, plantas medicinais, promoção de saúde