Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO NO SUS E SUA ARTICULAÇÃO NOS PLANOS MUNICIPAIS DE SAÚDE: ENTRE O PRESCRITO E A REALIDADE
Alisson Maurício Monteiro, Cristian Alex Dala Vechia, Maria Elisabeth Kleba, Letícia de Lima Trindade

Última alteração: 2018-01-02

Resumo


Apresentação

Entendemos que a formulação dos instrumentos e mecanismos de planejamento e gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) devem, impreterivelmente, considerar as construções já estabelecidas no campo da saúde, os subsídios conceituais e organizativos presentes nas políticas públicas que orientam o sistema. Isso não implica em desconsiderar as singularidades das necessidades de saúde locais, muito menos em situar o campo do planejamento e gestão como restrito a especialistas, mas sim, mobilizar os recursos disponíveis para qualificar as ações em saúde. Destaca-se o plano municipal de saúde como instrumento fundamental para implementação das políticas públicas de saúde na práxis do SUS, uma vez que insere as pautas de cada política na agenda dos serviços, tornando-as viáveis. Neste trabalho, realizado no componente curricular “Planejamento e Gestão em Saúde” do Mestrado em Ciências da Saúde da Unochapecó, nos propomos analisar a inclusão da Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão em Saúde no SUS (PNH) em planos municipais de saúde, com o objetivo de desvelar congruências e lacunas entre o que está prescrito na política e o que consta nos planos municipais.


Desenvolvimento do trabalho

Neste estudo, recorreu-se a uma abordagem descritiva/comparativa, utilizando-se de etapas de análise sistemática dos planos municipais de saúde, numa trajetória da apreensão da realidade e do fenômeno de interesse: a inclusão da PNH na formulação do plano. Nesse sentido, buscando identificar intenções dos planejadores da saúde quanto à humanização do SUS, foram analisados os planos de saúde de dois municípios do Oeste de Santa Catarina: Chapecó e Saltinho. Ambos os municípios tem uma realidade distinta, sendo o primeiro um município de grande porte, com mais de 200 mil habitantes, e o segundo um município de pequeno porte, com população de aproximadamente 4 mil habitantes. A escolha dos municípios foi intencional, com o intuito de comparar as realidades e avaliar as possíveis diferenças na complexidade dos planos.


Resultados

A partir da análise comparativa dos planos municipais, constatamos que o termo “humanização” não consta como ação transversal às ações em saúde, mas sim, como um conceito generalista posto na demarcação teórica do plano. Chapecó aponta que o “Plano Municipal de Saúde tem como objetivo a busca pelo cuidado integral e humanizado aos usuários do SUS”, e tem três ações que se aproximam do preconizado na PNH: Implantação do Grupo de Desenvolvimento Humano (GDH); Ampliação e qualificação do acesso humanizado e integral aos usuários em situação de urgência/emergência; e o Programa de Atenção Domiciliar (Melhor em Casa). Já Saltinho cita a humanização como um dos princípios que orientam a Atenção Básica, apontando uma diretriz condizente com a PNH: “Qualificação e humanização das Equipes de Atenção Básica”, cuja ação visa “Promover a qualificação da Gestão do SUS no âmbito municipal, desprecarizando os vínculos de trabalho no Sistema Único de Saúde”. Contudo, nas ações programáticas, ambos os planos desconsideram ações específicas voltadas a esses aspectos.
No que se refere às diretrizes da política, a análise evidenciou que: O Acolhimento é abordado no plano de saúde do município de Saltinho de forma vaga, na medida em que se aponta para o imperativo ético de que toda demanda, necessidade de saúde ou sofrimento deve ser acolhida e cita que as ações da AB devem observar critérios de risco, sem especificar ações nesse sentido. Já o plano de saúde do município de Chapecó, aponta para o acolhimento com classificação de risco, segundo os protocolos ministeriais e a proposta de criação de uma ouvidoria, assim como a proposta de acolher a história do usuário, suas condições de vida e suas necessidades de saúde, no campo das ações em saúde.

A diretriz Clínica Ampliada, não é citada no PMS de Saltinho, tanto em nível de marco teórico, quando no escopo das ações. No PMS de Chapecó, fala-se em promover a criação de novos espaços de produção de saberes e ampliação da clínica, apontando o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) como responsável por essa “ampliação da clínica” no contexto da atenção básica.

Ambos os planos municipais abordam a diretriz Gestão Participativa, mas sem apontar para a possibilidade de Co-gestão no escopo das ações previstas. O PMS de Saltinho cita como objetivo fortalecer a gestão democrática do SUS, garantindo a participação dos trabalhadores do sistema na gestão dos serviços e assegurando condições ao pleno exercício do controle social. No PMS de Chapecó consta o objetivo de fortalecer a gestão e as políticas públicas de saúde, aprimorando a participação social. Ambos os planos enfocam a necessidade de fortalecer os conselhos e conferências municipais, mas sem propor formas de gerar a participação social mais ativa.

A diretriz da Ambiência está, em ambos os planos, implícita nas propostas de melhorias na infraestrutura dos serviços de saúde e, no PMS de Chapecó, faz-se referência a um ambiente “tranquilo e acolhedor” para gestantes em trabalho de parto. Não se fala da ambiência como uma forma de, em todos os serviços, oferecer espaços que acolham os usuários em suas características singulares e atendam às peculiaridades do território.

Com relação à diretriz Valorização do trabalho e saúde do trabalhador, Saltinho apresenta em seu plano de saúde o objetivo de promover Atenção Integral à Segurança e Saúde do Trabalhador, através de melhorias das condições de vida e da atenção à saúde, através de promoção e prevenção. Chapecó, cita no PMS a implantação do Serviço de Atenção à Saúde do Trabalhador (SAST), com o enfoque na promoção, proteção e de reabilitação, a oferta de Práticas Integrativas Complementares, em horário noturno, e a  implementação do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST), com o objetivo de vigilância e prevenção do ambiente de trabalho, formação de recursos humanos na área de saúde do trabalhador e prevenção de acidentes de trabalhos. Em ambos os planos a diretriz Direitos e deveres dos usuários foi citada em pontos referentes a garantia de direitos (direito à informação, acompanhante, acesso, etc.). De uma forma geral, os planos apresentam apontamentos muitas vezes superficiais acerca da PNH, constantes apenas como conceitos adscritos ao marco teórico e descolados das ações propostas no plano. Há também ações que abarcam sentidos voltados à humanização em saúde, muitas vezes descoladas de um aparato teórico que sustente a sua prática.


Considerações finais

Por fim ponderamos que nos planos analisados, a PNH é empregada apenas como uma formalidade, sendo que o termo humanização e as diretrizes da política constam como conceito teórico, desconectadas das ações previstas no plano. A PNH tem aparecimento singelo dentro dos planos municipais, pois é vislumbrada apenas com caráter filosófico ou romancista, sem apresentar uma aplicação prática. Desta forma suas diretrizes acabam por se perdendo, devido ao descrédito apresentado para a mesma. Essa abordagem descompromissada da política vai de encontro com sua real potencialidade, pois  a correta utilização desta importante ferramenta, pode promover saltos da atenção à saúde individual para uma atenção singular aos sujeitos, da separação à conexão entre as ofertas clínicas e dos modos de gestão, da saúde enquanto ausência de sintoma para uma construção social coletiva, sendo, portanto, agregadora de diferenças e reorientadora da atenção em saúde.


Palavras-chave


Humanização; Participação Social; Saúde coletiva; Instrumentos de gestão; Política de Saúde.