Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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DESINSTITUCIONALIZAÇÃO EM SAÚDE MENTAL E AS PERCEPÇÕES DE ACADÊMICOS DE ENFERMAGEM ACERCA DOS CAMPOS DE PRÁTICA EM UMA RESIDÊNCIA TERAPÊUTICA
Letícia Góes, Lília Araújo, Paula Castro, Rennan Bastos, Ruan Freitas, Suelem Santos, Kevin Rodrigues, Thaís Flexa

Última alteração: 2017-12-28

Resumo


Apresentação: A Reforma Psiquiátrica é entendida como um movimento social que mudou a assistência de acordo com os novos pressupostos técnicos e éticos, visando a extinção dos manicômios e substituição destes por serviços territoriais e comunitários de saúde mental em liberdade. No Brasil, este movimento iniciou-se no fim da década de 70 mobilizado por profissionais da saúde mental e por familiares dos pacientes portadores de transtornos mentais, e contribuiu para a criação da Lei 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtorno mental, redirecionando o modelo assistencial em saúde mental. Sendo assim, a desinstitucionalização, entendida como um processo de desconstrução de práticas manicomiais e construção de novos saberes, é tarefa que o SistemaÚnico de Saúde(SUS) vem se dedicando juntamente com tratamento biopsicossociais de reintegração dos pacientes graves na comunidade. O Serviço Residencial Terapêutico (SRT), ou residência terapêutica ou simplesmente “moradia”, surge como uma casa com o intuito de responder às necessidades de moradia de pessoas portadoras de transtornos mentais graves. Os beneficiários podem ser pessoas que estão internadas há anos em hospitais psiquiátricos por falta de alternativas que viabilizem sua reinserção na comunidade; os egressos de internação em Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico; pessoas em acompanhamento nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) os quais têm problema de moradia; e moradores de rua com transtornos mentais severos, quando inseridos em projetos terapêuticos especiais acompanhados nos CAPS. Também existem usuários sem históricos de internação de longa duração, porém, por determinados motivos, precisam de uma moradia pra atender suas necessidades. Portanto, o processo de reabilitação psicossocial deve contribuir para a inserção do usuário do serviço na comunidade, e o papel dos SRT’s é iniciar esse processo progressivo de inclusão social. O objetivo deste trabalho é relatar a experiência dos acadêmicos de enfermagem, da Universidade Federal do Pará, durante uma visita ao Serviço de Residência Terapêutica no município de Belém-PA. Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de um trabalho descritivo, do tipo relato de experiência, das atividades práticas do módulo de Enfermagem em Saúde Mental e Psiquiatria, da Faculdade de Enfermagem, da Universidade Federal do Pará. O trabalho desenvolve-se a partir de uma visita ao Serviço de Residência Terapêutica, no período de junho de 2017. Para o delineamento da visita, primeiramente, foi necessário estudar sobre o assunto em sala de aula, buscando conhecer, analisar e compreender as características de uma residência terapêutica; seu conceito; origem e perspectivas dos SRT’s no Brasil; beneficiários; regulamentação; quais os tipos de SRT’s existentes; a equipe necessária para o acompanhamento; o cotidiano da residência e o estabelecimento de parcerias. Durante a visita, os acadêmicos desenvolveram suas atividades com base na análise do ambiente; localidade da casa; perfil dos moradores; convivência entre eles e entre os cuidadores; perfil dos cuidadores; como se dava o cuidar para eles; e, principalmente, a importância da casa para os moradores e como os acadêmicos poderiam contribuir na reinserção social dos mesmos. Resultados e/ou impactos: A SRT visitada pelos acadêmicos é uma casa como qualquer outra da rua, localizada em uma alameda no município de Belém. A casa oferece dignidade e conforto aos seus moradores, não expressando qualquer semelhança com os manicômios ou hospitais psiquiátricos. A aura do local era de um verdadeiro lar com vínculos e afetuosidade entre os residentes. Os profissionais se dedicam mais aos afazeres domésticos, como cuidados com a limpeza da casa e o preparo de alimentos, pois a maioria dos moradores eram providos de grande independência para com suas atividades diárias, alguns, inclusive, responsáveis pela lavagem de suas próprias roupas, porém, devido ao longo período de internação, alguns apresentavam limitações necessitando, assim, de uma atenção maior. A maioria dos quartos eram compartilhados, mas respeitando o espaço e individualidade de cada um. Todos os moradores faziam acompanhamento no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) próximo da residência que, além do tratamento dos moradores, também cuidava da gestão da residência e manutenção da casa. A maior parte dos residentes era oriunda de hospitais psiquiátricos ou manicômios e haviam passado por longos períodos de internação; um dos moradores passou a vida inteira dentro de uma instituição psiquiátrica. A residência terapêutica propiciou a essas pessoas uma desinstitucionalização e as reinseriu na sociedade, proporcionando acesso a um tratamento mais eficaz e uma vida digna. Essas pessoas sofreram não apenas em decorrência dos transtornos mentais, mas, também, por conta de privações e tratamentos inadequados que receberam em decorrência dos seus problemas mentais. Alguns dos pacientes que ali se encontram sofreram diversos tipos de violência, rejeição e até mesmo exploração sexual por conta de familiares, levando-os a quebra de vínculos afetivos e ao isolamento total da maior parte dos pacientes com os seus familiares. A recepção foi bastante calorosa para com os acadêmicos, estavam todos empolgadas em mostrar os seus espaços individuais na casa, a piscina e falar um pouco sobre a sua história e a transformação do seu cotidiano através do seu novo modo de vida. Os acadêmicos puseram-se dispostos a ouvir atentamente e tentar entender o novo habitar, sendo necessário estar com o coração aberto e um olhar humanizado para os moradores e para entender as características da casa. Ainda, os moradores estavam acostumados a receber os alunos em sua casa, uma vez que isso sempre se dava pelos grupos de prática a cada semestre, o que contribuiu positivamente para uma recepção calorosa e divertida. A aproximação entre todos os membros se deu a partir da sensibilização dos alunos, contribuindo para o alcance de vínculos que auxiliaram no andamento da visita. Considerações finais: O Serviço de Residência Terapêutica é uma representação do avanço da Reforma Psiquiátrica na luta antimanicomial que embora já seja uma realidade, se faz necessário a avaliação e estudo contínuo para melhoria e correções nos serviços, por isso a importância do contato prático pelos acadêmicos de enfermagem, para se discutir e contribuir para a construção do conhecimento na comunidade científica. Além da experiência também influenciar positivamente nos serviços que posteriormente serão prestados pelos enfermeiros, visto que proporciona reflexões acerca da realidade, das mudanças necessárias, do atendimento humanizado e do papel fundamental do enfermeiro como integrante da equipe multiprofissional na Rede de Atenção Psicossocial. A residência terapêutica é uma conquista no processo de desinstitucionalização dessas pessoas, de modo que elas possam desenvolver autonomia para ocupar um lugar no mundo, exercer sua individualidade e gostos e ter sua condição de paciente de saúde mental respeitada e tratada adequadamente.