Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA EM UM CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA NO INTERIOR BAIANO: o papel do profissional não-médico na formação
Márlon Vinícius Gama Almeida, Kátia Cordeiro Antas

Última alteração: 2018-01-30

Resumo


APRESENTAÇÃO: Ingressar na docência foi um projeto que se construiu um pouco antes de terminarmos a graduação, sobretudo pela possibilidade de se desenvolver/envolver com o exercício profissional, ao mesmo tempo em que poderíamos contribuir para/na formação de outros pares, ou ainda, aplicando os saberes adquiridos em nossa formação em profissões outras que pudessem dela se beneficiar. O encantamento da docência sempre nos chegou através das relações e dos aprendizados os quais ela possibilita. Contato com os mais variados discentes de diversos lugares e com diferentes perspectivas. Além disso, é preciso dizer, sempre houve uma certa dose de responsabilização pela formação de novos profissionais, fossem eles da psicologia, da enfermagem, ou de outra área a qual estivéssemos em contato. Parafraseamos Chico Buarque para explicar este espaço de encontro que nos permite “ajeitar nosso caminho para encostar no deles”. Dito isso, o presente resumo tem como objetivo relatar o exercício da docência em um curso de graduação em medicina em uma universidade do interior baiano a partir do lugar de profissional não-médico. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Por razões diversas e que não passavam pela ordem do desejo, ambos viemos para o curso de graduação em medicina, em processo de implantação no interior baiano. Funcionando em estrutura provisória, com entrada anual e que, atendendo às novas orientações do Ministério da Saúde (MS) utiliza as metodologias ativas em suas atividades, sobretudo, o método PBL (Problem Basead Learning) ou ABP (Aprendizagem Baseada em Problemas). Ao chegarmos aqui, no início de 2015, a primeira turma estava no segundo e terceiro semestres, respetivamente. Muitas expectativas em questão, tanto por parte do corpo docente quanto discente, e uma série de elucubrações a serem planejadas, organizadas e colocadas em prática. Dificuldades com infraestrutura, períodos de capacitação e corpo docente em processo de constituição - o que segue até o momento através de concursos para a inserção de novos profissionais. RESULTADOS: Após um longo período exercendo a docência no modelo tradicional de ensino, deparamo-nos com uma nova forma de desempenhar este papel. No nosso caso, em específico, ainda que tenhamos nos encontrado com inúmeras diferenças, também percebemos que várias técnicas já eram por nós utilizadas nas nossas práticas anteriores, a exemplo da aula dialogada e do uso de instrumentos como o portfólio e o diário de campo para acompanhamento dos estudantes e avaliação. Já estamos nesta instituição há quase três anos e, ao longo deste período, entendemos que colecionamos momentos de descoberta e encorajamento, e outros de desapontamento e desterritorialização. Momentos de sentimentos bem positivos e fortalecedores do lugar que ocupamos, e, por outro lado, momentos de incertezas e angústia pelo modo como muitos comportamentos e procedimentos se desdobram neste lugar, sobretudo, quando se fala da classe médica que, em geral, é contaminada por uma gama de vaidades e desinteresses por tudo aquilo que foge ao biológico e se aproxima do social. Isto é, guarda uma compreensão do processo saúde-doença-cuidado equivocada e reducionista, sem se permitir pensar a clínica de maneira mais afetiva e relacional. Nossos desconfortos, se manifestam, sobretudo, por compreender que o processo de ensinagem-aprendizagem deve conter outras dimensões que, infelizmente, não têm sido contemplados neste curso. Em nosso percurso de afetações, houve muitos questionamentos provocados por um grande estranhamento neste papel de professor não-médico. Perguntas como “A quem sirvo? O que faço? Como colaborar? Como melhorar? Como não me afetar sem ser indiferente?” tomam-nos com muita frequência e, dificilmente, encontramos respostas claras e satisfatórias para as mesmas. Uma primeira grande dificuldade foi sair do lugar de formação inicial e disparar um processo de leitura e estudos sobre temas com os quais mantivemos algumas ou poucas aproximações. Outros elementos dificultadores são as relações com pouca troca, pouco diálogo, motivadas, sobretudo, por compreensões de mundo que divergem entre si no que diz respeito ao que é necessário e importante no processo de formação médica. Alguns discentes e docentes não se sentem à vontade com as discussões propostas na atividades que encabeçamos, outros até, entendem que não seria necessário que algumas discussões fossem provocadas. De todo modo, o exercício da docência neste contexto também coleciona momentos de descoberta e encorajamento. Um deles é através da Liga Acadêmica de Produção de Cuidados e Sensibilidades (LAPCS), coordenada por nós, que reúne um grupo de alunos e profissionais diversos, sobretudo da área da saúde, mas que têm, também, a sensibilidade como ponto em comum. Há ainda a confiança de alguns discentes reconhecida no olhar, nas palavras ou num pedido de ajuda, seja de natureza profissional ou pessoal. Ademais, colecionamos novos aprendizados, seja através das novas formas de se exercer a docência, seja pelos depoimentos e vivências com os discentes, seja ainda no enfrentamento de dificuldades diversas que nos arrancam da zona de conforto e nos coloca a pensar em como se reinventar a cada dia. Importante esclarecer que dentre todos esses desafios, entre essas descobertas e encorajamentos, houveram ganhos importantes, como o caso de amizade e a parceria sincera que nasceu entre os autores deste trabalho. Uma relação tecnicamente pouco provável, entretanto, que desafia tais elementos apontando que somos bem diferentes um do outro, mas que, talvez justamente por isso, nos complementamos de modo tão sintonizado. Uma parceria que nos acrescenta profissionalmente, pois sendo de formações diferentes, nós ampliamos nossos pontos de vista sobre o mundo. Essa aproximação também nos auxilia a enfrentarmos as dificuldades impostas pelo curso como um todo, uma vez que ocupamos, também, o lugar de professores não-médicos em uma graduação em medicina. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Por fim, a avaliação que fazemos desta experiência de ser docente em um curso de medicina no interior do território baiano é uma vivência repleta de dificuldades, sobretudo pelos modos diferentes de concebermos o próprio processo de formação médica. É uma vivência que está marcada pela diversidade, seja na formação inicial, na identificação com o curso, no modo como cada um cumpre sua carga horária de trabalho, ou ainda na postura ética e conduta profissional que são adotadas neste espaço. É uma experiência que nos força, diariamente, a nos perguntarmos “O que é nosso?” e “O que é do outro?”. Nos intimida a estarmos atentos ao que fazemos nós e ao que fazem os demais, num esforço de que cumpramos nosso papel da melhor forma possível. E isso acontece porque entendemos sermos parcialmente responsáveis pela formação de profissionais médicos que prestarão seus serviços aos mais variados sujeitos. Todavia, acontece principalmente, porque ambos tivemos, nos nossos processos de educação familiar e acadêmica, a compreensão de que nosso exercício profissional, no caso a docência, deve ser realizado com o que temos de melhor a ofertar, valorizando, inclusive, mais o discente do que seu aprendizado, uma vez que entendemos que a sociedade precisa, sobremaneira, de sujeitos inteiros no seu modo de estar no mundo.


Palavras-chave


Graduação em medicina; Docência; Ensino médico.