Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Consulta ginecológica de enfermagem e a homossexualidade feminina: Uma revisão de literatura
Ângela Barichello, Jucimar Frigo, Suellen Tainá Ribeiro, Fabiane Pertille

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


Desde sua implantação, os programas de assistência à saúde da mulher tiveram um enfoque direcionando as pessoas heterossexuais, particularmente na saúde reprodutiva. Em 1984, o Ministério da Saúde, por meio do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) propôs um conjunto de princípios e diretrizes destinados a orientar a assistência ofertada às mulheres, nas suas necessidades e demandas específicas. Entretanto, o PAISM seguiu focado em questões reprodutivas, ficando as necessidades de saúde expressas nos ciclos da vida das mulheres externos ao período reprodutivo, relegados a segundo plano. A definição de saúde ginecológica implícita no sentido conferido à atenção ginecológica que é expresso no PAISM está limitada a aspectos fisiopatológicos, reiterando-se uma simplificação da concepção de saúde na definição “ausência de doença”, há muito tempo criticada. Além disto, enfocar a saúde ginecológica priorizando apenas aspectos reprodutivos acabava inviabilizando as necessidades de saúde ginecológica de mulheres que não estavam nesta fase.O Ministério da Saúde, ampliou sua agenda programática apresentando em 2004 uma nova política, denominada Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM), a qual segue em vigor. Essa Política propõe a concretização de ações de saúde integral, resguardando as especificidades das diferentes faixas etárias e dos variados grupos populacionais e étnico-raciais (mulheres negras, indígenas, residentes na área urbanas e rurais, de orientação homossexual, presidiárias, com deficiência, dentre outras), indicando-se investimento do Estado na formulação de um novo modelo de atenção, mais humanizado e com mais qualidade, capaz de responder às necessidades das mulheres atendidas nos serviços do SUS. A União Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT) ressalta a preocupação do Mistério da Saúde, em criar políticas publicas e investimentos direcionados aos grupos LGBT. A homossexualidade é considerada como o gosto feminino pelo sexo do mesmo gênero, além de manter relações sexuais exclusivamente com mulheres. No que diz respeito à saúde, a homossexualidade feminina deve ser observada com mais atenção pelos profissionais de saúde, pois, se percebe a falta de adequação dos serviços de saúde em assistir as mulheres com opções sexuais fora daquele tipo considerado padrão. A consulta ginecológica de enfermagem deve também envolver temas relacionados aos aspectos sociais e comportamentais de mulheres homossexuais, bem como garantir a qualidade do atendimento a essa população. Entretanto, percebe-se certo despreparo dos profissionais enfermeiros no que diz respeito ao atendimento direcionado a homossexualidade feminina e orientações sobre sexo seguro. Neste trabalho, objetivou-se refletir sobre os desafios da consulta ginecológica de enfermagem diante da homossexualidade feminina. O desenvolvimento do mesmo deu-se por meio de uma revisão de literatura, utilizando-se 10 artigos, entre os anos de 2013 a 2017, que possuíam como descritores de acordo com o DEC’s: “homossexualidade feminina”, “atenção primária a saúde” e “saúde da mulher”. A revisão oportunizou identificar que o profissional enfermeiro ao assumir uma postura linear de orientação heterossexual, não possibilita abrir-se para o diálogo sobre sexo, a sexualidade e saúde vaginal, permitindo a interpretação de sinais e sintomas errôneos, diagnósticos precipitados e conduções inadequadas dessa categoria de usuárias, sendo possível então apreender as especificidades e necessidades da saúde sexual das mulheres. A consulta precisa considerar as diferenças de atendimento, oportunizar o diálogo sobre sexo e a sexualidade respeitando e reconhecendo as usuárias homossexuais. Por conseguinte, além dos motivos concretos da consulta, têm que ser valorizados, outros incômodos “ocultos” decorrentes da condição do gênero. Apesar de um grande número de mulheres buscarem ajuda nos serviços de saúde para problemas referentes ao sexo e à sexualidade, alguns profissionais de saúde ainda tratam essas questões como assuntos proibidos e vergonhosos. Há omissão dos profissionais de saúde, quando se trata da sexualidade feminina, e isso reforça a ausência de direitos das mulheres à informação de como desfrutar a sexualidade. A sexualidade humana é repleta de tabus e preconceitos que, infelizmente, se manifestam na postura dos profissionais de saúde que atendem mulheres. Isso provoca angústia e revela uma violação ao direito de pensar e agir livremente. Outro grande desafio imposto na consulta ginecológica de enfermagem, é que, historicamente essa área da saúde tem tratado basicamente de aspectos heterossexuais, muitas vezes, tem dificuldades de conceber como relação sexual toda e qualquer relação que não envolva penetração e, dessa forma, que esteja ligada a reprodução. E tal visão, reproduzida nas práticas rotineiras dos serviços de saúde, legitima a falsa noção que o sexo entre mulheres está isento de risco de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis e outras complicações. Outro fator que pode ser encarado como um grande desafio e que pode ser destacado é o relato da orientação sexual para o/a profissional de saúde. Tal fato parece estar relacionado, para aquelas mulheres que frequentam periodicamente o ginecologista, como uma forma de direcionar a consulta à sua experiência, evitando perguntas desnecessárias ou que não fazem sentido a sua vivência. A literatura sobre o tema relata vários episódios de tratamento inadequados relacionados ao relato da orientação sexual. Os episódios envolviam mudança de atitude por parte do profissional, comentários preconceituosos, ausência de oferta de exames clínicos, de mamas ou Papanicolau. Há fatos de o profissional, após o relato, agir como se não tivesse recebido a informação ou como se não tivesse nada a comentar ou orientar a respeito. Os dados disponíveis na literatura sugerem que uma parcela considerável de mulheres homossexuais, não acessa serviços médicos de ginecologia anualmente. As que vão à consulta, o fazem quando surgem sérios problemas e em períodos de maiores agravos à sua saúde. Quanto à realização do exame de Papanicolau, para prevenção de câncer de colo uterino, entre mulheres com práticas homossexuais também se verifica menor proporção.  Com os resultados aqui apresentados, percebe-se que de modo geral os profissionais de saúde ainda não estão preparados para atender as mulheres homossexuais e suas especificidades. Os estudos incluídos demonstram que em alguns serviços e para alguns profissionais enfermeiros o preconceito em relação às mulheres com relações homoafetivas, ainda é uma triste realidade. Faz-se necessário a capacitação dos profissionais que atendem essas mulheres, para que conheçam as suas demandas reais, oportunizando assim uma abordagem adequada. Por sua vez, as mulheres precisam também serem auxiliadas para maior compreensão dos seus direitos e da sua condição de mulher. Notou-se ainda uma escassa produção científica abordando a temática saúde e homossexualidade feminina no Brasil, uma grande precariedade de políticas de saúde consistentes para o enfrentamento das dificuldades e necessidades desta população, o pouco conhecimento sobre suas reais demandas e a ausência de tecnologias de cuidado à saúde adequadas o que converte-se, no âmbito da saúde pública, em desperdício de recursos, em constrangimento durante o atendimento e em assistências e prescrições inadequadas.


Palavras-chave


Saúde da Mulher; Homossexualidade Feminina; Atenção Primária a Saúde