Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Uma conversa sobre a desobediência civil na execução das políticas de saúde e a formação em saúde
Ândrea Cardoso Souza, Ana Lúcia Abrahão, Francisco Leonel Fernandes

Última alteração: 2018-01-06

Resumo


Um trabalho da maior magnitude que se coloca para todos aqueles concernidos em fazer avançar e prevalecer os princípios civilizatórios das reformas sanitárias (o Sistema Único de Saúde, mais concretamente) e a psiquiátrica é o de examinar suas vulnerabilidades, sobretudo aquelas visadas por seus inimigos e manipuladas por eles. A importância dessa formulação se justifica por ela mesma, especialmente considerando a experiência e seu efeitos que os últimos acontecimentos que atingem as redes de saúde, no período de 2016 e 2017, seus programas e ações têm provocado em todos que trabalham para a consolidação das mesmas.

A complexidade de tal tarefa envolve desde a exigência de nos reposicionarmos politicamente, revermos as estratégias argumentativas de justificação, avaliarmos as estratégias e as táticas em curso nos enfrentamentos atuais, até reexaminarmos certos fundamentos teóricos e práticos das ações a luz dos resultados obtidos nestes anos de esforço em implementar o SUS e a Reforma Psiquiátrica.

Evidentemente, nem de longe nos ocorre ensaiar encaminhar tal tarefa, ela concerne a muitos e é muito ampla, embora fosse bem-vinda, nos parece, esforços no sentido de pelo menos elencar seus principais termos. O que propomos nesse trabalho, no entanto, situa-se no escopo dessa pretensão, porém com um foco mais bem definido e localizado numa pequena questão que, pelo fato de ser pequena, não significa ser sem importância, pelo contrário. O que vamos examinar e colocar em discussão diz respeito a um aspecto central nas duas reformas, de certo modo um dos pontos que as ata de maneira substantiva: a questão do vínculo e sua articulação com uma “ética colaborativa e de solidariedade” como central na implementação dos cuidados em todos os níveis da organização da saúde, mas, em particular na Atenção Básica e nos dispositivos das redes de Saúde Mental. O que visaremos será, a partir de uma casuística mínima, e de uma certa genealogia, ressaltar os principais pontos de impasse e de resistência à essa ética especialmente no nível mais próximo da execução dos cuidados junto à população neles concernida. Para tanto, exploraremos os resultados que atingimos com a metodologia “Sombra” de acompanhamento dos usuários em relação aos cuidados por ocasião de pesquisas que realizamos no contexto dos Projetos PET- Saúde que realizamos em Niterói em suas redes de saúde.

O objetivo deste estudo consiste na discussão teórica/metodológica sobre a articulação de modos de agir e cuidar no campo da saúde, a partir da construção de um arranjo pedagógico e de investigação denominado “sombra”. Um arranjo que emerge da articulação interprofissional, usada na constituição do Pró- Saúde e Pet-Saúde na Universidade Federal Fluminense, no município de Niterói. Trabalhar na busca por constituir formas de ensinar/aprender, significa operar e agir sobre conceitos e sobre o campo de experiência que se coloca como um problema do experimentar na existência, pois estamos imersos no mundo do trabalho e do cotidiano dos serviços. Articular vínculo e responsabilidade dos sujeitos envolvidos com a produção do cuidado pode ser um movimento de produzir maneiras de ensinar com outros sentidos e significados. Algo que o arranjo “sombra”, como ferramenta pedagógica apresenta-se potente na dinâmica de ensinar e estabelecer territórios em que a experiência no trabalho se torna capaz de produzir indícios para a construção de projetos terapêuticos e de ensinar que produzam sentido e responda de forma significativa as questões sobre o cuidar e o formar profissionais em saúde.

Como Sombra, ou seja, aquele que segue por toda parte, aluno, professor, usuário e profissional de saúde, identificam indícios que permite, por este arranjo experimentar o processo de saúde/doença a partir da dinâmica da vida. Identificando elementos pedagógicos para a construção de vínculo e responsabilidade, na centralidade do usuário para a produção do cuidado. Na proposta de elaboração do arranjo que denominamos de Sombra, reconhecemos que a aproximação do aluno com o usuário pode se constituir na produção de vários encontros entre sujeitos. Produzindo mediações entre o ensino, o cuidado, e a pesquisa. Este exercício opera como mediação entre acontecimento e estrutura formativa, ressaltar aquilo que se estabelece na vida e aquilo que os serviços reconhecem como assistência à saúde, uma ferramenta de pesquisa e também pedagógica. Podendo ser empregada em diferentes estágios da formação e em diferentes serviços com objetivos que guardam a potencia de expansão do modo de cuidar, centrado no usuário.

Articular vínculo e responsabilidade dos sujeitos envolvidos com a produção do cuidado pode ser um movimento de produzir maneiras de ensinar com outros sentidos e significados. Formação e serviço articulam inúmeras experiências que enfrentam no dia-a-dia, a necessidade de recriar suas práticas e de dar-lhes fundamento e legitimidade social, algo colocado em análise pelo dispositivo sombra.

Formar profissionais o mais próximo da realidade dos usuários, com participação ativa sobre os problemas e necessidades que estão postas na vida, é o principal motor deste processo e convoca profissionais, usuários, alunos e docentes a vivenciar uma permanente tensão entre cuidar/ensinar. O encontro entre o trabalhador de saúde, o aluno, usuário e familiares  revela-se como o principal foco de intercâmbio pedagógico, configurando-se como um cenário produtor de conhecimento e de questões para investigação, além do exercício do cuidado em saúde. Algo que remete ao desafio de construir estruturas pedagógicas que sejam capazes de produzir cuidado e conhecimento a partir do mundo do trabalho e das redes de atenção.

A metodologia utilizada pelo Programa de Educação pelo Trabalho /UFF- Niterói configurou-se num arranjo em que a experiência no trabalho se torna capaz de produzir indícios para a construção de projetos terapêuticos e de ensinar produtores de sentido com respostas significativas as questões sobre o cuidar e o formar profissionais em saúde.

As narrativas produzidas pelos estudantes em articulação com o usuário, nos percursos pelas redes de saúde de Niterói, apontam indícios de uma tensão constitutiva do plano do cuidado na construção de uma prática colaborativa entre os serviços, resultando em uma lógica de desmonte de uma prática que começava a se instituir de modo solidário e centrado nas necessidades de saúde do usuário.


Palavras-chave


Formação;saúde; PET; Metodologias inovadoras