Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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DESAFIOS PARA A PSICOLOGIA EM SITUAÇÕES DE SUICÍDIO NAS POPULAÇÕES INDÍGENAS
Ana Beatrice Colares Rocha, Ingrid Sabrina Batista Costa, Larissa Vitória Lopes Ribeiro De Souza, Lívia Cristinne Arrelias Costa

Última alteração: 2018-01-23

Resumo


A atual conjuntura político-social brasileira tem fortalecido situações de vulnerabilidades diversas das populações indígenas. Em detrimento das formas de vida tradicionais, integradas de maneira saudável com o ambiente natural em que vivem, a sede de lucros cada vez maiores tem destituído este grupo populacional de seus territórios, que significam muito mais do que o espaço geográfico: inclui, inclusive, espiritualidade e identidade. Partindo destas reflexões iniciais, este trabalho aborda uma das questões mais recentes voltadas para as populações indígenas, o suicídio, o qual tem despertado interesse cada vez maior, devido o aumento de sua incidência. Tem como objetivo compreender a ocorrência de episódios de suicídio entre indígenas no território brasileiro a partir de uma revisão da literatura da área da Psicologia, a fim de se pensar em estratégias de atendimento preventivo e pós ventivo junto a esta população. Reconhecer os determinantes sociais da saúde destas populações, bem como os efeitos de uma atitude tão extrema quanto, o suicídio pode ajudar a garantir o sonhado bem viver que tanto buscam os povos indígenas na atualidade. Fatores como o alcoolismo, problemas amorosos, crises políticas e a invasão de território são algumas causas indicadas pela literatura, que deixam as aldeias mais propensas ao suicídio, tornando-se este um ato simbólico de mal estar coletivo que se apresenta individualmente. Para a reflexão inicial aqui proposta, foi realizado um estudo qualitativo de revisão de literatura da área da Psicologia, utilizando-se como descritoras as palavras “suicídio” e “indígenas”, a partir da ferramenta de busca google acadêmico. Foram encontrados treze (13) trabalhos, publicados entre os anos de 2009 a 2017, todos escritos em português. Destes, foram analisados os cinco (5) artigos que apareceram nos resultados. Buscou-se compreender a ocorrência desse fenômeno entre os povos indígenas para que possa haver reflexões e construção de estratégias de acolhimento e atendimento às pessoas que estejam passando por esta situação extrema. Os trabalhos analisados objetivaram problematizar, corroborar com a revisão conceitual do suicídio entre indígenas, assim como apresentar e discutir os dados levantados em pesquisa de campo em relação as condições sociais, as representações sociais do suicídio para populações indígenas, caracterizando os suicidas, descrevendo motivações e as taxas de mortalidade por suicídio. Os trabalhos apresentaram um grupo etário na faixa de 12 a 41 anos, com predominância do gênero masculino. Considerando a importância da juventude para a continuidade das formas de vida das populações indígenas, pode-se pensar neste dado como um alerta para o um possível genocídio ainda em curso no Brasil, este que se iniciou em 1500 com a chegada de colonizadores portugueses. Contudo, o processo atual tem sido invisibilizado por causas diversas, dentre as quais pode-se destacar a formação inadequada de profissionais de saúde para lidar com esta realidade. As regiões descritas nestes estudos foram a cidade de São Gabriel da Cachoeira, o município de Tapauá, ambos no estado do Amazonas; Guaíra, no Paraná e os estados de Roraima e Mato Grosso do Sul. Percebe-se, assim, a ausência de estudos – ou seria de olhares? – mais criteriosos em outras localidades do território nacional, onde existe a presença maciça tanto de populações indígenas quanto do agronegócio, da mineração, da extração ilegal de madeira e da implantação de grandes empreendimentos, os quais tendem a expulsar, quando não dizimar, populações indígenas inteiras de seus territórios. Estes estudos indicaram, ainda, que a motivação para se concretizar o suicídio se dá por diferentes fatores dentre os quais pode-se citar: expulsão do seu território para as cidades, perda de identidades  culturais, conflitos familiares diversos, desemprego ou impossibilidade de garantir a própria subsistência e de seu grupo comunitário, uso descontrolado de álcool e outras drogas, invasão de seu território, doenças diversas e impossibilidade de cuidados a partir dos saberes tradicionais, morte por armas de fogo, exclusão social e falta de alimento. Além de todos estes determinantes, os diversos grupos indígenas espalhados pelo território nacional ainda são incompreendidos em suas crenças, costumes e tradições, por se apresentarem diferentes do padrão euro normativo ocidental, o qual deseja transformá-los em um “igual”, ou civilizado. Contudo, há resistência por parte dos indígenas, grupo mais fraco diante de fazendeiros e grandes empreendedores que detêm força econômica e politica – vide as chamadas bancadas do “boi” e da “bala”, em Brasília. Com o aumento da exclusão social, a morte ritual vem a ser uma resposta de resistência e afirmação cultural, através da qual estas populações buscam o tão sonhado bem viver que lhes foi usurpado. A fim de que não haja negligencia em relação aos direitos dos povos indígenas, é necessário aumento, estruturação e melhor capacitação de equipes dos órgãos públicos que atendem a essa população. Em relação à Psicologia, vale ressaltar a escassez de produções em português que possam auxiliar no desenvolvimento de metodologias e de instrumentais adequados à realidade dos povos indígenas. Sem esta produção, fica difícil criar espaços e momentos de escuta, acolhimento e orientação para os/as jovens, diferente do olhar colonizador, mas de alguém que compreende e acolhe as suas demandas. É importante e necessário que pesquisadores da área da saúde saiam da sua zona de conforto e busquem compreender, perceber a dinâmica própria das comunidades indígenas e pensar em formas de manejo especificas daquela realidade. Assim, as recomendações de políticas públicas de saúde em questões referentes ao suicídio, poderão ser, de fato, concretizadas, pois é essencial que tanto as autoridades públicas, quanto as/os próprias/os profissionais se deparem e reconheçam a realidade em que estes povos vivem. A Psicologia deve lançar um olhar mais qualitativo para esta situação, considerando os múltiplos fatores sociais, culturais e simbólicos que tem levado ao crescimento dos casos de suicídio nas populações indígenas, originaria do território nacional, e que vem sofrendo um etnocídio escancarado desde a chegada dos colonizadores portugueses.  Junto com outras categorias profissionais e mesmo organizações não governamentais que lutam pelos direitos humanos, a Psicologia deve pautar sua atuação em uma ética e responsabilidade que ajude a fortalecer as lutas e resistências próprias desta população, por sua vida com dignidade. A partir do que foi exposto, observa-se que falar sobre o suicídio entre indígenas se torna uma forma de resistência, pois ainda se configura como uma população invisibilizada, pouco reconhecida e negada em suas especificidades e em sua cidadania, inclusive na própria formação em Psicologia, o que se reflete na escassez de estudos e, provavelmente, de reflexões sérias e bem embasadas sobre esta questão. Os dados preliminares aqui descritos devem levar a uma reflexão mais aprofundada a respeito dessa problemática, a fim de se garantir o reconhecimento e o fortalecimento dos modos únicos de vida dos povos originários do território nacional, em uma concepção de direitos humanos. E isto vale para mudanças de postura profissional tanto de quem está na pratica quanto ainda na graduação.

 


Palavras-chave


: Psicologia; populações indígenas; suicídio; bem viver.