Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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PESQUISA-AÇÃO: CONTRIBUIÇÃO PARA CONSTRUÇÃO DE UMA INTERVENÇÃO EM SAÚDE E OS DESAFIOS NUM CONTEXTO DE MUDANÇAS
Marina Ferreira de Medeiros Mendes, Isabella Chagas Samico, Cynthia Resque de Barros Vasconcelos, Cecylia Roberta Ferreira de Oliveira, Hylany Bezerra de Almeida

Última alteração: 2018-01-23

Resumo


Apresentação:

A coordenação dos cuidados tem sido destacada internacionalmente como aspecto fundamental para a organização de sistemas integrais de saúde, pois é identificada como estratégia capaz tanto de garantir a continuidade da atenção quanto de otimizar o uso dos recursos em saúde. Problemas vinculados à coordenação dos cuidados são apontados como um dos principais desafios à organização dos sistemas de saúde em países desenvolvidos e em desenvolvimento, face à fragmentação da rede e à precária comunicação entre os níveis de atenção. Na atividade dos profissionais, a coordenação pode ser entendida como a habilidade para reconhecer, encaminhar os problemas de saúde e promover a integração entre os serviços que os usuários necessitam. Em geral, são considerados três tipos de fatores que influem na coordenação: organizativos da rede, perfil dos profissionais envolvidos e as necessidades de saúde do paciente. Na realidade brasileira, o conhecimento dos profissionais sobre os mecanismos de coordenação entre níveis de atenção ainda é incipiente. A formação inadequada dos profissionais, o pouco tempo disponível e as condições de trabalho influem na precária articulação entre os pontos da rede de saúde. O presente estudo é recorte de uma pesquisa multicêntrica, intitulada “Impacto das estratégias de integração da atenção no desempenho das redes de serviços de saúde em diferentes sistemas de saúde na América Latina - Equity - LA II”, sob a coordenação geral do Consórcio de Saúde da Catalunha-Espanha com a participação de seis países latino-americanos – Brasil, Colômbia, Chile, México, Argentina e Uruguai.

Este estudo tem como objetivo apresentar a estratégia metodológica produzida para a construção e implantação da intervenção “Reuniões Conjuntas entre níveis de atenção” no contexto do Município de Caruaru, Pernambuco, Brasil

Método: Estudo qualitativo, com enfoque na pesquisa-ação para identificação dos problemas prioritários e seleção das intervenções. A pesquisa-ação consiste essencialmente em acoplar pesquisa e ação em um único processo, no qual os atores implicados participam, junto com os pesquisadores, para chegarem interativamente a elucidar a realidade em que estão inscrito, identificando problemas coletivos e buscando experimentar soluções em situação real. Simultaneamente, há produção e uso do conhecimento. O estudo foi desenvolvido no município de Caruaru, com 351.686 habitantes, sede da IV Gerencia Regional de Saúde do Estado de Pernambuco, localizado na região Nordeste do Brasil. A rede de saúde dispõe de 63 unidades de Atenção Primária à Saúde (APS) e 16 unidades de Atenção Especializada (AE).  Os problemas de coordenação foram identificados a partir dos estudos linha base (qualitativo e inquérito), realizados por meio de entrevistas com os profissionais da rede de saúde. Os resultados revelaram falhas nos três tipos de coordenação: informação, gestão clínica e administrativa. Para seleção dos problemas prioritários foram realizadas reuniões, com formação de grupos de discussão, com a participação de profissionais da AB e AE, tendo como facilitadores pesquisadores do Equity LA II e profissionais do Núcleo de Apoio a Saúde da Família (NASF). Os critérios para eleição dos problemas foram: relevância, factibilidade política da intervenção, vulnerabilidade ou resolubilidade e a governabilidade dos atores envolvidos. Os critérios foram apresentados em forma de exposições dialogadas e os problemas mais importantes selecionados, mediante discussões em grupos, utilizando a técnica de consenso. Para escolha da intervenção, investiu-se num processo dinâmico de compartilhamento de informações, tendo como subsídios, além da seleção prévia dos problemas, revisão da literatura sobre evidências de intervenções exitosas, boas práticas e experiências da Plataforma de Profissionais (PP) e Comitê Condutor Local (CCL). O processo foi desenvolvido no período de fevereiro de 2016 a outubro de 2017.

Resultado: A construção da intervenção caracterizou-se por dois momentos articulados: pactuação da agenda estratégica e análise coletiva das propostas de enfrentamento. Foram realizadas reuniões mensais com representantes da gestão, profissionais da rede e equipe de pesquisa. Posteriormente, foram desenvolvidas capacitações nas áreas temáticas consideradas pelos atores como prioritárias: linha de cuidado em diabetes e saúde mental. Os principais problemas identificados foram: falta de acordos em relação aos critérios de referência e contrarreferência, insipiência de reuniões conjuntas e discussões de casos clínicos, precária comunicação entre os profissionais, encaminhamentos desnecessários da AB para AE, desvalorização/falta de confiança na AB por parte dos especialistas e entraves no sistema informatizado. Após as discussões, chegou-se ao consenso que a intervenção prioritária teria como foco “melhorar a comunicação entre os profissionais” por considerarem o seu potencial em repercutir sobre muitos problemas. Na construção da intervenção, de modo transversal, foram constituídos os processos de educação permanente, monitoramento e avaliação. O desenho foi elaborado a partir das seguintes etapas: descrição da intervenção, definição de objetivos, atividades necessárias para implantação, monitoramento, resultados e avaliação. Após análise de viabilidades pelos atores, a intervenção foi definida como “Reuniões conjuntas entre níveis de atenção” e seu desenho tendo como componentes: interconsulta remota entre níveis (plataforma e e-mail institucional), linha de cuidado de diabetes (construção e implantação) e discussão conjunta de casos (matriciamento em saúde mental). O desenvolvimento compreendeu ciclos que se retroalimentaram. Esse processo contribuiu para trabalhar a autocrítica e a reflexão sobre a necessidade de mudanças, além de destacar a importância do protagonismo dos atores locais. As atividades começaram a ser desenvolvidas e incorporadas no cotidiano das unidades. Para o acompanhamento, foram elaborados relatórios mensais de cada reunião do CCL, captando as propostas e mudanças no processo, deliberações e encaminhamentos. Esses relatórios eram enviados para todos os participantes, sendo a execução, estratégias de enfretamento das dificuldades e avanços discutidos nas reuniões seguintes. Porém, após sete meses da experiência em desenvolvimento, fatores relacionados ao contexto da crise política e econômica do  país e a mobilização em torno das eleições municipais em 2016, proporcionaram um cenário fragilidades, incertezas e perda de informante-chaves, influenciando negativamente a participação nas reuniões e adesão dos profissionais. Como estratégias para superar as dificuldades foram intensificados contatos com a nova gestão, repactuação coletiva da proposta, articulação de nova agenda, visitas de monitoramento às unidades e acordos de cooperação.

Considerações finais: A experiência de construir uma intervenção a partir da metodologia da pesquisa-ação constituiu-se numa inovação na forma de planejamento e edificação das proposições. Os diversos olhares (gestores, profissionais e equipe do Equity) contribuíram para ampliar a identificação de fragilidades e entraves, pondo em prática mecanismos de superação. Portanto, foi possível tornar esforços isolados em movimentos articulados, mantendo a proposta da intervenção com adaptação às novas realidades que emergiram no contexto de mudanças da gestão, rede de saúde e no território local. Este modo de produzir/pesquisar possibilitou o encontro entre os dados subjetivos e objetivos, colocando em evidência as implicações dos sujeitos como produtores de saberes, bem como as reflexões de suas ações mobilizadas pelos acontecimentos nos espaços-tempo desta investigação. Percebeu-se que a implementação exige tempo e resiliencia, pela complexidade dos critérios e perfil dos atores. Sua institucionalização dependerá da correlação de forças, podendo atuar de forma sinérgica ou antagônica.

 

 


Palavras-chave


Redes de Atenção, Pesquisa-ação, intervenção em saúde