Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Inovações nas práticas de participação social: aproximações entre Brasil e Itália
Gabriel Calazans Baptista

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


Gabriel Calazans Baptista

Frederico Viana Machado

Marina do Amaral Schenkel

Cristian Fabiano Guimarães

 

 

A participação social é uma diretriz e princípio do Sistema Único de Saúde – SUS, conforme definem a Constituição Federal de 1988 e a Lei 8.142 de 1990.  Percebe-se, porém, que após a institucionalização dos processos de participação nos Conselhos e Conferências de Saúde, tais espaços demonstraram ser insuficientes para fazer frente às necessidades sociossanitárias atuais.  Neste sentido, esta pesquisa buscou compreender o método de planejamento  de políticas públicas e ações no âmbito sociossanitário, denominado Community Lab (CL), desenvolvido pela Agenzia Sociale e Sanitaria Regionale, órgão gestor da saúde na Emilia Romagna, norte da Itália e pela Universidade de Parma, ambos parceiros de pesquisa do Laboratório Ítalo- Brasileiro de Formação, Pesquisa e Práticas em Saúde Coletiva, que conforme aproximações iniciais, indicavam a elaboração de práticas de participação mais sintonizadas com as necessidades em saúde de cada território, e que portanto, poderiam contribuir com o cenário de participação brasileiro.

A escolha deste cenário não é aleatória, uma vez que Brasil e Itália possuem  influência histórica e reciproca na estruturação de sistemas de saúde públicos e universais, baseados na expansão da Atenção Primária como estratégia de organização dos sistemas,  pautando-se no princípio da equidade e da participação da comunidade na construção e avaliação das políticas e ações em saúde. Estas características permitem que as experiências de participação em saúde de cada contexto, mesmo não sendo comparáveis, possam ser colocadas em diálogo na tentativa de identificar elementos comuns e boas práticas.

Para a realização desta pesquisa, assumimos como método o tipo exploratório, tendo a finalidade de compreender  o método Community Lab.  A primeira parte da pesquisa foi composta por entrevistas iniciais, análise documental e revisão bibliográfica. As entrevistas iniciais foram realizadas entre setembro e dezembro de 2015, com a própria Coordenadora da Área de Inovação Social da Agenzia Sociale e Sanitaria della Regione Emilia Romagna e a pesquisadora e professora da Universidade de Parma, responsáveis pelo desenvolvimento do método CL. Tais momentos tiveram papel fundamental para definir o campo de pesquisa e os materiais que deverim ser analisados posteriormente.

Através de legislações e documentos técnicos foi possível compreender o surgimento e estrtura do Servizio Sanitario Nazionale (Serviço Sanitário Nacional). Da mesma forma, as legislações e documentos desenvolvidos pela Agenzia Sociale e Sanitaria Regionale foram importantes para compreender o contexto de desenvolvimento e aplicação do método em questão. A revisão de material científico sobre as estruturas de participação social italianas apontou a existência dos Comitati Consultivi Misti (Comitês Consultivos Mistos) e das Conferenze Del Terzo Settore (Conferências do Terceiro Setor), tendo caráter somente consultivo, apresentando caracteríticas de burocratização e perda de potência das mesmas (SERAPIONI, 2006; MARTINO, 2015), reforçando a percepção das entevistas iniciais.

O segundo momento da pesquisa foi de inserção do pesquisador em campo na Itália, através da observação participante (SOUZA et. al., 2007), realização de entrevistas, participação de reuniões e encontros com os facilitadores do método em questão. Ao todo, foram entrevistados 7 dos 35 casos desenvolvidos desde 2011 e totalizando mais de 50 atores, entre gestores, trabalhadores, integrantes de cooperativas e órgãos de representação e controle social, envolvidos nas propostas.

Assim, pudemos compreender que o Community Lab, surge como proposta para modificar o processo de planejamento das políticas públicas sociossanitárias. Possui três níveis de atuação, conforme a abrangência e impacto das propostas no processo de planejamento de políticas e ações. O nível Micro trabalha questões de um determinado bairro, serviço, ou situação específica. O nível Meso ocupa-se de alguma política específica em determinado município. O Nível Macro, por sua vez, é reponsável pela mudança de todo o ciclo de planejamento em determinado munícipio ou território.

Para a sua execução, possui três distintas fases (Identificação do objeto de trabalho; Elaboração do projeto; Realização das atividades), que se alternam durante a realização das propostas e tem como base conceitual o Experimentalismo (SABEL,2012), Democracia Deliberativa (BOBBIO,2007) e a ideia da aprendizagem como força de mobilização e mudança do processo de trabalho. Apresenta-se como ferramenta potente de mobilização social, articulação de redes e políticas, ampliação do número de atores envolvidos nas propostas, colocando a população e a comunidade (e suas características) como o centro do processo no qual são desenvolvidos ações e políticas menos setoriais e pautadas pela integralidade.

Os casos estudados demonstram as possibilidades e limites da metodologia do Community Lab. Percebe-se de forma positiva que o objeto de trabalho inicialmente proposto em caso sofre mudanças significativas ao longo do processo, conforme novos ateores passam a ser envolvidos na discussão. Os casos meso e macro que incidem diretamente no processo de planejamento, parecem ter maior ou menor êxito nesta tarefa à medida que figuras políticas e cargos altos de gestão compõem os grupos condutores das propostas. Os casos de atuação micro, por sua vez, são aqueles onde o método consegue se aproximar de forma mais natural e contínua dos territórios e população em geral.

Percebemos que o Community Lab aproxima-se muito enquanto método, da proposta de educação permanente desenvolvida no Brasil. Mesmo assim, indica a necessidade de utilizar outros espaços que não somente os institucionalizados como no caso dos conselhos locais e conselho municipal. Indica também que é possível utilizar outras metodologias menos formais (como festas, teatro ou caminhadas de bairro) para promover diálogo com a população. Indica também que talvez dessa forma seja possível ampliar a discussão extremamente setorizada feita nos espaços de controle social, sobretudo nos conselhos locais, tornando-as mais focadas nos sujeitos, e na característica de cada espaço e pautadas pela integralidade do cuidado.

Nesse sentido, indicamos que as experiências de abrangência micro são aquelas que nos parecem mais próximas da realidade dos serviços de saúde estudados no Brasil. Destacamos esses casos neste nível de atuação pois mesmo sem contarem com o apoio político ou dos altos cargos de gestão, foram capazes de articular e provocar mudanças significativas no processo de cuidado produzido nos serviços, além de articularem a rede de serviços, linhas de cuidado e demonstrarem a necessidade de diálogo entre as políticas de saúde e assistência. Portanto, entendemos que um posterior estudo poderia ser realizado com foco específico nos casos de abrangência micro que estão desenvolvidos nas casa da saúde da Emilia Romagna com o método Community Lab, desde o ano de 2016.


Palavras-chave


participação social; controle social; community lab