Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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IMPACTOS DA ESTRATÉGIA BLENDED LEARNING NO PROCESSO DE ENSINO, APRENDIZAGEM E AVALIAÇÃO NO CURSO DE FISIOTERAPIA EM SANTOS-SP
Thatiane Lopes Valentim Di Paschoale Ostolin

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


Apresentação:

O ensino-aprendizagem em saúde se dá na interface saúde-educação, campos abrangentes, interdisciplinares, complexos e dinâmicos. Adicionalmente, os perfis de atuação profissional diversificaram-se. Contudo, observa-se no ensino superior em saúde estudantes desmotivados, desinteressados e sobrecarregados e docentes “multitasking” (professores, gestores e pesquisadores) deslegitimados e desvalorizados. Portanto, o planejamento de ensino precisa romper com os problemas já evidenciados (dicotomia básico-clínica, ensino predominantemente transmissivo, passividade dos estudantes, fragmentação dos conteúdos, enfoque intra-disciplinar e inserção tardia da prática profissional no desenho curricular), conferir espaço para criatividade e flexibilidade de ordenamento, e oportunizar um ensino norteado pelo perfil dos estudantes, sendo papel do docente mediar a relação estudante-conhecimento a partir da significação e ressignificação de conhecimentos prévios. Com base nisso e no descrito no Projeto Político Pedagógico da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Campus Baixada Santista, e Projeto Pedagógico do Curso de Fisioterapia, o plano de ensino de dois módulos obrigatórios, Cinesiologia I e II, foi reformulado. A principal modificação foi a reestruturação dos módulos a partir da estratégia blended learning. Para isso, também foram inseridas na proposta duas ferramentas de ensino-aprendizagem-avaliação: o uso de Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e o uso de metodologias ativas (MA). Tais mudanças tiveram início em 2012 e, desde então, são implementadas semestralmente. Sendo assim, investigamos a influência da estratégia blended learning no ensino, aprendizagem e avaliação nos módulos de Cinesiologia I e II em 2015 e 2016 do curso de Fisioterapia da UNIFESP-BS.

 

Desenvolvimento:

Os planos de ensino dos módulos de Cinesiologia I (Cinesiologia e Biomecânica) e II (Fisiologia do Exercício Aplicada à Clínica) foram reformulados. Amparado na estratégia blended learning, foi feito um redesenho do curso a partir da associação de MA de ensino-aprendizagem, uso de AVA e atividades de Monitoria e Tutoria como eixos estruturantes do processo formativo. Os princípios norteadores foram o papel mediador do docente e o estímulo à postura ativa dos estudantes em busca do conhecimento. Os módulos contaram com dois cenários em composição: sala de aula (presencial) e AVA (Plataforma Moodle). Na sala de aula, participaram estudantes, docente e monitores, estabelecendo relações estudantes-estudantes, estudantes-docente e estudantes-monitores. No AVA, houve a adição da figura do tutor e das relações estudantes-tutor e tutor-docente. Em ambos cenários, o papel de docente, monitores e tutor foi mediar a relação entre estudantes e conhecimento. Presencialmente, as estratégias desenvolvidas foram aula expositiva dialogada, mapa conceitual, solução de problemas e seminário (individual e em grupo) e, virtualmente, fórum, estudo de texto, mapa conceitual e portfólio. A experiência foi analisada a partir da coleta de dados do rendimento acadêmico e histórico de acessos ao AVA e aplicação de questionário sobre uso do AVA em 150 estudantes. Complementando qualitativamente esses dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturas analisadas à luz da análise do discurso com 20 estudantes convidados aleatoriamente após randomização da amostra e delimitados por saturação qualitativa.

 

Resultados:

Mais de 80% dos estudantes utilizou previamente o AVA. As principais diferenças identificadas entre o uso prévio e o uso em Cinesiologia foram: frequência de acesso, recursos utilizados e organização da plataforma. Segundo os estudantes, a soma desses fatores fez com que fosse desenvolvida e estimulada uma “rotina” de estudos via AVA. O uso do AVA requer orientação (86,7%). 61,9% buscaram auxílio do tutor com resolutividade de 61%, e 78,1% contaram com auxílio dos colegas. Todos os estudantes entrevistados garantiram que suas dúvidas e dificuldades foram sanadas pelos monitores ou tutor, presencial e/ou virtualmente.

O AVA foi acessado, principalmente, por meio do notebook e celular com frequência quinzenal (72,4%) e aos finais de semana e/ou nos dias de aula presencial. O acesso ao AVA é fácil e simples (87,7%). O AVA é eficiente na oferta de conteúdos, promoção de interatividade e realização de atividades (88,6%) e contribui para o aprendizado (87,6%), porém a comunicação via AVA e o feedback ainda precisam ser aprimorados (respectivamente, 49,5% e 41%). Para os estudantes, as contribuições do uso do AVA foram a flexibilização, a liberdade e a praticidade em aprender, o estímulo à aprendizagem continuada, o respeito ao ritmo e tempo de aprendizagem de cada estudante e auxílio à síntese do conhecimento (direcionador do processo ensino-aprendizado).

Observamos rendimento acadêmico significativamente diferentes entre os módulos I e II em relação à média das notas das provas teóricas (6,2±1,1 e 5,1±1,5), média das notas das atividades do AVA (8,3±0,9 e 8,1±1,3) e índices de reprovação (4(5,2%) e 11(15,1%)) e exame (5(6,5%) e 15(20,5%)). O módulo II contabilizou maior número total de acessos (50,6±43,6), número de acessos aos materiais de leitura e razão entre número de acessos aos vídeos e total de vídeos em comparação ao I. Todos os estudantes entrevistados mostraram-se favoráveis ao uso de tecnologia durante a formação, em função de estarem a todo instante conectados e isso fazer parte de sua realidade. Todavia, há ressalvas, sugerindo que nem todos os conteúdos podem se beneficiar dessa iniciativa, como conteúdos mais práticos, e que o uso do AVA requer maturidade. Além disso, o AVA foi considerado complementar ao ensino presencial.

Com base em modelos de regressão linear múltipla stepwise, um dos principais determinantes dos índices de rendimento acadêmico foi a participação na monitoria. Em concordância com os achados quantitativos, os estudantes descreveram os monitores como acessíveis e presentes, elogiando sua organização, responsabilidade e liberdade concedida para além dos horários destinados ao estudo-livre. A monitoria foi considerada espaço oportuno de aprendizagem que respeita o ritmo do aprender característico de cada um, isto é, permite “aprender com mais calma”. Para os estudantes, o tutor (presente e participativo) proporcionou alinhamento entre o conteúdo das aulas, das atividades do AVA e da monitoria, e teve papel fundamental no esclarecimento de dúvidas e na comunicação (via WhatsApp) rápida e eficaz  entre docente e estudantes. Sua presença proporcionou espaço de negociação ainda não experimentado pelos estudantes, que o viram como mais sensível a compreender a realidade do estudante em comparação ao docente. O Módulo foi considerado preditor independente das notas finais e da média das notas das provas teóricas. O módulo I apresenta conteúdo marcadamente mais prático em relação ao II, o que contribuiu para observação de padrões diferentes de acesso ao AVA e de frequência e participação na monitoria. Em relação aos dados de uso do AVA, apenas o número de acessos aos materiais de leitura/número total de acessos e o número de acessos aos vídeos/número total de vídeos foram incluídos no modelo. Os modelos responderam de 22 a 37% da variabilidade dos desfechos.

 

Considerações finais:

O uso da estratégia blended learning é eficaz e viável no ensino-aprendizagem de Cinesiologia, Biomecânica e Fisiologia do Exercício Aplicada à Clínica. O uso do AVA foi facilitador e direcionador do processo ativo de aprendizagem, proporcionando aos estudantes flexibilidade, autonomia e autorregulação do processo. A associação entre o blended learning, a monitoria e a tutoria acadêmicas favoreceu a aprendizagem significativa e socialmente construída. No entanto, é necessário continuar problematizando as inovações curriculares recentes, sobretudo em relação ao uso de tecnologias, e investigar sua eficácia, reprodutibilidade e, consequentemente, legitimação no ensino das ciências do movimento humano.


Palavras-chave


educação; fisioterapia; blended learning