Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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INDICADORES, METAS E RESULTADOS COMO ANALISADORES DO TRABALHO DO APOIADOR INSTITUCIONAL: INDICATIVOS DA NOVA GESTÃO PÚBLICA NA SAÚDE?
Cinira Magali Fortuna, MARISTEL SILVA KASPER, MÔNICA VILCHEZ DA SILVA, ERIKA CRISTINA DINIZ, GLÁUCIA TAMBURÚ BRAGHETTO, GABRIELA ALVAREZ CAMACHO, MÁRCIA NIITUMA OGATA, ADRIANA BARBIERI FELICIANO

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


Apresentação: Os diferentes modos de gestão dos processos de trabalho desvelam modelos teóricos e arranjos institucionais que representam, em grande medida, a permanente dialética entre capital e o trabalho. Dentre os referidos modelos, as teorias da administração e as teorias gerenciais carregam importantes disputas entre saberes e poderes antagônicos. Nos anos 2000, um novo modelo de gestão oriundo da área da administração vem sendo introduzido nas áreas da saúde e educação sob a designação de “Nova Gestão Pública” (POLLITT; BOUCKAERT, 2002, FLYNN; STREHL, 2003). O modelo traz como conceitos a qualidade, a eficácia, a construção de indicadores e avaliação, com a valorização de dados objetivos/quantificáveis em detrimento das relações subjetivas/qualitativas indispensáveis nas relações entre gestão-trabalhador de saúde-usuário. Em 1995, o Brasil e o Chile foram os países pioneiros da América Latina a iniciarem a reforma gerencial (BRESSER-PEREIRA, 2017). Em curso, aparece o Programa de Melhoria de Gestão (PMG) do Chile, com o propósito de modernização da administração pública. No Brasil, podemos dizer que vivemos a implementação do SUS influenciadas por essa lógica. No contraponto desse modelo gerencial, no mesmo período, alguns estudiosos brasileiros da área da saúde analisaram contextos e práticas com a centralidade no usuário e a valorização do trabalhador, desenvolvendo projetos, dispositivos,métodos de planejamento, organização do trabalho, processos gerenciais e de gestão com base nos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) (MERHY, 1997, CAMPOS, 2000, FRANCO; MERHY, 2003, MALTA; MERHY, 2003, FELLI; PEDUZZI, 2005, MERHY, 2005). Alguns desses autores destacaram a precarização do trabalho, a alienação, o comando do trabalho pelas tecnologias duras em detrimento das tecnologias leves e leve-duras, a hiperespecialização, dentre inúmeros outros efeitos sentidos nos primeiros anos da década de 2000. O objetivo deste trabalho é refletir sobre indicadores, metas e resultados como analisadores do trabalho do apoiador institucional. Desenvolvimento do trabalho: Consiste na apresentação de dados parciais da pesquisa “Apoio Institucional e Educação Permanente em Saúde em uma região de saúde do interior de São Paulo: uma pesquisa intervenção” (PPSUS-FAPESP 2016/15199-5), realizada com 34 apoiadores da Política Nacional de Humanização (PNH) e articuladores da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS), de 24 municípios do Departamento Regional de Saúde de Araraquara/SP (DRS-III). A pesquisa utiliza o referencial teórico-metodológico da Análise Institucional (LOURAU, 2014), linha Socioclínica (MONCEAU, 2013). Tal referencial indica a atenção aos analisadores como um dos princípios do trabalho na análise institucional. O analisadorconsiste em elementos ou ações que fazem a instituição "falar", ou seja, que mostram o que é oculto na instituição, podendo ser por meio de atitudes, da fala e dos gestos praticados pelos sujeitos (LOURAU, 2014). A produção dos dados da pesquisa tem ocorrido por meio de sessões de grupos de discussão entre os pesquisadores, articuladores de EPS e apoiadores da PNH, com periodicidade mensal, intercaladas com sessões de restituição das análises. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética, sob Protocolo nº CAEE 68438217.8.0000.5393, Parecer nº 2.151.677. Resultados e/ou impactos: A questão da precarização das relações de trabalho representa um grande desafio à atuação dos apoiadores. Essa situação pode desencadear a resistência dos trabalhadores para a participação nas atividades propostas pelos apoiadores. Este é um problema de difícil governabilidade podendo acarretar inseguranças e descontinuidade no trabalho conforme evidenciam as falas a seguir: “[...] Porém nesse momento, a gente teve um processo judicial [...] vai ter que desmembrar alguns funcionários que não são concursados. Apesar de estarem com a gente há muito tempo, eles terão que ser dispensados. Então e querendo ou a gente tá meio em stand-by nesse começo de ano... pra ver se vai haver concurso, se vai haver ingresso desses funcionários como concursados. Então vai ser feito e a gestão tem até junho para se posicionar efetivamente. Então a gente, nesse começo de ano, a gente ainda até suspendeu as reuniões [...]” (Grupo 2 - 16/03/2017). “[...] porque o nosso último prefeito, ele queria que os funcionários rodassem: “ah não tá bom aqui? Três meses aqui, três meses lá [...]” (Grupo 2 - 16/03/2017). Apontam também que o cuidado tem sido operado pela necessidade de cumprimento de indicadores, levando ao produtivismo pelo produtivismo. A perseguição e o cumprimento de indicadores parece ser objeto de atuação e intervenção dos gestores. Por vezes, esta questão é gerada nas demandas do próprio Ministério da Saúde que tem sido indutor dos indicadores que os municípios devem pactuar e cumprir nos seus processos de gestão. Esse cumprir de metas  atravessa o trabalho e a atuação dos apoiadores. A questão que se coloca não é o cumprir ou não as metas, masa finalidade do trabalho em saúde que parece se deslocar ainda mais do cuidado para a realização de procedimentos. Problematizar o cumprimento das metas junto aos gestores e trabalhadores pode ser um caminho de atuação aos apoiadores. Um dos municípios realiza encontros denominados “Café com Resultados”, os quais são restritos aos gestores que ficam com a atribuição de compartilhar com os trabalhadores: “[...] café com resultados”. Toda última sexta feira do mês. A gente fez um... Onde os gestores estão aprendendo junto a olhar os seus números, os seus faturamentos, as suas produções, o que um faz o outro poderia fazer […]” (Grupo 2 - 16/03/2017). Práticas roteirizadas tendem a reforçar o produtivismo e esvaziam a construção de processos de trabalho participativos podendo gerar uma certa alienação do trabalhador, da produção do cuidado em saúde, segundo as necessidades demandadas em cada território, uma vez que se uma equipe cumpre determinado quantidade de procedimentos, isto é tomado como estímulo para que outras equipes cumpram também. Tem-se percebido práticas de gestão que expropriam o trabalhador dos espaços de construção dos processos em saúde, mas impõem sobre esses exigências de produtivismo e resultados.  Considerações finais: Os indicadores, metas e resultados atravessam o trabalho do apoiador institucional, podendo constituir-se como analisadores. A reflexão sobre esses aspectos é fundamental e auxilia na compreensão de que esses indicadores, vindos do novo modo de gestão pública, se tomados de forma acrítica, podem não refletir na melhoria da qualidade do cuidado. Pelo contrário, podem comprometer construções sociais ligadas ao bem público e favorecer a abertura irrestrita a modelos de gestão que estão a serviço do capital e não, propriamente, do trabalho em saúde.


Palavras-chave


apoio institucional, gestão, analise institucional