Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Medicina alternativa através das benzedeiras
Ana Beatriz Tavares dos Santos, Gabriele Silva Marinho, Rodrigo Haruo Otani, Beatriz de Azevedo Nunes, Juliana Alencar de Arruda Câmara, Luís Felipe Jacinto Rêgo

Última alteração: 2018-09-26

Resumo


A falta de assistência à saúde em diferentes comunidades no Brasil introduziu a figura do curador, sujeito que utiliza uma medicina mais empírica e popular, assim a presença do mesmo tornou-se recorrente. O curandeirismo, atividade praticada pelo curador, benzedor ou rezador, tem suas origens no sincretismo religioso e constitui um importante elemento da cultura popular brasileira. A temática sujeitos e singularidades na construção do cuidado em saúde, muitas vezes, não recebe a devida atenção, sofrendo dificuldades de transmissão dos saberes, a maior urbanização e, ainda, o maior acesso a sistemas formais de saúde, objetivando a maior compreensão foi feita uma pesquisa descritiva baseada em entrevistas e representações sociais sobre a atuação de Benzedeiras na prática de curandeirismo em conjunto da reza e utilização de ervas. Para tanto, foram realizadas visitas e entrevistas com algumas das benzedeiras que atuam em Manaus: Mãe Chiquinha, do bairro São Jorge, e Maria do Rosário, do bairro Redenção. Maria do Rosário da Silva Corrêa nascida no município de Porto Velho começou a prática de cura devido à ausência de assistência médica regular no local. O conhecimento de plantas foi passado por sua mãe e o dom da reza por seu pai, formando toda sua experiência na área do curandeirismo, o que em sua família é considerado dom seleto, pois nem todos o recebem. O procedimento de cura sempre é iniciado com a reza acompanhada do terço e em seguida é feito o uso do remédio adequado para a enfermidade; a fé do paciente é indispensável no bom resultado do tratamento. Os remédios preparados pela benzedeira são compostos por plantas que na maioria das vezes estão plantadas no seu quintal, e quando há necessidade de fazer algum remédio com um elemento diferente, as pessoas atendidas por ela saem em busca e o trazem para então finalizar a mistura. O banho com a folha do sabugueiro acelera o processo de cicatrização de feridas, de grande ou pequeno tamanho, sendo usado especialmente em casos de catapora. A inflamação da garganta com secreção é curada pela ingestão da mistura de jambu, crajiru (Arrabidaea chica) e mel de abelha. Para recuperação de osso fraturado utiliza-se a combinação de mastruz, carvão picado, sêbo de Holanda e andiroba. O chá da folha do cipó-alho cura sinusite.Antes de iniciar o tratamento, Maria do Rosário sempre indica a consulta com um médico, pois, para ela, algumas doenças podem ser curadas através de remédios farmacológicos, mas também há outras doenças que nenhum médico pode curar, sendo necessário tratamento espiritual através da reza. Dessa forma, a planta vassourinha doce é usada tanto para tratamento de micoses juntamente com sal grosso e álcool, quanto para curar quebranto na hora da reza. O preparo correto da erva-de-passarinho do cajueiro auxilia na cura do câncer. A maioria das pessoas atendidas por Maria do Rosário são crianças, o caso mais frequente é a massagem em recém-nascidos por cesariana. Há também uma grande quantidade de pessoas adultas, oriundas de diversos lugares, que  buscam seus remédios e rezas. Francisca Martins dos Santos, mais conhecida como Mãe Chiquinha, iniciou a prática curandeira no município de Urucará através de ensinamentos maternais. Seus métodos de cura são baseados no uso de remédios naturais eventualmente acompanhados de reza. As pessoas a procuram por motivos de enfermidades e problemas passionais que atraem mais o público adulto. A mistura de folha de arruda (Ruta graveolens) e álcool é utilizada para aliviar dores de cabeça e a combinação de arruda, casca de tangerina e cravo-da-Índia para o tratamento de sinusite, ambos por inalação. A arruda também é denominada como arruda-fedida, arruda-doméstica, arruda-dos-jardins, ruta-de-cheiro-forte é muito cultivado nos jardins em todo o mundo, devido às suas folhas, fortemente aromáticas. A medicina popular a indica nos casos de supressão da menstruação, por seu efeito fortemente emenagogo. Também possui efeitos abortivos, por causar fortes contrações uterinas que, por sua vez, podem provocar graves hemorragias, aborto e até a morte da mulher. Suas folhas são utilizadas como chá com fins calmantes. Na forma de infusão ou empregando-se as folhas secas em pó, combate os piolhos. Uma crença popular de raiz africana, remontando aos tempos coloniais, dita que os homens usem um pequeno galho de folhas por cima de uma orelha, ou que um galho das mesmas seja mantida no ambiente, para espantar maus espíritos. Desde a antiga Grécia, era usada para afastar doenças contagiosas. Os escravos africanos usavam-na contra mau-olhado. A igreja, no início da era cristão, fazia raminhos de arruda para espargir água-benta nos fiéis. A folha da erva-de-jaboti (Peperomia rotundifolia) utilizada na comida como tempero acalma as pessoas violentas. É considerada planta medicinal, sendo usada como estomáquica, expectorante, contra fraqueza e para banhos aromáticos. É comum na Amazônia, possui maticina e taninos em sua composição, o que lhe faz um forte diurético e hipotensor. A folha de cacau apresenta diversas utilidades no ramo medicinal. O cacau dilata a artéria coronária, aumentando o fluxo de sangue para o coração. De acordo com uma pesquisa produtos naturais como o extrato de cacau pode eventualmente reduzir a pressão arterial. Utilizado nas convalescenças como alimento energético, ataques anginosos, estimula as funções do aparelho urinário, combate as nefrites, é empregado nas fraquezas orgânicas e no esgotamento físico, rachaduras do lábio e bicos dos seios. A manteiga de cacau é usada para fazer loções, bálsamos para o lábio, cosméticos, cremes para tratar queimaduras. O óleo do cacau protege a pele e tem uma vida útil muito longa quando condicionado em boas condições. O pinhão-roxo (Jatropha gossypifolia) é útil para o tratamento de gota e outros tipos de reumatismo. Quando usado topicamente, o macerado das folhas possui ação sobre aftas na mucosa bucal e hemostática ao estancar o sangue. O pinhão-roxo pode ser utilizado como purgativo, os glicosídeos presentes na casca de suas sementes agem como estimulantes da musculatura gastrointestinal. Quando misturado com óleos puros, acelera a cicatrização de furúnculos. Os óleos presentes nas sementes da planta têm características adequadas ao consumo humano, estando dentro das especificações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para óleos. Há também remédios que não são inalados nem ingeridos, são aplicados na pele durante a massagem expelindo mazelas contidas em glândulas, frases como: ‘’Jacaré bedeberê’’ são proferidas pela benzedora necessitando da resposta ‘’Bebebé’’ do paciente.Ambas acreditam no conceito de doença sendo qualquer mazela que afete o estado físico ou psicológico de uma pessoa, compartilhando também a ideia da cura divina ser complementar à cura científica. A atividade curandeira impressiona pelos seus efeitos apesar da resistência da ciência oficial, devido ao componente subjetivo que é a fé daqueles que se submetem à cura. O Benzedor em geral é alguém da própria comunidade, e que recebeu os ensinamentos dos antigos, não cobrando por suas atividades. Os rezadores são típicos das regiões remotas, onde os médicos são escassos e os remédios alopatas inacessíveis. No contexto contemporâneo, a  cura popular das benzedeiras tem sofrido diversas dificuldades. Apresentar os saberes dessas mulheres no presente estudo pode contribuir para a maior participação dessas personagens no cuidado em saúde, conferindo visibilidade às suas práticas e ao modo como se constroem como figuras respeitadas em suas comunidades e valorizadas por seus saberes populares.

Palavras-chave


curandeirismo; benzedeiras; cuidados