Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
ACOLHIMENTO EM SAÚDE BUCAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA EM UNIDADE PRIMÁRIA NO INTERIOR DO CEARÁ
Iana Sá de Oliveira, ANA CAROLINA SOUZA TORRES, Poliana Hilário Magalhães

Última alteração: 2018-01-23

Resumo


No contexto da integração ensino-serviço, o acolhimento em saúde bucal foi implementado em 2016, em uma Unidade Básica de Saúde, na cidade de Eusébio-CE, em virtude da necessidade de se organizar o processo de trabalho da odontologia, já que o acolhimento em saúde no âmbito da enfermagem e da medicina já ocorria na unidade desde 2014.

Diante do exposto, este trabalho propõe-se a relatar o processo de construção do acolhimento em saúde bucal da Unidade Básica de Saúde (UBS) do Eusébio. O estudo pretende identificar aspectos organizacionais do serviço no que se refere a distribuição das demandas, eficácia e resolubilidade das necessidades de saúde bucal dos usuários, delinear fluxos de cuidado em saúde bucal na unidade primária e identificar as possibilidades de rearticulação do fluxo de usuários dentro da rede de atenção.

O estudo trata-se de relato de experiência elaborado por uma cirurgiã dentista residente da Escola de Saúde Pública do Ceará, em atividades de pós-graduação em serviço. A pesquisa desenvolveu-se no período de maio a dezembro de 2016, sendo o cenário do estudo a unidade básica de saúde localizada no bairro Timbu, Eusébio, Ceará. A população de abrangência da unidade corresponde a aproximadamente 3600 pessoas, assistidas por uma equipe de saúde da família composta por uma médica, uma enfermeira e um cirurgião dentista. A equipe de saúde bucal é composta por cirurgião dentista e auxiliar em saúde bucal (ASB) com horários de atendimento divididos em dois turnos (manhã e tarde).

A amostra incluída no relato foi constituída por moradores da área de abrangência da Unidade Básica do bairro Timbú, os quais procuravam atendimento odontológico. A parcela excluída era resultante dos indivíduos adscritos a outra Unidade Básica. Os pacientes participantes do acolhimento em saúde bucal eram identificados, utilizando os prontuários, e a análise observacional do fluxo de pacientes era descritiva, utilizando diários de campo.

A implementação do acolhimento em saúde bucal ocorreu em quatro momentos. O primeiro momento foi constituído pelo processo de territorialização do espaço de atuação, fase de conhecimento das condições de vida e dos processos de saúde-doença. Essa etapa foi concluída no início da residência, ainda no ano de 2015, sendo realizada por todos os integrantes da Residência Multiprofissional. A partir disso, foi possível mapear a área de atuação, identificar grupos e indivíduos expostos a riscos e vulnerabilidades, além de realizar o planejamento estratégico.

O segundo momento foi marcado pela utilização do Fluxograma Analisador, fase de reflexão dos “nós” críticos com a equipe de referência e com os agentes de saúde.O terceiro momento discorre acerca do exame de necessidades com classificação de risco e o quarto momento centra-se sobre o agendamento clínico dos usuários, quando necessário.

O presente estudo está de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras do Conselho Nacional de Saúde (Resolução nº 466/2012). A pesquisa apresenta risco mínimo, pois não apresenta risco direto à saúde física, visto que trata-se de um relato de experiência, com descrições realizadas pelo pesquisador mantendo sempre a ética e o sigilo das informações.

A partir do conhecimento da área, em momento posterior, o fluxograma analisador foi aplicado Essa proposta foi aplicada com a equipe de referência e com quatro agentes comunitários de saúde responsáveis pela área do Timbu. A equipe enumerou alguns casos de saúde bucal e elencou um, considerado o mais frequente na UBS, para construir o fluxograma analisador. Em seguida, houve espaço para discussão e reflexão, assim como para avaliação do momento.

A partir dessa metodologia, observou-se a deficiência do acolhimento para as demandas em saúde bucal, detectando falhas na rede de atenção, principalmente no que tange à organização dos fluxos, ao agendamento e ao tratamento continuado dos usuários. As ações foram construídas à medida que a equipe refletia, intencionando suprir as necessidades de saúde bucal do território. Evidenciou-se a necessidade da consolidação do acolhimento com classificação de risco para a unidade.

Pactuou-se com toda a equipe como seria o acolhimento. Todos os profissionais da unidade de saúde foram calibrados da seguinte forma: o acolhimento odontológico com classificação de risco ocorreria todos os dias, no turno da manhã e da tarde, antes e após os atendimentos clínicos no consultório. Divide-se basicamente em duas etapas: a primeira, exame de necessidades, e a segunda, agendamento clínico, quando necessário.

O agendamento odontológico na unidade básica do Timbu foi organizado da seguinte forma:

• consulta de acolhimento/ urgência: usuário classificado em risco 2 ou 3; necessidade que exige atenção imediata ou no mesmo dia. As necessidades se referem a sofrimento agudo, evolução de risco, potencialidade de prevenção, questões subjetivas e sociais que orientam para a produção imediata de acolhida e vínculo.

• consulta agendada prioritária: usuário risco 1; necessidade que não exige atenção imediata ou no mesmo dia, mas que exige atenção no prazo máximo de 10 dias.  Seja pela situação de saúde em questão, seja pela concomitância de outros fatores de risco;

• consulta agendada normal: usuário risco 0; apresenta situação de saúde ou outros fatores que não exijam priorização. Entra na agenda normal que não pode exceder 30 dias.

O estabelecimento do protocolo de classificação de risco, juntamente com a escuta e colaboração dos profissionais da unidade, resultou em um sistema de organização de agenda padrão para o atendimento odontológico.

Desde o início da implementação, período de 30/05/16 a 22/12/16, foram atendidos 654 pa­cientes no acolhimento, sendo 150 (23%) classificados como risco zero, ou seja, são usuários sem necessidades de intervenções imediatas no consultório odontológico, mas que necessitavam de atividades preventivas; 173 (26,5%) pacientes necessitavam de tratamento odontológico de extrema urgência; 255 (39%) apresentavam urgência; e 75 (11,5%) poderiam aguardar o atendimento (Tabela 1).

Dentre os 428 pacientes urgentes, 119 (28%) tiveram seus problemas resolvidos em uma única sessão. Esta informação foi útil para a reorganização da agenda clínica, onde foram redimensionadas as vagas de pronto atendimento, pois estas vagas aumentadas proporcionam uma maior quantidade de usuários com seus problemas resolvidos.

Os encaminhamentos para a atenção secundária, ou seja, para o Centro de Especialidades Odontológicas do município do Eusébio, ocorriam de acordo com a necessidade. Apenas 82 (12,5%) pacientes foram encaminhados para atenção especializada, principalmente para a área de prótese e endodontia.

A partir da experiência exposta, envolvendo acolhimento e classificação de risco, verificou-se a existência de uma relação profissional-usuário satisfatória e reconhecida pelos usuários, evidenciando um grau de responsabilidade da ESF Timbu com a população. Apesar disso, contradições foram observadas na prática do acolhimento que merecem extrema atenção, tais como: a existência de conflitos e de desarticulação da equipe, a ausência de reuniões para a discussão e reflexões, e a fragmentação do processo de trabalho pela ausência da participação contínua dos profissionais na formulação das propostas dos serviços.

A prática do acolhimento em saúde bucal, além de resultar em tratamentos resolutivos, reforçou o sistema de referência e contra-referência e caracterizou a USF Timbu como porta de entrada da atenção primária, com um fluxograma claro para os usuários.


Palavras-chave


Acolhimento;Saúde Bucal; Classificação de Risco