Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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“Envelhecendo em Comunidade” - Uma comunidade para a Promoção da Saúde
Nilton Bahlis dos Santos, Silvia Costa

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


O Grupo “Envelhecimento em Comunidade” é uma experimentação de pesquisa que parte da hipótese que os problemas da saúde das pessoas na terceira idade, estão relacionados à perda de autonomia devido ao isolamento e descompasso entre as pessoas e as comunidades em que participaram (família, trabalho, amizades, etc.). A fase mais aguda é quando, por discapacidades biológicas (perda de audição, visão, mobilidade, etc...), o idoso começa a não ter mais condições de manter sua autonomia e passa a depender de outros para manter seus sistemas de vida. No entanto o processo se inicia antes, com o enfraquecimento e modificação dos laços familiares, de trabalho, entre outros. Após a crise em uma destas relações que tinha um caráter estruturante,  um fato fortuito pode servir de faísca e acelerar o isolamento. É preciso, de repente, buscar novas formas de manter a vida face a um problema de saúde “grave”, por exemplo. Os problemas se retro-alimentam, aprofundando o “ensimesmamento” e a incapacidade de se colocar novamente em compasso com o mundo que lhe foge ao controle.

Nossa hipótese de trabalho é que com a reversão da tendência ao isolamento, será possível reduzir a perda de autonomia, com um enorme impacto na saúde do envelhecente.

Vivemos a redefinição das relações e das formas de realizá-las. Nossos hábitos e “instrumentos”, construídos, realizados e exercitados por mais de meio século, entram em contradição com uma sociedade cada vez mais dinâmica e complexa.

Nos parece que neste momento em que passamos por um processo de reorganização de sociabilidades e de redefinição das relações e das formas de realizá-las, é muito pouco provável  recompor a vida nas mesmas bases anteriores, da mesma forma que antes, recompondo ou criando uma nova família, conseguindo um emprego “estável” etc., pelo menos ao nível massivo (o que não significa que alguns não consigam). Ao contrário, nossas observações indicam que ao tentar recompor a vida nas mesmas bases de antes, o mais provável como resultado é o fracasso, pois a vida, e nós, não somos mais os mesmos. Esse fracasso gera frustrações que terminam por provocar stress, destruir a autoestima e acelerar o isolamento. Nossa cultura, hábitos e instrumentos, adquiridos e exercitados em mais de meio século, entram em contradição com uma sociedade cada vez mais dinâmica e veloz, com outros objetivos, com outras tecnologias e com outras formas de sobrevivência.

Nossa experiência com tecnologias e práticas interativas, nos mostrou o potencial das comunidades virtuais para criar novas sociabilidades e relações que permitem criar e viabilizar uma comunidade de envelhecentes, auto-sustentada, onde seja possível viver o envelhecimento em comunidade, com troca de experiências e solidariedade.

Com o objetivo de abrigar essa comunidade, foi criado um grupo no Facebook (https://www.facebook.com/groups/1764220020525286/): “um espaço para falar sobre o nosso envelhecimento (...) que contribui para um “envelhecimento comunitário” onde se pode trocar experiências e conversar sobre nossas alegrias e dificuldades, (...) para envelhecermos de forma solidária, produtiva e feliz (...), em comunidade”, conforme sua descrição.

O grupo foi criado em 5 de setembro de 2016 e a partir de novembro, se intensificaram os pedidos de inclusão. Em 9 de janeiro de 2017, atingiu os primeiros 1.000 membros, em junho de 2017 contava com 60.000 membros, em setembro com 80.000, e terminou 2017 com uma população de 100.000 participantes.

Logo de início a aceitação e crescimento do grupo superou nossas mais otimistas expectativas que seria a criação de uma comunidade com cerca de três a cinco mil membros.

Atraídas pela possibilidade de superar sua solidão e  “voltar a viver”, e pelo acolhimento recebido, as pessoas (que inclusive “cobravam” dos outros uma resposta/agradecimento) foram entrando naturalmente, se apresentando e se mostrando, e começaram a perceber a riqueza de experiências de seus novos amigos, de diferentes lugares, que faziam coisas e tinham experiências diferentes. De alguma maneira passaram a ter a sensação de que não estavam mais sozinhos. Como não se percebia uma hierarquia/liderança, pois não existia ninguém para lhes dizer o que fazer e o que era certo ou errado, as apresentações e saudações/acolhimento iniciais foram gerando uma ampla possibilidade de interação/participação, o que dava a oportunidade de percepção das diferenças (onde moravam?, idade?, o que cada um fazia?, o que esperavam do grupo? etc.). Isso atraía pela curiosidade e pelas possibilidades diferentes que despertavam.

No entanto, as diferenças, que no início eram um elemento virtuoso, começaram a gerar um problema. Todos queriam viver o envelhecimento em comunidade, mas cada um tinha uma visão diferente do que poderia ser isso. Cada um visualizava no grupo a possibilidade de viver coisas que imaginavam que lhes dariam felicidade e, aqui está o problema, a felicidade da forma que imaginavam a partir das experiências de felicidade que tinham vivido/buscado anteriormente e não a felicidade no contexto específico em que vivem, enriquecida por aquela multiplicidade de experiências, formas e oportunidades de viver. Isso levava cada um a ver na comunidade a possibilidade de resolver os problemas e desejos que já se colocavam anteriormente e não de experimentar coisas que as outras experiências poderiam lhes indicar.

O resultado foi o início de disputas sobre o que deveria ser a comunidade e como marcar sua identidade (por idade/opções morais, crenças, cor, sexo, nacionalidade, etnia, etc.?).

Nesse momento, pareceu que a diferença entre os diferentes “projetos” terminaria por estraçalhar o grupo, o que começou a preocupar os participantes que queriam continuar e manter sua experiência de viver em comunidade. Acostumados a “autoridades”, isso levou, inclusive, a apelos insistentes de intervenção da moderação que deveria impedir as condutas que lhes desgostava.

Essas disputas ainda se mantém, mas hoje não parecem mais capazes de ameaçar a existência do grupo e suas possibilidades de servir como um imenso Laboratório onde seja possível observar uma comunidade de envelhecentes em vida, e estudar inúmeras questões relacionadas ao Envelhecimento, à Promoção da Saúde e Saúde Coletiva, às Comunidades Virtuais e Redes Sociais, e  à inclusão digital e social.

Nossa atividade na Rede Unida pretende apresentar esta primeira fase de construção e organização  do grupo, avaliando sua experiência e apontando diretrizes para a consolidação e consecução de seus objetivos.



Palavras-chave


Envelhecimento Comunidades Internet