Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE E DESENVOLVIMENTO ADULTO: UM PROJETO DE PESQUISA A PARTIR DE UMA CARTOGRAFIA DAS EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO DE PRECEPTORES NA COMUNIDADE DE PRÁTICAS
Caroline Zamboni de Souza, Maria Claudia Santos Lopes de Oliveira

Última alteração: 2018-01-22

Resumo


Este trabalho apresenta um projeto de uma tese de doutorado em Psicologia que busca investigar a relação entre processos de desenvolvimento adulto e práticas de Educação Permanente em Saúde (EPS) a partir dos relatos de experiência de formação de preceptores na Comunidade de Práticas (CdP). Os objetivos do estudo são: a) identificar e compreender as práticas de EPS e desenvolvimento adulto narradas nos relatos de experiências de formação de preceptores; b) construir dispositivos para ampliação e aprofundamento das narrativas dos Relatos de Experiência dos trabalhadores na perspectiva de explicitar processos de desenvolvimento adulto e EPS; c) facilitar a promoção de EPS e desenvolvimento adulto por meio dos relatos de experiência da CdP; d) analisar as implicações da pesquisadora na facilitação e curadoria de processos colaborativos para ampliação e aprofundamento das narrativas sobre processos de formação de preceptores.

Reconhecer a EPS como um processo educacional que se dá a partir da colaboração dos trabalhadores implica problematizar concepções de formação que tradicionalmente vêm sendo desenvolvidas no campo da saúde. Isso significa que os processos educativos não acontecem somente em momentos previamente agendados, planejados ou autorizados. Eles acontecem espontaneamente ou mediados por intervenções intencionais, no encontro entre as pessoas e nos processos de análise que fazem do seu trabalho. Nesse sentido, consideramos tanto o exercício da preceptoria quanto a CdP ferramentas estratégicas para contribuir com o reconhecimento e compartilhamento de saberes que emergem das práticas dos trabalhadores do SUS.

A CdP foi desenvolvida no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2012 a partir de uma parceria entre o Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde, a Rede Unida e colaboradores. Nela, qualquer cidadão pode criar estratégias de comunicação virtual para compartilhar práticas que tenham relação com a saúde. Apesar de ser aberta a todos, seu foco é o encontro e o compartilhamento de experiências entre trabalhadores do SUS. Ela conta com diferentes propostas de colaboração. Nesse estudo tratamos apenas dos relatos de experiência. A potencialidade dos relatos de experiência contribuem para EPS pode ser vivenciada em experiências como a IV Mostra Nacional de Atenção Básica e a seleção de projetos InovaSUS – Gestão da Educação na Saúde, por exemplo.

A preceptoria é uma prática bastante tradicional no campo da saúde e pode ser exercida a partir de diferentes concepções pedagógicas. Optamos por destacar essas experiências pois acreditamos que essa prática ocupa um lugar privilegiado na construção de processos de aprendizagem e desenvolvimento com o trabalho, podendo configurar-se como um elemento estratégico na promoção de EPS e na promoção da cultura do cuidado integral em saúde.

Os saberes da Psicologia atrelados ao desenvolvimento humano tradicionalmente marcam o campo da educação, da saúde e do trabalho. As clássicas teorias focadas na descrição das etapas do desenvolvimento humano ou a lógica do desenvolvimento de recursos humanos são um bom exemplo desse modus operandi. Apesar de ainda ser uma prática hegemônica, percebemos que existem diferentes formas de produzir ciência em Psicologia, que fazem um questionamento desse paradigma. Há necessidade de avançar na direção da construção de uma prática profissional que supere as tradicionais concepções individualizantes.

Desse modo cabe ressaltar que o desenvolvimento adulto ainda é pouco estudado na Psicologia, diferentemente da infância e da adolescência. A adultez é tida como um momento estável, em que as transformações típicas do desenvolvimento já encontraram sua plenitude e onde a aprendizagem com o trabalho tem uma abordagem hegemônica comprometida com a qualificação da mão de obra para fazer a manutenção da lógica capitalista de reprodução trabalho. Não o reconhece como produção, criação e realização das potencialidades humanas como almeja a EPS. Desse modo estudar as relações entre processos de desenvolvimento adulto e EPS pode potencializar o referencial de educação na saúde que contrapõe a lógica do desenvolvimento de recursos humanos e fortalecer estratégias de formação colaborativa entre os trabalhadores.

O contexto de pesquisa está se dando nos relatos de experiência da Comunidade de Práticas. Os relatos são uma ferramenta de compartilhamento de experiências na forma de textos, fotos e vídeos. Partem de uma narrativa pessoal ou grupal do cotidiano de trabalho. A plataforma virtual disponibiliza perguntas norteadoras para fomentar o uso de linguagens que se diferenciem dos tradicionais meios de divulgação da prática profissional (como os relatórios, artigos científicos, resumos ou anais de congressos, por exemplo). Com isso, pretende reconhecer o valor de diferentes formas de expressão, encorajar a aproximação e interação entre os trabalhadores a partir de uma linguagem familiar e acolhedora, facilitando a expressão e a comunicação dos diferentes atores do SUS.

Os procedimentos utilizados para gerar as informações da pesquisa estão acontecendo por meio de uma pesquisa-intervenção. Nesse tipo de estudo a produção de conhecimento se dá na relação construída entre os participantes e a pesquisadora, contrapondo-se à crença de que a neutralidade e o distanciamento do cientista são responsáveis pelo “rigor científico”. Parte-se da ideia de que um pesquisador não é um coletor de informações, mas alguém que se produz na relação com o outro e que sempre se modifica e é modificado pelo campo de pesquisa. Problematiza a diferenciação tradicionalmente aplicada entre conhecer e fazer, pesquisar e participar, teorizar e praticar.

A pesquisa intervenção está sendo produzida por meio de uma cartografia dos relatos de experiência sobre formação de preceptores. A cartografia propõe-se a investigar processos, acompanhar percursos e por isso provoca uma reversão metodológica. O caminho da pesquisadora não é traçado anteriormente à experiência, mas constituído no encontro com a realidade vivenciada. A pesquisadora, por não ter um horizonte pré-determinado, precisa exercitar diuturnamente a faculdade da atenção e seu compromisso político com a realidade em que está inserida. Seu mapa, seu caminho, é traçado a partir da identificação de potenciais de desenvolvimento adulto e EPS nos relatos de experiência e na criação de dispositivos de facilitação e colaboração com os autores. Há uma aposta nos encontros virtuais que a ferramenta pode promover por meio das ferramentas de colaboração que propõe como os comentários e as avaliações.

Hoje, novas tecnologias de comunicação surgiram e vêm possibilitando diferentes estratégias de criação de redes e mobilização entre as pessoas. As redes sociais da internet têm potencial de problematização das narrativas impostas pelos tradicionais meios de comunicação e pelas práticas científicas hegemônicas. Porém, esse potencial não está dado. É o modo como participamos dessas redes virtuais que pode ou não contribuir com a emergência de novas formas e conteúdos de comunicação e produção científica. Dessa forma compreender como podemos facilitar processos de construção e compartilhamento de conhecimentos que fomentem processos de desenvolvimento adulto e EPS é um desafio das pesquisas no campo da educação na saúde. Esse desafio torna-se ainda mais premente quando se vive um momento histórico em que inúmeros retrocesso nas políticas públicas e na democracia seguem avançando em nosso país e trazendo prejuízos a produção da saúde integral.

 

 

 

 

 


Palavras-chave


Educação Permanente em Saúde; Desenvolvimento Adulto; Comunidade de Práticas; Preceptoria