Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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VER SUS Saúde do Campo: Residências no diálogo sobre formação e fortalecimento do SUS em um território de resistência.
Aryadne Castelo Branco Correia Lins, Antonio Angelo Menezes Barreto, Amanda Araújo das Mercês, Dayane Kelly dos Santos Alves, Raissa Lorena Bandeira Landim

Última alteração: 2018-06-29

Resumo


O VER SUS Saúde no Campo para residentes propõe uma imersão/vivência no cotidiano do campo e da floresta, vivenciando seus determinantes sociais, território (assentamentos, zonas rurais, comunidades quilombolas) opressões, redes de atenção e acesso a saúde e intersetoriais, bem como as singularidades dessa população. Sua concretização contou com parcerias do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), a Universidade de Pernambuco e o Coletivo Pernambucano de Residentes em Saúde (CPRS). O objetivo do projeto é estimular a formação de trabalhadores para o SUS e comprometidos com seus princípios e diretrizes. O projeto foi pensando pelo CPRS e que realizou sua primeira edição no ano de 2015. Neste sentido, este resumo pretende relatar a experiência da segunda edição do VER SUS Saúde no Campo para residentes em saúde. A vivência aconteceu no período de 10 a 19 de outubro de 2016 no Centro de Formação Paulo Freire localizado no Assentamento Normandia, o mesmo é gerenciado e organizado pelo MST Pernambuco, além de representar uma conquista para o movimento, localizado na zona rural do município de Caruaru, zona agreste de Pernambuco. Contando com 40 viventes e 8 facilitadores, todos residentes em saúde, a seleção dos mesmos aconteceu por meio presencial e por carta de intenção para os que não residiam em Recife-PE. As discussões e vivências experienciadas ao longo dos 10 dias do VER SUS foram norteadas por eixos prioritários, como: territorialização, Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta (PNSIPCF), controle social, reforma agrária, Reforma Sanitária brasileira, educação popular em saúde, Política Nacional de Saúde Integral da População Negra e Política de Saúde Mental com ênfase na Reforma Psiquiátrica, contando também com espaços para discussão sobre as diversas formas de opressões (machismo e sistema patriarcal, LGBTfobia, racismo, xenofobia) e como essas influenciam no processo de saúde-doença da população . As vivências e visitações aconteceram no âmbito das Unidades de Saúde da Família e seus territórios de abrangência, Centros de Atenção Psicossocial, Terreiro e dentro do próprio assentamento em espaço de trabalho e produção coletiva (agroindústria). As metodologias utilizadas foram diversas, como: místicas de abertura de cada dia de vivência, dinâmicas de grupo, cine debate, diálogo com convidado externo, momento de autocuidado e espaços autogestionados. É importante destacar a participação de todos os viventes e facilitadores nas atividades diárias de manutenção e limpeza do espaço utilizado, ressaltando a necessidade de refletirmos sobre o processo de coletividade, divisão social do trabalho e inserção na dinâmica de vida das pessoas que ali vivem. Foi evidenciado, através dos relatos dos viventes e facilitadores, a percepção das contradições entre as potencialidades e as vulnerabilidades de um território tão singular como o campo, até então desconhecido pela maioria em seus modos de produção e de vida, desconstruindo leituras prévias da zona rural como um espaço que sobrevive exclusivamente da agricultura. A vivência trouxe um olhar importante sobre as relações de gênero e as diversas formas de exploração de trabalho nesse ambiente, de modo que o acesso e a procura aos serviços de saúde encontram-se diretamente relacionadas a esse contexto. Outros pontos percebidos pelos participantes da vivência e logo diretamente relacionados à questão da qualidade de vida e de saúde da população foram a escassez e dificuldade de acesso a água – resultando em uma mercantilização desenfreada da água -, a dificuldade de transporte na zona rural e a descaracterização do território com o crescente investimento na indústria têxtil que circunda a cidade, fazendo com que famílias inteiras trabalhem na produção de roupas dentro dos próprios domicílios com jornadas de trabalho chegando até 18h diárias – além do trabalho infantil naturalizado, visto que é utilizado para manutenção financeira da família. O VER SUS Saúde no Campo contribui para a aproximação dos residentes em saúde com a população rural, facilitando o diálogo na construção e troca de saberes com as pessoas que produzem conhecimento popular, bem como para uma constante reflexão sobre o espaço que se ocupa enquanto residente, visto que a grande maioria atua em zona urbana onde se apresentam problemáticas bem diferentes das encontradas no campo, fazendo pensar também sobre um importante princípio do SUS que é a equidade.  Esse/a projeto/proposta propicia a compreensão da realidade, considerando a diversidade e complexidade do contexto histórico-social, visto que tem como parte da proposta o objetivo de perceber as diferenciadas formas de exploração do sistema capitalista submetendo as populações a situações de vulnerabilidades sociais e negação de direitos. Ou seja, estimulando a capacidade de analisar criticamente esse contexto e fomentando uma consciência sanitária que contribuirá para o fortalecimento da participação popular em saúde; logo, para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) na perspectiva da atenção integral à saúde da população do campo. O VER SUS Saúde do Campo, inquieta o profissional de saúde em formação e lembra o papel de cada um(a) na consolidação do SUS, na busca incessante pelos ideais da Reforma Sanitária brasileira, visando sempre a dimensão do conceito ampliado de saúde. É imprescindível destacar que a realização dessa edição do VER SUS ocorreu após um golpe político – jurídico – midiático, que resultou no impedimento da continuidade do governo de uma presidenta democraticamente eleita, o que provocou uma discussão que perpassou todos os eixos norteadores da vivência, visto que o momento se apresentava com instabilidade política e perspectivas onerosas para a saúde pública no Brasil, pois diversos ataques ao SUS já haviam sido anunciados, estes ultrapassavam o escopo de desmonte e vislumbrava a destruição de um Sistema de Saúde modelo no mundo. Assim, através de avaliações internas e dos viventes, o VER SUS Saúde do Campo alcançou seu objetivo, garantindo que se proporcionasse não apenas uma vivência na saúde, mas que uma visão global sobre como os contextos sociais e políticos influenciam nos modos vidas da população, e que se faz necessário pensar a saúde do indivíduo como uma complexa combinação de fatores das relações sociais, no mundo do trabalho na comunidade, na família e na vida política.


Palavras-chave


Campo; Formação; Ver sus;