Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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“TODA VEZ QUE EU DOU UM PASSO, O MUNDO SAI DO LUGAR”: O RALI DAS ARTES E AS EXPERIENCIAS COM A EDUCAÇÃO POPULAR NA RESIDÊNCIA INTEGRADA EM SAÚDE
Wanessa Brandão, Maria Norma Colares De Serra

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


O presente relato surge com o intuito de apresentar as vivências de Educação Popular em Saúde desenvolvidas na VI Turma da Residência Integrada em Saúde (RIS) da Escola de Saúde Pública do Ceará a partir da Ênfase Saúde Família e Comunidade em São Gonçalo do Amarante, litoral Oeste do Ceará. A RIS ancorada na Política Nacional de Educação Popular em Saúde, esta realizando uma formação denominada “Roda Gira, o Mundo é Roda” Coordenada pelo Tutor Rafael Rolim. O processo de Educação Permanente desenvolvido a partir do programa da RIS/ESP-CE, possibilita atividades em Educação Popular que buscam a promoção da saúde através da arte, atrelada ao estímulo do diálogo, da problematização, da humanização, da amorosidade, da construção compartilhada do saber, da emancipação e da construção de um projeto democrático e popular para o Brasil. Partimos da compreensão de que outro modelo de sociabilidade é um processo histórico e, ineliminável da realidade social. Processos esses construídos por sujeitos históricos e políticos na arena da hegemonia e da contra hegemonia. A formação citada, estigou(a) intervenções enquanto Assistente Social residente, ancoradas nos fundamentos ético político da profissão, que pautam prioritariamente, a construção de uma sociedade justa, democrática e livre de todas as formas de preconceito e descriminação, e, tem a liberdade como valor ético central. Existem várias convergências entre os fundamentos da Educação Popular sistematizados por Paulo Freire, e os do Projeto ético político do Serviço Social. Podemos ilustrar a construção da autonomia como ferramenta de busca pela liberdade. Essas questões parecem cada vez mais distantes diante do cenário antidemocrático que se encontra o Brasil desde 2016. A Emenda Constitucional que limita os gastos públicos durante 20 anos, a Reforma da Política Nacional de Atenção Básica a Saúde, dentro outros retrocessos, exigem de nosso cotidiano ações permanentes de defesa do SUS, sobretudo, pelo diálogo com a comunidade, em busca de alternativas para o enfrentamento de tal cenário. Percebemos que o Programa autônomo da Residência Artístico Literária Itinerante (RALI) idealizado pela Poeta Maria Norma Colares de Serra, Educadora Popular, Cientista Social e Poeta cearense, também compartilha dos mesmos princípios políticos pedagógicos que buscamos fomentar. Devido aproximação da poeta com a formação em Educação Popular da ESP/CE pudemos desenvolver parcerias nas atividades comunitárias e formativas pautando a Educação Popular em Saúde como um movimento que busca o bem estar mental, físico e espiritual fincado nas culturas populares e demais resistências frente às opressões do capital. O lema “MAIS ARTE, menos acho” surge como estandarte do programa RALI, em especial, pelo reconhecimento da arte e da literatura como elementos políticos e potencializadores de novos modos de sociabilidade e de produzir saúde. Na busca por articular esses elementos nas experiências teórico práticas, a cultura popular do bem viver surge como uma categoria em construção. A valorização dos saberes tradicionais em saúde destacados pela História Oral, a partir da contação de histórias, da comunicação visual interventiva, da mística na ornamentação e da musicalização sertaneja são as bases pedagógicas do RALI. Diversas metodologias são resgatadas do leito histórico da Educação Popular difundida na América Latina, tais como, as cirandas, o Lambe-Lambe, os ciclos de cultura, os jograis, as paródias, etc. Essas atividades são contabilizadas como turnos na comunidade. Ocorrem por exemplo, nas Associações, praças e Unidades de Saúde, onde estamos buscando assessoria junto a Farmácia Viva da Universidade Federal do Ceará em atividades de inclusão produtiva, e, especialmente no fomento ao autocuidado através da fitoterapia. A construção dos Hortos medicinais nas diversas localidades tem sido articulada junto à equipe de Saúde da Família e Comunidade em São Gonçalo, estimulados pela própria população, que de modo geral, ainda utilizam dos saberes tradicionais em saúde, a exemplo do uso da aroeira para cicatrização, do matruz para traumas ósseos, do jenipapeiro do mato, entre outros. A comunidade Amarantina também produz saúde a partir do samba de coco e do reisado, evidenciando a diversidade cultural na região. É nessa troca de experiências que surgem as cirandas com as crianças na Praça da Taíba. Nestes momentos o lazer ganha destaque como elemento do bem-viver. As atividades iniciam com uma rodada de apresentações, usando uma moldura de quadro ornamentada, os participantes respondem as indagações: “Quem sou eu, quem é você, quem somos nós?”. A composição sertaneja da decoração é utilizada como elemento pedagógico de fomento a valorização da identidade nordestina. As contações de histórias estimulam a criatividade das crianças, pois estas são instigadas a inventar e reinventar seus próprios roteiros. A musicalização fica por contas das quengas de coco, que junto aos palitos compõem o enredo da música “O vento voa na praia da Taíba, o vento voa na praia da Taíba...Voa chapéu no morro do chapéu...voa chapéu no morro do chapéu” composta por Maria Norma. A questão ambiental também ganha destaque nos momentos. Reflexões sobre o cenário adverso de ameaça e exploração dos diversos recursos naturais na região de São Gonçalo entram em cena durante as cirandas. A aplicação dos lambes na localidade, destaca a relação entre o lixo, o litoral e a poesia. Percebemos que o Programa da RIS possibilita a inserção no cenário de prática a partir do desenvolvimento de atividades político-pedagógicas que formam na troca entre o saber tradicional e o saber científico, especialmente pelo subsídio da territorialização como processo de reconhecimento da realidade local sobre seus diversos determinantes sociais em saúde. Diante do exposto, reconhecemos que os desafios postos ao SUS na contemporaneidade, a exemplo do modelo de transferências de recursos, demandam intensas ações coletivas e reflexivas nos diversos espaços do cenário de prática. Todos os espaços podem e devem ser utilizados como instrumento de construção de informação com a população, nas salas de espera, na comunidade, nas atividades do Programa Saúde na Escola, nos momentos formativos junto aos profissionais de diversas formações. As atividades quando assumem a troca de saberes e a superação das hierarquias junto à população usuária do SUS, difundem os ideários da Reforma Sanitária e da Luta antimanicomial. A forma lúdica e popular precisa ocorrer de forma crítica e propositiva, reconhecendo os limites de nossa formação sócio-histórica e condição de “Dependência” em relação aos países cêntricos. Os processos e os sujeitos históricos que construíram os campos populares no Brasil precisam ser lembrados, desse modo, não inviabilizaremos as lutas e resistências na construção de um SUS efetivamente universal, integral e que garanta realmente a equidade dentro das desigualdades sociais brasileiras. O fluxo entre a questão social e as políticas públicas é marcado por interesses antagônicos, desse modo os processos pedagógicos como os relatados nesse texto são marcados por desafios, contradições e possibilidades. Ao construirmos estratégias pedagógicas tendo a Educação Popular em Saúde como mediação, assumimos uma posição de enfrentamento ao desmonte do SUS. Sabendo de nossas limitações parafraseamos a poesia de Siba e afirmamos que “Toda vez que eu dou um passo, o mundo saí do lugar”. O RALI das artes e a RIS apesar das limitações estruturais seguem tra(n)çando ações formativas e pautando a Educação Popular em Saúde como mecanismo político pedagógico formativo na defesa do SUS. Isto, porém, só pode acontecer com a participação efetiva do povo brasileiro.


Palavras-chave


Educação Popular; Residência Multiprofissional; Educação Continuada.