Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Participação na construção de política de saúde: o caso da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem
Ana Paula Hemmi, Mônica de Rezende, Tatiana Wargas de Faria Baptista

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


APRESENTAÇÃO: O presente estudo teve como objetivo analisar a experiência de participação no processo de construção da Política Nacional de Saúde do Homem e, mais especificamente, do documento Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH). Em sua “metodologia de construção”, tal documento afirma ter havido a participação de entidades médicas e da sociedade civil, assim como de acadêmicos, pesquisadores e representantes do Conselho Nacional de Secretários de Saúde e Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde. Afirma ainda que a PNAISH é fruto de consensos obtidos nos eventos em que esses agentes sociais participaram. A pesquisa partiu, então, do estranhamento do dito consenso obtido, a partir de ideias democraticamente debatidas, tendo como pressuposto a crença de que as diferenças de conhecimento sobre saúde entre os participantes produzem a aceitação do saber legítimo de uns, que ocupam uma posição de poder, frente aos demais, com consequentes silenciamentos de necessidades e expectativas. Dessa forma, problematizar a participação ocorrida se mostrou importante para compreendermos como diferentes atores compartilham das decisões no processo de construção das políticas de saúde. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Para o desenvolvimento do estudo, recorremos aos ex-gestores da Área Técnica de Saúde do Homem que estiveram à frente do processo de construção do documento, assim como aqueles que foram convidados para participar desse processo. Realizamos entrevistas com diversos agentes sociais envolvidos, além de termos consultado documentos que se mostraram pertinentes. RESULTADOS: Pela análise das entrevistas realizadas e dos documentos, foi possível identificar que houve a discussão da Política em diferentes eventos que ocorreram ao longo do ano de 2008 para os quais foram convidados médicos de diversas Sociedades Brasileiras, tais como de Urologia, Cardiologia, de Medicina de Família e Comunidade e de Pneumologia e Tisiologia, assim como da Associação Brasileira de Psiquiatria e Federação Brasileira de Gastroenterologia. Foram convidados, também, para que pudessem expor seus diferentes conhecimentos sobre saúde do homem, acadêmicos e pesquisadores de Instituição de Pesquisa e de Ensino Superior; de Organizações Não-Governamentais, como Instituto Papai e Promundo; e ativistas da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais. A partir das exposições feitas, os gestores da Área Técnica esboçaram, em consenso entre os eles próprios, o documento intitulado Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem, que foi à consulta pública sendo, posteriormente, aprovado pelo Conselho Nacional de Saúde, em 2009. Este documento foi oficialmente lançado em agosto deste mesmo ano pelo Ministério da Saúde, na gestão do Ministro José Gomes Temporão. Isso nos leva a crer que a participação ocorrida na construção da PNAISH não se tratou de envolvimento de movimentos sociais ou de uma participação social em conselhos ou conferências municipais, estaduais ou federal de saúde. Tratou-se de um tipo de participação denominada “transferência de conhecimento”, em que diversos participantes foram convidados por gestores da Área Técnica de Saúde do Homem do Ministério da Saúde para elaborar o documento. Por transferência de conhecimento, entende-se que há aqueles que decidem sobre o processo e aqueles que participam como convidados, havendo uma distinção entre quem governa e quem é governado. A transferência de conhecimento acontece pela consulta a um público ou a especialistas como forma de se conhecer as necessidades, preferências e valores das pessoas, obtendo, assim, maior efetividade nas tomadas de decisão. Não se trata de um direito a participação, mas sim de uma possibilidade de melhorar resultados. Dessa forma, o foco não está na participação em si, mas nos possíveis resultados positivos, advindos da participação, para uma política em questão. Foi possível perceber que, a despeito da participação ter ocorrido de forma separada e de maneira delimitada entre os diversos participantes, ocorreram outras formas de participação tanto por parte dos médicos, principalmente, da urologia quanto de acadêmicos e da sociedade civil. Os urologistas, desde o início dos anos 2000, já vinham realizando campanhas relacionadas à prevenção de doenças urológicas que acometiam os homens. Além disso, antes mesmo da Área Técnica de Saúde do Homem ter sido criada no Ministério da Saúde e, apesar de José Gomes Temporão, em seu discurso de posse afirmar que a Política de Saúde do Homem era uma de suas metas como ministro de Estado da saúde, os médicos urologistas já estavam debatendo a necessidade de uma política, assim como de uma coordenação de saúde do homem junto a deputados e ao Ministério da Defesa. A parceria estabelecida entre Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) e deputados culminou na realização de Fóruns sobre políticas públicas e saúde e doenças do homem que passaram a ocorrer anualmente na Câmara dos Deputados. Ou seja, se o início desses fóruns, o debate se restringiu a um Simpósio realizado no Hospital das Forças Armadas em 2004, a partir de 2005 a Comissão de Seguridade Social e Família, assim como a Frente Parlamentar de Saúde da Câmara dos Deputados passaram a organizar os mesmos junto com a SBU. Isso significa que, de alguma forma, os urologistas estavam se mobilizando para que a saúde do homem ganhasse uma certa visibilidade pelo governo e que pudessem, consequentemente, tornarem-se médicos de referência na atenção à saúde do homem. Paralelamente a esse movimento da urologia, alguns acadêmicos situados no campo da Saúde Coletiva, também debatiam o tema saúde do homem desde o início dos anos 2000, culminando com a publicação do número temático da Revista Ciência e Saúde Coletiva em 2005. Essa publicação teve como ênfase o debate de gênero para se pensar a saúde do homem. Além disso, as Organizações Não-Governamentais, como o Instituto Papai e Promundo, também vinham fazendo um debate sobre homens e paternidade e homens e violência, respectivamente, desde o final da década de 1990. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Pudemos perceber que a participação anunciada como transferência de conhecimento no documento PNAISH se extrapola e outros movimentos, a partir de uma análise minuciosa, começam a ser vistos como parte do processo de construção da política de saúde do homem. Isso nos mostra que pensar em participação na construção de políticas de saúde implica em extrapolarmos os espaços institucionais e passarmos a olhar que outras estratégias que implicam em ações e discursos que podem fazer parte da construção dessas políticas.

Palavras-chave


Política Nacional de Saúde do Homem; Participação; Análise de políticas