Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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NA RUA E DOENTE: E AGORA? REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE SAÚDE E DOENÇA DE PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA.
Aguiar Gomes Maria José, Rolim Barbosa Leonardo, Gleriano Souza Josue, Pinto Ferreiro Rosa Maria, Pereira Amador Luiz Alberto

Última alteração: 2018-01-22

Resumo


APRESENTAÇÃO: Muitas são as nomenclaturas que variam de uma região a outra do país, que pessoas em situação de rua recebem devido as suas condições sociais, como: trecheiros, migrantes, maloqueiros, mendigos, pedintes, nóias, pedreiros, entre outras. Em todas essas “definições sociais”, atraem sobre si ainda a idéia de que estão nas ruas porque querem. Em São Paulo em 1991, foi realizada uma pesquisa com essa população em que outros termos foram utilizados para classificá-los, surgindo as seguintes distinções: “ficar na rua – circunstancialmente”, “estar na rua – recentemente” e “ser da rua – permanentemente”. O fato é que as pesquisas pouco mostram as “reais circunstâncias”, o período do “recentemente”, e quem atribui o “permanente” nas ruas, se o sujeito que está em condição de rua ou quem analisa os números da pesquisa. A visão da sociedade pouco visualiza que o fenômeno “população de rua” está diretamente relacionado a fatores econômicos, políticos com forte reflexo nas condições de saúde-doença de milhares de sujeitos, com seus direitos básicos violados diariamente. No Brasil, de dimensões continentais é importante conhecer sobre as condições e os riscos de agravos a saúde, essas pessoas possuem, e mais que isso, o impacto que essas condições podem trazer tanto na gestão quanto nas condições de saúde quando se busca o acesso aos serviços de saúde, seja por causas crônicas ou agudas, violência urbana, dependência química ou situações de urgência e emergência, daí a importância da temática em questão, quando se agrega todas os fatores determinantes e condicionantes que influenciam na saúde individual e coletiva. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: objetivou-se verificar o significado sobre saúde e doença, na visão do morador de rua da cidade de Guarujá/SP. Para melhor compreender as questões sociais implícitas no contexto da população em situação de rua, a abordagem qualitativa possui pressupostos imprescindíveis que a fundamentam. O primeiro envolve a singularidade do sujeito, que é ímpar, cada indivíduo é único e conhecê-lo significa ouvi-lo, escutá-lo, permitindo sua revelação por meio da fala, do discurso e da ação. O segundo, reconhece a importância do conhecimento da experiência social, considera as circunstâncias de suas vidas, uma vez que estas configuram um tipo de fenômeno, por isso que a narrativa oral foi fundamental na coleta de dados e análise das entrevistas desse estudo. As entrevistas foram realizadas em 01/2014 e iniciaram após aprovação pelo COMEP da Unisantos sob o nº do Parecer 505.531. Utilizou-se um instrumento para a coleta de dados entre sujeitos que utilizam os equipamentos públicos voltados para esse público, na cidade do Guarujá/SP. Por questões éticas, todos os participantes receberam nomes de pedras preciosas, por possuírem valores agregados em suas falas e experiências de vida. RESULTADOS: As representações sociais são, concomitantemente, campos socialmente estruturados que só podem ser compreendidos quando referidos às condições de sua produção e aos núcleos estruturantes da realidade social. Foram entrevistados quatro pessoas em situação de rua. Suas percepções sobre saúde e doença são muito mais do que a mera presença ou ausência de sinais e sintomas. Como veremos nas falas: Rubi compreende saúde como um conjunto de produtos sociais que variam desde a alimentação até a liberdade para realizar seus sonhos sem culpa, a despeito do que os outros irão pensar ou não: “Olha saúde é a pessoa ser limpa, é ter bom dentes, é se alimentar bem, é sabe pelo menos lê um pouco num digo muito mas pelo menos um pouco é muito bom saber lê, é... ‘tê’ uma religião que é uma coisa que eu num tenho, mas é muito bom [...] eu num tenho casa, [...]eu vou passar a ter minha casa, que é saúde pra mim, é... uma pessoa sê feliz... inte é entender a situação, e num culpa ninguém, entendeu, da situação e nem se senti culpado, que eu sou assim, eu não culpo ninguém da minha vida e nem me sinto culpada, sê tá entendendo?” Rubi relata doença física e destaca a ‘doença da alma’, que são as que mais causam dores: “Olha, doença eu já tive doença no pulmão. E essa pressão né que judia de mim, judia e eu não sinto nada sê entende?... Eu num sinto nada agora se ela baixa pra 16 minha filha eu num levanto, se vê que coisa, Deus me livre se ela abaixa. É uma doença covarde[...] como tem também doenças de pessoas que só pensam mal só deseja mal só, sei lá né, isso também é uma doença pior que tem né? [...] se agente vai falar que não é só aquela doença de corpo doença é doença de mente, de alma, né que também machuca e dói ‘pa’ caramba”. Para Quartzo, saúde é ausência de dor, disposição para trabalhar, ser bem humorado e não se irritar com os amigos: “Saúde é você ter um corpo saudável, que não dói, que você deita de noite, descansa, dorme... Você ter disposição pra você ‘trabaia’, você não se irrita a toa, não fica nervoso com os amigo, acorda de bom humor, vai ‘trabaia’ de bom humor porque não tem dor... Entendeu? Isso pra mim é saúde...”. Doença para Quartzo acontece pelo fato de ter que se esconder por ter Tuberculose, mas ele lança uma questão: e quem tem essa doença e não protege nem a si e nem aos outros? Como observamos na fala: Essa é uma coisa ruim. A tuberculose que você tem que andar escondido... Porque ninguém senta perto de você, só senta quem entende... Quem não entende não senta perto, ai eu falo pra eles, se a pessoa tem medo de pegar tubeculose ele num anda nem de ônibus, não vai na feira livre, não anda na balsa... Porque é cheio de pessoas com tubeculose mas não usa a máscara porque tem vergonha, então é fácil de pegar...”. Para Diamante, tanto a saúde quanto a doença estão ligadas a espiritualidade: “Pra mim é a melhor coisa na vida é a saúde. É a melhor coisa que uma pessoa pode ter. Vida é saúde, primeiramente Deus, né? Sou católico, mas acho que Deus existe porque depois de Deus é a saúde da pessoa... A pessoa sem saúde e sem Deus eu acho que não é nada...”. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Esse trabalho evidenciou que as pessoas em situação de rua compreendem a saúde como um conjunto de necessidades que precisam caminhar juntas. São pessoas autônomas de suas próprias histórias, mesmo tendo seus direitos de cidadania desrespeitados diariamente. Nosso país é rico sob muitos pontos de vistas. Entretanto, cada dia mais pessoas vivem nas e das ruas, esse trabalho demonstrou essa realidade. O Brasil, que há mais de vinte anos viveu a chamada estabilidade econômica, ainda não se constitui um local de oportunidades iguais para todos os brasileiros. Muitas são as conquistas percebidas, porém, quando olhamos para as atuais circunstâncias políticas e econômicas nos deparamos com a realidade de que há muito ainda a ser feito, partindo do cumprimento de princípios básicos assegurados por lei, a cada cidadão. Educação, saúde, trabalho, moradia, transporte, lazer e oportunidades sociais são direitos de todos e dever do Estado proporcionar o acesso a eles.


Palavras-chave


saúde-doença; representações sociais; população de rua