Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A FRAGMENTAÇÃO NA DIMENSÃO DA REDE ASSISTENCIAL DE SAÚDE
Wirlley Quaresma da Cunha, Ingrid Fabiane Santos da Silva

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


Apresentação: O modelo assistencial foi concebido para constituir-se na forma de sistema ou rede de serviços, visando a garantia do acesso e a resolubilidade das demandas em saúde. Deste modo, de acordo com os princípios do SUS, as ações e serviços de saúde devem ser organizados de forma hierárquica e regionalizada. Efetivamente, significa dizer que a atenção deve se estruturar em níveis de complexidade tecnológica crescentes (atenção básica, média e alta complexidade), com serviços dispostos em uma área geográfica delimitada e, possuindo uma população a ser atendida definida. No entanto, em revisão bibliográfica realizada durante pesquisa de dissertação de mestrado, na qual buscou-se conhecer como a literatura acadêmica da Saúde Coletiva aborda o tema da fragmentação na saúde, percebemos que vários dos autores analisados apontam elementos problemáticos no que diz respeito à rede assistencial de saúde. Nosso intento neste foi reunir os principais aspectos apontados pelos autores quando se referem à fragmentação no contexto da rede assistencial, a fim de auxiliar na melhor compreensão deste problema frequentemente mencionado na literatura. Desenvolvimento: Trata-se de uma revisão bibliográfica do tipo narrativa. O levantamento foi realizado em setembro de 2016 nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SciELO, utilizando as palavras-chave “fragmentação” e “saúde”. Adotamos como critério de seleção: texto integral estar disponível online, ser escrito em língua portuguesa e ter como eixo temático o sistema de saúde brasileiro. Não delimitamos um período específico para as publicações, pois buscamos abarcar amplamente as publicações sobre a temática. Ao todo, foram recuperados 249 artigos, sem excluir aqueles comuns a mais de uma base. Depois de realizada a leitura dos títulos e resumos de todos os textos foram excluídos os trabalhos que versavam sobre os serviços de saúde privados, a formação dos profissionais de saúde, a educação em saúde, políticas ou programas oficiais e sistemas de saúde estrangeiros, ficamos assim com uma amostra final de 56 trabalhos. Resultados: A ideia de um sistema de saúde pressupõe uma boa articulação entre os seus componentes e os diferentes níveis de atenção, justamente pela interdependência e interrelação existente entre os seus dispositivos. No entanto, a partir da interpretação dos resultados obtidos foi possível perceber que a integração da rede assistencial não vem se concretizando, o que coloca em questão a característica organizativa essencial do SUS. A falta de articulação entre os serviços de saúde sem dúvida é um dos principais aspectos presentes nos estudos analisados ao se referirem à fragmentação na rede assistencial. Os autores afirmam que os pontos de atenção à saúde estão dispostos de forma isolada e, as ações e serviços são desenvolvidos de forma desarticulada. Tais apontamentos evidenciam fragilidades da assistência que afetam sobremaneira a eficácia nas respostas às necessidades atuais, em que se destacam as condições crônicas. Uma das razões para a dificuldade de integrar os serviços e ações justifica-se, segundo alguns autores, pela lógica hierárquica que orienta a organização do sistema. Verifica-se que no atual modelo assistencial se destaca uma estruturação piramidal, com graus de importância variados, que aumentam proporcionalmente à complexidade tecnológica quanto mais se aproxima do topo. Assim, em virtude da valorização social dos serviços hospitalares e especializados, os serviços de menor densidade tecnológica – como os da Atenção Básica – são tidos como “mais simples”, o que prejudica o reconhecimento da necessidade de complementariedade na rede assistencial. Nesse sentido, cada nível hierárquico desempenha uma função específica, sendo atribuída única e exclusivamente à Atenção Básica a responsabilização pelo “coletivo”, enquanto os demais níveis cuidam da cura e da reabilitação. Em vista disto, a estratificação dos serviços de saúde é comparada à organização de um modelo de produção de cunho taylorista/fordista, no qual a racionalização dos processos produtivos é determinante para a eficácia e maximização da performance. De fato, há um desalinhamento claro entre os objetivos do sistema de saúde e o modo como a rede assistencial vem se delineando, isto pode se justificar pelo fato de a concepção biomédica estar ainda enraizada nos profissionais de saúde assim como na população, que reclama por serviços clínicos. Por outro lado, existe também um sistema de pagamento por procedimentos que corrobora uma atenção à saúde em que é incentivada a quantidade de intervenções ao invés da qualidade do cuidado. Nesta lógica assistencial, os pontos de atenção atuam separadamente e a comunicação entre eles se mostra deficitária. A desarticulação comunicacional e o fluxo de informações incipiente na rede assistencial são aspectos observados em várias pesquisas e, considerados obstáculos à continuidade da atenção. Em alguns casos, o compartilhamento de informações clínicas se restringia a guias de encaminhamento, laudos de exames ou então, o próprio usuário era a fonte de informação, situação que pode levar a erros, procedimentos desnecessários e reduzir a eficiência da atenção. Desta forma, o cuidado na rede assistencial não vem ocorrendo de forma compartilhada, ao contrário disto, impera a prática do encaminhamento, na medida em que a responsabilidade pelo usuário é repassada quando o serviço acessado não possui os recursos técnicos necessários para lhe atender. O usuário se vê em condição semelhante à de um consumidor ao ingressar em um estabelecimento que não oferece o produto ou serviço de que necessita, tendo de ir a outros lugares até encontrar o que deseja. Assim, não se constrói vínculo e o usuário muitas vezes fica perdido no sistema. Como forma de garantir a longitudinalidade do cuidado é atribuída à Atenção Básica a responsabilidade pela coordenação do cuidado na rede de atenção. A AB seria a responsável por ordenar a atenção, estabelecer vínculo com o usuário e acompanhá-lo durante seu percurso no sistema de saúde. Segundo o relato dos autores estudados, isto não vem ocorrendo, a coordenação se resume muitas vezes à função burocrática dos encaminhamentos, repassando a responsabilidade pelo usuário e impossibilitando a continuidade e a longitudinalidade do cuidado. Considerações: Notadamente há uma lacuna entre o modelo de saúde projetado no contexto da Reforma Sanitária e a forma como ele se concretiza – o chamado SUS real –, isto se deve a uma gama complexa de fatores que foge ao propósito deste trabalho. As dificuldades concernentes à integração na rede assistencial têm consequências diretas na qualidade da atenção ofertada aos usuários. Os sistemas de saúde devem se organizar em consonância com as necessidades de saúde de uma população, o SUS surge exatamente em decorrência das reivindicações da sociedade brasileira por um modelo assistencial capaz de dar respostas adequadas às demandas de saúde. Todavia, as condições de saúde no Brasil vêm se modificando e, este modelo vem se mostrando incapaz de reagir satisfatoriamente a este novo quadro.


Palavras-chave


Fragmentação; Rede assistencial; Assistência à saúde.