Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A preceptoria para graduação no âmbito da atenção primária à saúde: perfil, processo ensino-aprendizagem e o quadrilátero da formação a partir da percepção dos sujeitos no município de São Paulo/SP
Afonso Luis Puig Pereira, Celso Zilbovicius

Última alteração: 2021-12-17

Resumo


Apresentação

A formação de graduandos da área da saúde com foco nas necessidades de saúde da população continua sendo um desafio a ser enfrentado por gestores, educadores e trabalhadores. Esta formação envolve atores das instituições de ensino, da assistência à saúde, de todas esferas de gestão e da comunidade compondo a integração ensino-serviço-gestão-comunidade.

Como um elo estratégico desta integração, destaca-se a figura do preceptor, profissional do serviço que assume o processo pedagógico de inserção dos graduandos nos serviços de saúde, sendo responsável pela atenção à saúde e que tem como função ensinar, dar suporte, orientar e compartilhar experiências com estudantes no cenário de trabalho.

Os objetivos do estudo foram: a - revelar as competências, as motivações e a formação para o exercício da preceptoria; b - conhecer como o processo ensino-aprendizagem vem sendo realizado e vivenciado; c - saber qual a participação de cada face do quadrilátero e se existem barreiras anti-pedagógicas e de processo de trabalho, a partir da perspectiva de preceptores de graduação no âmbito da APS, no município de São Paulo/SP.

Desenvolvimento do trabalho

Realizou-se de uma pesquisa descritivo-exploratória de abordagem qualitativa, entrevistando-se 14 preceptores de estudantes de graduação em saúde, no âmbito da APS, no município de São Paulo/SP. A fim de manter o sigilo dos sujeitos da pesquisa, seus nomes foram substituídos pela transliteração das letras gregas.

Foi realizada análise de conteúdo temática e a pesquisa obteve parecer 2.745.563 do CEP da FOUSP.

Resultados

Os participantes da pesquisa eram médicos (8), enfermeiros (4), odontólogos (1) e agente comunitário de saúde (1), sendo todos trabalhadores de UBS. A média de idade foi de 35,1 anos e 64,5% gênero feminino. O nível de escolaridade mostrou que 71,5% possuíam ao menos uma especialização e 57,1% alegaram receber incentivo financeiro para exercer a preceptoria. Somente 4 profissionais tiveram formação para preceptoria previamente.

Numa análise qualitativa, conhecer o processo ensino-aprendizagem e exercer a andragogia é essencial para a preceptoria.

E não só conhecimento técnico, mas também, conhecimento sobre como passar (Iota).

É importante compreender sua atuação no SUS na perspectiva epidemiológica e ter comprometimento civilizatório frente ao contexto social.

Acho que você tem que ser um profissional que está engajado com a comunidade, que se sente responsável por isso, é responsável pela sua equipe […] porque eu acho que antes de ser preceptora, eu sou médica e responsável sanitária daquela comunidade (Iota).

Conhecimento clínico não é determinante para o exercício da preceptoria, sendo uma competência que pode ser aperfeiçoada ao longo do processo de ensino e trabalho.

Do ponto de vista de competências técnicas, um bom preceptor tem que ser bem formado (Lambda)

O encontro entre preceptor e estudante é pautado em uma relação bilateral promovendo conhecimento, estimulando a atualização e o aprendizado.

A gente ensina o que a gente sabe e aprende coisas com cada aluno (Dzeta).

O preceptor merece maior destaque e reconhecimento nos cenários de ensino.

Eu acho que remuneração seria importante […] seria ótimo e valorizaria mais o trabalho. Te estimularia mais (Iota).

O participantes da pesquisa demonstram motivação para formar no e para o SUS, com a intenção de fortalecer a rede de serviços.

Minha motivação é porque eu queria que se formassem médicos voltados para a atenção básica (Mu).

Revela-se um anseio por formação voltada para características da função e, específica, em andragogia.

A gente deveria ter uma formação em preceptoria. Eu acho que seria fundamental (Gama).

Sobre o processo ensino-aprendizagem, apesar da utilização do cenário de prática, com a possibilidade de ações potentes na APS, a maioria não problematiza os processos ou a realidade.

[…] eles acompanham a minha equipe […] Alguns ficam comigo no consultório, alguns vão para VD (visita domiciliar) com os agentes de saúde. Então, eles têm famílias que eu determinei que eles fazem esse acompanhamento (Beta).

Destaca-se que apenas os preceptores que realizaram algum tipo de treinamento em preceptoria citaram metodologias ativas como a problematização.

Eu gosto da discussão por pares, então eu estimulo muito que seja feita a discussão entre os internos no momento da discussão, tentando trazer elementos que já façam parte do repertório científico e do repertório de vida deles (Kapa).

Verificou-se a complexidade do processo avaliativo percebidas pelos preceptores entrevistados.

Como realmente eu vou conseguir avaliar se aquela pessoa aprendeu ou não no estágio, porque às vezes eles podem estar só passando lá e não terem adquirido conhecimento nenhum, está só cumprindo o horário (Mu)

No que tange a integração ensino-serviço a distância da IES provoca uma sobrecarga para maioria dos preceptores devido a falta de apoio organizacional e pedagógico.

Deveria ter uma participação maior da instituição de ensino. (Theta)

É importante destacar que alguns preceptores receberam capacitação, previamente à inserção de estudantes na UBS.

A gente recebeu uma preparação da faculdade para poder recebê-los com a proposta de que esses alunos acompanhariam a gente durante seis anos (Beta)

Há um desinteresse por parte de docentes e das IES em apoiar o SUS como política quando se percebe uma tendência de reforço das especialidades em detrimento da saúde pública.

Dificulta, eu acho que é o fato de a APS não ser muito valorizada no ambiente da faculdade […] é muito estimulada essa cultura do médico especialista. (Nu)

Há esforço em se realizar atividades de ensino ao mesmo tempo em que se presta assistência.

Na verdade a nossa agenda não favorece a preceptoria. Ela não é ajustada para isso. (Epsilon)

Percebe-se como positiva a experiência do trabalho multiprofissional.

Eu acho que é sempre enriquecedor. Eu sou muito, muito, a favor da equipe e da gente trabalhar junto e construir conhecimento e trocar tudo isso (Iota)

Os preceptores notaram a estrutura da UBS como barreira na perspectiva do serviço.

A UBS com certeza não foi pensada como um meio de ensino (Epsilon).

Existe uma insatisfação com as esferas de gestão, sobretudo, a municipal.

Em relação à esfera da gestão, eu acho que eles são muito distanciados de tudo que está acontecendo (Lambda).

Em compensação foi identificado apoio da gestão local, como um fator de contribuição à preceptoria.

A gerência (da UBS) tem o internato como prioridade, senão a preceptoria seria completamente deixada de lado (Nu).

Notou-se o distanciamento da população sobre os processos decisórios da formação.

Olha, comunidade pouquíssima integrada. Eu sinto na comunidade, quase um laboratório (Mu).

Considerações finais

Conclui-se que formar profissionais que exercem a preceptoria é essencial para compor um perfil pedagógico adequado, fomentando no profissional seu papel de educador e instrumentalizando-os de ferramentas metodológicas e avaliativas..

Sobre a integração ensino-serviço-gestão-comunidade as barreiras principais foram: sobrecarga de trabalho, desvalorização da saúde pública, falta de apoio pedagógico e distanciamento da comunidade no processo formativo. Entre as contribuições destaca-se o trabalho interprofissional e a aproximação entre as instituições de ensino e a gestão quando planejam o estágio.

Para além de sua implicação direta no processo ensino-aprendizagem com estudantes, balizado pelas DCN, o preceptor contribui para a integração ensino-serviço-gestão-comunidade dado seu lugar estratégico: profissional do serviço de saúde, exercendo função docente articulada com a IES, a gestão e a comunidade.