Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A coordenação do cuidado pela Atenção Primária à Saúde na Rede de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas na região de saúde Norte do Espírito Santo
Amanda Morais Polati, Ana Paula Santana Coelho Almeida, Thiago Dias Sarti

Última alteração: 2021-12-16

Resumo


Apresentação: A mudança do perfil epidemiológico da população, com um aumento expressivo das doenças crônicas não-transmissíveis mundialmente, tem exigido uma nova forma de organização dos serviços de saúde com o intuito de superar a fragmentação da atenção. Isto se faz necessário uma vez que indivíduos com doenças crônicas são considerados usuários frequentes dos serviços de saúde e acessam serviços de diferentes níveis de atenção, encontrando-se mais suscetíveis a vivenciarem um cuidado fragmentado. Nesta perspectiva, o desenvolvimento da coordenação do cuidado pela Atenção Primária à Saúde (APS) tem sido evidenciado como atributo essencial na oferta de um cuidado integrado e integral aos usuários com doenças crônicas. No Espírito Santo (ES),  até a última gestão, o estado buscou investir na organização do sistema de saúde em redes de atenção através da Planificação da Atenção à Saúde (PAS) e no fortalecimento da Rede de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas, por meio da implantação da Rede Cuidar nas regiões de saúde, implantando Unidades de Cuidado Integral à Saúde (UCIS) destinada à indivíduos portadores de doenças crônicas classificados em alto e muito alto risco. Com isso, o objetivo deste estudo foi analisar o papel da APS  na coordenação do cuidado na Rede de Atenção à Saúde a Pessoas com Doenças Crônicas em uma região de saúde do estado do Espírito Santo.

Desenvolvimento do trabalho: Trata-se de uma pesquisa descritiva de natureza qualitativa, desenvolvida na região de saúde Norte do ES, primeira região do estado a passar pelo processo de organização da atenção à saúde por meio da PAS e implantação da Rede Cuidar. Os participantes  foram gestores e profissionais atuantes na APS de cinco municípios desta região. A coleta de dados ocorreu de junho a dezembro de 2020, por meio de um roteiro de entrevista semiestruturado, onde utilizou-se um evento traçador, Acidente Vascular Encefálico (AVE) decorrente de Hipertensão Arterial (HA) na construção do roteiro. As entrevistas foram realizadas individualmente através de aplicativos de videochamada. Os dados foram analisados por meio da técnica de análise temática de Braun e Clarke, utilizando uma abordagem teórica dos dados, e em consonância com a literatura pertinente à temática.

Resultados: As categorias temáticas propostas, a partir da análise das entrevistas, basearam-se nos seguintes pilares e dimensões da coordenação do cuidado: coordenação clínica – capacidade de resolução da APS, posição ocupada pela APS no sistema e capacidade de resolução após AVE; coordenação administrativa – organização dos fluxos para Atenção Ambulatorial Especializada (AAE) e integração entre equipes e serviços; e coordenação da informação – instrumentos para continuidade informacional. De maneira geral, identificou-se, através da realização da presente investigação, uma frágil atuação da APS enquanto coordenadora do cuidado dos usuários com doenças crônicas. As fragilidades evidenciadas atravessam todos os pilares da coordenação analisados e possuem uma relação com desafios já assinalados na literatura nacional e internacional que se referem à Rede de Atenção à Saúde (RAS), não restritos a atenção às pessoas com doenças crônicas. Foi possível identificar uma maior facilidade nas equipes de saúde da família ao realizarem a coordenação do cuidado horizontal, sendo a maior parte dos obstáculos referentes à coordenação vertical. Em relação à coordenação clínica, os participantes destacarm desafios que comprometem diretamente a resolutividade da APS e a sua condição enquanto porta de entrada na rede de atenção às pessoas com doenças crônicas, como a inexistência de protocolos assistenciais municipais, as interferências no agendamento de consultas médicas e a debilidade na atuação do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (Nasf). Contudo, alguns esforços foram evidenciados no desenvolvimento deste pilar, como a realização de classificação de risco, a oferta de visitas domiciliares e garantia de consultas na unidade e a realização de grupos de educação em saúde. Dentre as dimensões da coordenação adminstrativa, a ausência de fluxos estabelecidos, a insuficiência de vagas para serviços da AAE (principalmene aqueles de responsabilidade estadual), desafios no processo de integração e comunicação entre profissionais de diferentes pontos de atenção e a ausência de contrarreferência para a APS, são alguns obstáculos mencionados pelos participantes que interferem na integração entre os diferentes níveis de atenção e, consequentemente, na continuidade do cuidado ofertado ao usuário. Em contrapartida, algumas tentativas de superação destes desafios foram evidenciadas, no âmbito municipal por meio da participação dos municípios em consórcios intermunicipais para otimização do acesso à AAE, assim como no âmbito estadual, através da implantação do processo de descentralização da regulação estadual. Na coordenação da informação, os participantes salientaram problemas referentes a utilização do prontuário eletrônico (PE), enfatizando a ausência de interoperabilidade do PE, problemas com conectividade e disponibilidade de computadores nas unidades e o uso concomitante do PE e prontuário físico. É imprescindível destacar as interferências diretas da pandemia de Covid-19, apontadas pelos participantes, no que se refere ao desempenho da coordenação do cuidado pela APS dos usuários com doenças crônicas, sobretudo em relação a garantia da continuidade do cuidado, sendo mencionado pelos participantes a ocorrência de episódios de complicações nos usuários devido à ausência de acompanhamento dos mesmos. Também foi evidenciado a influência positiva da Rede Cuidar na região estudada e suas contribuições na atenção às pessoas com doenças crônicas, com destaque para a instituição da realização da estratificação de risco dos indivíduos com doenças crônicas pelos profissionais da APS; a oferta de um cuidado por uma equipe multiprofissional; o aumento da disponibilidade de vagas para algumas especialidades e exames na região; assim como a realização de contrarreferência para a APS, com o intuito de ofertar um cuidado integrado e contínuo.

Considerações finais: Através da realização desta investigação, foi possível identificar e corroborar com pontos críticos que se referem ao desenvolvimento da coordenação do cuidado pela APS na atenção às pessoas com doenças crônicas. Os desafios evidenciados relacionam-se com todos os pilares da coordenação analisados (clínica, administrativa/organizacional, informação) e foram acentuados durante a pandemia de covid-19, impactando diretamente no alcance da oferta de um cuidado contínuo e integral de acordo com as reais necessidades dos usuários. Entretanto, é importante valorizar e destacar esforços identificados tanto no âmbito das equipes de saúde da família quanto da gestão municipal e estadual com o intuito de superar os desafios existentes. Assim, faz-se necessário a realização de maiores investimentos da macro, meso e microgestão do Sistema Único de Saúde (SUS) que tenham como objetivo apoiar e priorizar ações que favoreçam a coordenação do cuidado pela APS na rede de atenção à saúde de maneira geral.