Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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RELATO DE VIVÊNCIA DE UMA AÇÃO EXTENSIONISTA EM TEMPOS DE PANDEMIA
Cláudia Maria de Lima Graça

Última alteração: 2021-12-14

Resumo


Quando a Organização Mundial de Saúde declarou uma pandemia ao mundo, em março de 2020, vários gestores adotaram medidas de isolamento social visando a diminuição da transmissibilidade do novo coronavírus, associado a doença denominada “coronavírus disease 2019 (COVID-19)”, que se tornou o maior problema de saúde pública mundial dos últimos anos.

De um dia para o outro, ocorreu em várias cidades brasileiras, o fechamento das escolas, universidades, praças, parques e locais de atividade física, afastando adultos e crianças do convívio social pela necessidade do isolamento. Seguindo essa lógica e as recomendações dos gestores da nossa universidade, aulas, projetos de pesquisa e extensão, dentre outras atividades acadêmicas, ficaram temporariamente suspensas.

Visando a propagação do vírus e a continuidade das atividades educacionais, a reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), autorizou que docentes e discentes se engajassem em atividades de educação à distância, para manter as atividades dos cursos de graduação. Dessa maneira, o que vivenciávamos pelos encontros, falas, olhares etc. com os usuários de forma presencial onde desenvolvíamos as ações da extensão, teve a possibilidade de ser revisado para (re)existir em outro formato.

Nessa perspectiva, docentes das disciplinas de Saúde Coletiva, Psicomotricidade e Linguagem, da graduação em Fonoaudiologia da UFRJ, se viram desafiadas a construírem um trabalho colaborativo, inovador e gerador de novos conhecimentos e possibilidades de ações do corpo docente e discente para a sociedade.

Após alguns encontros e conversas, percebemos que as afetações oriundas das experiências vivenciadas pelos corpos, era o lugar da criação para as construções teóricas e práticas dos projetos e áreas de conhecimentos coordenados por nós. Assim, nasceu o projeto “Brincando com o Corpo”.

 

Objetivo e metodologia

 

Projeto que teve como objetivo, manter contatos, vínculos, afetos, alegria e movimentos com os nossos alunos, com os profissionais parceiros e os usuários dos territórios que nós já desenvolvíamos ações presenciais e de novos usuários, através das postagens criadas (por alunos, docentes e parceiros), na página @saudecoletivafonoufrj aberta no Instagram.

A reinvenção da nossa extensão universitária para a forma remota foi possível porque apostamos nas relações e nos afetos existentes entre: nós docentes com os alunos; nas parcerias estabelecidas com os profissionais dos territórios e com os usuários que já nos conheciam.

Semanalmente, o grupo se reuniu através de encontros virtuais, no período de março a julho de 2020, realizados pelo aplicativo Zoom Meetings. Nesses encontros, surgiram brincadeiras, jogos ou materiais idealizados pelos alunos e, posteriormente, eleitos coletivamente para serem postados no Instagram criado para o projeto: @saudecoletivafonoufrj.

Este novo desafio incitou alguns cuidados que precisaram ser respeitados para a execução do projeto de extensão “Brincando com o Corpo”: o direito autoral e o sigilo da identidade infantil. A primeira etapa vivenciada pelos alunos foi a criação das ações. Da mesma maneira, foi necessária vigilância com a apropriação indevida de um produto intelectual - plágios não foram aceitos, conforme prevê a legislação. Além da descrição da brincadeira, optou-se por exemplificá-la através de imagens que foram inseridas através do uso de animações – criadas a partir de tecnologias de informação gratuitas disponíveis na internet.

As propostas das ações consistiram em brincadeiras, jogos e atividades inseridas na rede digital. E o alcance do nosso público-alvo foi realizado por meio do acesso às tecnologias digitais àqueles que quisessem viver momentos em que o corpo pudesse expressar, brincar, ....no espaço possível dele ser conectado e percebido. É nesse contexto de desafios e de criações que esse estudo se insere.

 

Resultados observados

 

A partir das reuniões virtuais, as relações entre nós docentes, alunos e parceiros se reconfiguraram e percebemos que de forma afetuosa os alunos participavam das oficinas de acordo com as suas motivações e interesses. Ao apostarmos nas relações, potencializamos a participação de 22 alunos do 2º aos 6º períodos do curso de Fonoaudiologia.

Pelo acolhimento ofertado, o projeto foi tomando corpo, onde era perceptível a potência, o processo criativo e inovador para a construção coletiva de oficinas práticas. A cada nova postagem, novas ideias e adaptações, materiais, bolas, papéis, colagem, apitos, arcos, cordas etc. se misturavam com os corpos em movimentos, com os fluxos e ritmos dados por cada vivente, ativando funções diversas importantes às habilidades linguísticas, cognitivas, emocionais, nos diferentes ciclos de vida.

É importante validarmos as construções afetivas presentes nesse percurso.

O afeto norteou todo o processo, promovendo a criação por meio do prazer. O afeto que ressignificou a aprendizagem, que ampliou as possibilidades de relações e múltiplas tarefas, nos permitiu viver novos saberes e técnicas digitais.

Foram percebidas diferentes formas de expressão, relacionadas às transformações sensoriais, perceptivas e cognitivas em cada corpo envolvido nas criações. Para alguns alunos não foi fácil construir propostas, superar os obstáculos das produções e dificuldades. Mas, a base do grupo, sustentada pelos conhecimentos e vivências psicomotoras, foi norteando e dando apoio, de forma que o trabalho fluiu satisfatoriamente.

Entendemos que o pilar de maior relevância na sustentação dos encontros, das falas, das negociações para as atividades a serem postadas, foi a transvalorização dos corpos, das percepções singulares e das possibilidades das expressões, mesmo que de forma virtual, foi o modo que nós, docentes, encontramos, para ofertarmos espaços onde cada sujeito, cada corpo, cada pele, cada fala, fosse acolhida, respeitada e potencializada.

 

Considerações finais

 

Inspiradas nas intensidades dos afetos recebidos que se encontram materializados nos nossos corpos, nos voltamos para algumas considerações sobre o trabalho descrito nas linhas anteriores.

Cada conversação e cada encontro realizado de forma remota abraçou de forma significativa as falas, as dúvidas, certezas e incertezas, conhecimentos, regras, imagens, desenhos, movimentos, que nos demonstrou o quanto as nossas relações estavam mais afetuosas e proximais, pontuando o quanto os vínculos anteriores estabelecidos pelos docentes e discentes foi de extrema importância ao despertar destes a participarem de um projeto de extensão em tempos difíceis como a pandemia.

Outra questão que gradativamente foi construída pelos envolvidos, foi a potência deles ao transformarem ideias em formas de jogos, brincadeiras, com o uso de diferentes materiais. Dessa forma, as experiências subjetivas geradas por afecções e afetações, acontecimentos, processos conceituais, encontros, datas, histórias pessoais, dentre outros, ganharam formas e significados novos ao se amalgamarem com as percepções do coletivo.

E, por último, os vínculos feitos com os parceiros das nossas ações firmou a transformação da nossa página no Instagram para outras mídias sociais, como o WhatsApp, ampliando a circulação das propostas entre o público dos territórios por nós assistidos e por quem quiser entrar, usar e brincar com as propostas.

Finalizamos o relato das nossas vivências deixando um convite ao leitor ou leitora deste relato: se aventure a passear pela nossa página @saudecoletivafonoufrj e dê margens a experimentações que possam tomar novos significados, através das brincadeiras, jogos e interações.

De certo modo, foi possível a ressignificação das lutas, expectativas, frustrações e táticas de sobrevivências necessárias a todos os envolvidos e a todos que apostaram nas nossas ações, como um trabalho do cuidado, de resistência às vulnerabilidades e fragilidades expostas em nossa sociedade pela pandemia de COVID-19.  E, nesse trajeto realizado com muita simplicidade, compromisso e ética, levamos leveza, brincadeira e diversão para muitos, em um momento da vida quando olhar para o corpo foi imprescindível e onde o menos era mais.