Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Construção da primeira Política Estadual de Promoção da Equidade em Saúde do país: o caso do Rio Grande do Sul
Guilherme de Souza Müller

Última alteração: 2021-12-16

Resumo


O relato trata da moviment(ação) para o trabalho de servidores da SES/RS para superar lacunas diante da implementação de políticas para populações em situação de vulnerabilidade. A aproximação com o trabalho, juntamente com a construção de agendas conjuntas reverberaram na institucionalização dentro da secretaria com a criação de uma divisão de equidades e na primeira política estadual de promoção da equidade em saúde do país.

O resgate do princípio da equidade vem sendo objeto de discussões nacionais como modo de reunir às ações políticas sobre os grupos populacionais minoritários na saúde e promover estratégias sobre as diferenças injustas e evitáveis que são causas dessa desigualdade como classe social, raça/etnia, condições territoriais, orientação sexual e identidade de gênero.

No Rio Grande do Sul, desde 2015, ocorre dentro da Secretaria Estadual da Saúde, um movimento de aproximação dos próprios servidores que compunham a pauta sobre saúde das populações específicas. À época existiam seis servidores e quatro coordenações: saúde dos povos indígenas, saúde da população privada de liberdade e egressos do sistema prisional, saúde da população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (LGBT), saúde da população Negra e Quilombola. Também haviam dois servidores da coordenação de atenção básica que trabalhavam com a pauta da saúde população em situação de rua e da população do campo, da floresta e das águas. A partir da construção do Plano Estadual de Saúde 2016-2019 e a necessidade da visibilidade sobre as estratégias para a saúde dessas populações, esses trabalhadores passam a compor grupos de trabalho conjunto para descrever e planejar sobre pautas comuns dentre as populações. Pouco tempo depois, a aproximação ocorreu fisicamente, trazendo para a mesma sala os profissionais da saúde das coordenações de população específicas. Isso ocorreu, principalmente, devido ao entendimento desses servidores sobre a necessidade de viabilizar a implementação das políticas públicas estaduais e nacionais.

O histórico baixo de financiamento, a não priorização desses grupos e o déficit de servidores para essas áreas tornavam a implementação dessas políticas impraticável, além disso o estado do RS passava por um governo que se utilizava da austeridade fiscal. Como alternativa a essa situação, foram criadas ações coletivas de viagem e a socialização das pautas para que pudesse se trabalhar com a pouca disponibilidade de recursos de deslocamentos e diárias dentro do estado. Apesar da situação, foram desenvolvidas diversas ações no sentido de sensibilizar outros profissionais das 19 Coordenadorias Regionais de Saúde, que são as unidades descentralizadas da SES. Foram feitas oficinas para trabalhar com temas como o racismo, a discriminação e a promoção do acesso às populações em situação de vulnerabilidade. O trabalho trazia visibilidade para o tema da promoção da equidade dentro da SES.

Nos anos seguintes e na troca de governo estadual em 2018, o trabalho avançou com o aumento de servidores para as áreas, embora ainda não tivesse o mínimo de um profissional por política, ficando ainda descoberta a população de migrantes, refugiados e apátridas e os povos ciganos. Como avanços importantes desse período está a criação de Portarias para a criação de comitês técnicos de populações específicas, a reorganização das CRS para o trabalho na perspectiva de equidade em saúde, a realização de projetos de pesquisa e cursos EAD em projeto com a universidade federal sobre a promoção da equidade e a institucionalização de canais de educação permanente em saúde entre servidores do nível central e das CRS para discutir temas referentes às políticas de equidade.

A união dos servidores públicos estaduais para o trabalho com as populações minoritárias como estratégia para a potencializar o trabalho com as populações em situação de vulnerabilidade reverberou na criação da divisão das Políticas de Promoção da Equidade dentro do Departamento de Atenção Primária e Políticas de Saúde, em 2019.  A partir da reconfiguração, institucionalizou-se o trabalho conjunto para todas as populações, resultando em um trabalho mais efetivo, embora com muitos desafios a serem superados, dentre eles o baixo número de servidores.

Em 2020, a SES/RS publicou a primeira Política estadual de Promoção da Equidade em Saúde (POPES) do país, através da Portaria SES nº 512/2020. Segundo a Portaria, Art. 2º: “A promoção da equidade é a promoção do direito à igualdade como princípio da justiça social e implica reconhecer necessidades específicas e dar-lhes tratamentos diferenciados no sentido da inclusão e do acesso individual e coletivo”.

A política foi construída a partir de oficinas macrorregionais no qual se reuniram representantes dos movimentos indígenas, quilombolas, Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (LGBT), população do campo, da floresta e das águas, negros,  migrantes, refugiados e apátridas, povos ciganos e população em situação de rua. A política surge da necessidade da união de pautas comuns entre populações que estão em situação de vulnerabilidade. Questões centrais passaram a compor a agenda do estado como a dificuldade destas populações em acessar os serviços de saúde, o preconceito e a discriminação, a promoção de espaços de participação popular para populações específicas, a inserção de ações afirmativas, a visibilização dessas populações nos indicadores e boletins e na educação em saúde.

Como resultados iniciais da implementação da política, obteve-se a criação de cotas para a população Trans e Indígenas nos concursos públicos do estado, a criação de ambulatórios LGBTS, a criação de Portarias de enfrentamento à Pandemia de Covid-19  e a implementação dos comitês técnicos de populações específicas.

Mesmo com a reorganização do processo de trabalho, são inúmeros os desafios para concretizar a implementação das políticas nacionais e estaduais para as populações específicas e para a de Promoção da Equidade em Saúde. Aumentar os recursos alocados para ações nesses grupos, o aumento no número de servidores e a melhoria das condições de trabalho e de salário são fundamentais para atingir os objetivos das políticas.

Somado a isso, o desfinanciamento das políticas públicas a partir da criação do Teto de Gastos em 2016, a Pandemia de Covid-19, somada aos crescentes discursos de ódio às diversidades  e suspenção de políticas para diversidades acentuam a desigualdade social no país. Resistir a esse momento e manter o que já foi conquistado é uma luta diária dessas populações e também para o grupo de trabalhadores que toparam esse desafio de tornar a saúde mais justa e equânime.