Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Pandemia e equidade no acesso aos serviços de saúde em comunidade ribeirinha da Amazônia: o desafio do planejamento da saúde
Sara Silva dos Santos, Franciclei Burlamaque Maciel, Wilson Sabino

Última alteração: 2021-12-22

Resumo


APRESENTAÇÃO: O objetivo do trabalho é descrever o acesso aos serviços de saúde durante a pandemia, pela população ribeirinha da comunidade São Pedro. Almeja-se aplicar as recomendações de Vieira-da-Silva (2014) sobre a organização do serviço de saúde e suas implicações, considerando o modelo assistencial da saúde, as políticas de saúde específicas e a geografia ao considerar a distância entre o local de residência do usuário e a unidade que presta o serviço de saúde. O local do estudo foi a comunidade São Pedro, localizada no município de Santarém - PA, às margens do rio Arapiuns, onde residem 158 famílias, com 661 pessoas. O acesso é por via fluvial, variando entre 5 e 7 horas de viagem. A coleta dos dados primários ocorreu no primeiro trimestre de 2020, por observação direta e roda de conversa com 22 comunitários, e por entrevista informal via WhatsApp nos meses de junho e julho de 2020 com trabalhador de saúde local. A análise dos dados ocorreu na perspectiva crítica e reflexiva sob o ponto de vista da equidade no acesso aos serviços de saúde. DESENVOLVIMENTO: A pandemia impõe reflexões profundas frente à crise sanitária, em um contexto de desigualdade com populações vivendo em condições vulneráveis. Para Minayo e Freire (2020), a desigualdade é um terreno fértil para a disseminação da Covid-19. Na Amazônia, as comunidades ribeirinhas são as mais vulneráveis diante da necessidade do isolamento social imposto, já que os serviços médicos são ofertados na cidade. Quando são oferecidos na comunidade, geralmente ocorrem a cada quatro meses, quando a Unidade Básica de Saúde (UBS) Fluvial Abaré leva serviços de saúde. No período da pandemia, a necessidade de serviços de saúde se mostrou mais visível e frágil, apontando para a necessidade de fortalece a gestão para a equidade no acesso à saúde, no que diz respeito à possibilidade do sujeito, obter o cuidado que ele precisa, desde que supere eventuais barreiras. Esse acesso diferencia-se da acessibilidade, que trata da “facilitação do uso dos serviços, e tem utilidade analítica ao se diferenciar dos outros sentidos atribuídos a palavra acesso” (VIEIRA-DA-SILVA, 2014, p. 56). Nesse contexto, os aspectos geográficos, o modelo assistencial, a política de saúde específica, entre outros, são basilares para a equidade no acesso. O conhecimento dessa realidade pode facilitar o processo de avaliação da acessibilidade para melhorar a gestão da saúde (VIEIRA-DA-SILVA, 2014). Assim como pode revelar a situação do usuário ribeirinho com relação à privação de cuidado especializado e como enfrentar os efeitos da ausência desse cuidado, caso não ocorram tempestivamente os serviços de saúde. O serviço de saúde de muitas comunidades na Amazônia é resultado do modelo organizativo e assistencial da política de saúde. RESULTADOS: Na comunidade São Pedro o acesso a serviço médico ocorre a cada quatro meses por meio da UBS Abaré, ou quando o sujeito ribeirinho é encaminhado para a cidade de Santarém-PA pela UBS, ou mesmo quando recorre ao serviço médico com recursos próprios. Com a estrutura frágil e limitada dos serviços de saúde da comunidade, a equipe de trabalhadores de saúde da UBS local, realiza a assistência à saúde por meio da UBS, onde os agentes comunitários realizaram orientações sobre a educação em saúde. Durante a pandemia essas informações chegavam aos comunitários, inclusive pela rádio comunitária Floresta. Dava-se ênfase sobre a prevenção do vírus da Covid-19, como o uso individual de máscara e álcool em gel, e o distanciamento social. Entretanto, no período da pandemia, mesmo com as restrições e orientações sobre o não deslocamento dos comunitários para a cidade de Santarém, nem sempre essa orientação era cumprida, devido à necessidade que os comunitários tinham de ir à cidade. Geralmente essa necessidade estava relacionada ao recebimento de aposentadorias, salários ou realizar o abastecimento doméstico ou comercial, entre outros. O efeito não poderia ser outro.  Foram diagnosticados com a Covid-19 de pelo menos 48 comunitários. A Secretaria de Saúde do município de Santarém, implementou ações urgentes de saúde, e impôs tratamento desigual aos desiguais. Todas as pessoas que apresentaram qualquer sintoma de síndrome gripal foram atendidas. Em meados de julho de 2020, a Secretaria Municipal de Saúde contratou um médico para morar na comunidade e atender a população e junto enviou a medicação para tratamento da Covid-19. Cabe destacar, que ações resolutivas em termo de envio de profissional da saúde como um médico, ainda que necessário, pode ter tido motivação política, visto que era período de eleições municipais. Passado esse período, o médico deixou a comunidade. Segundo Werneck e Carvalho (2020, p. 4), em casos de “decisões imediatas devem buscar poupar vidas, garantindo a assistência de boa qualidade [...]”. Devem-se considerar, entre outros, a questão geográfica e as políticas específicas para melhorar a organização e melhor posicionar essa política no território visando a superação das barreiras frente ao acesso (VIEIRA-DA-SILVA, 2014). Além disso, segundo Rivera e Artmann (2012), o planejamento pode diminuir essa barreira, desde que seja construído na perspectiva comunicacional voltada para a equidade, considerada relevante no enfrentamento dos desafios. De acordo com um trabalhador da saúde, os maiores desafio frente aos casos de infeção pelo vírus na comunidade, foi a falta de obediência as notificações feitas pelos trabalhadores da saúde local, a falta de medicamentos na UBS e a negação dos efeitos da pandemia pelos comunitários. Os casos de pacientes em estado grave eram transferidos para Santarém, acionada pela equipe de saúde, que após fazer a avaliação profissional acionava o SAMU, que por sua vez, direcionava uma ambulancha com equipe padronizada com equipamentos de proteção individual. O período entre a solicitação e chegada da embarcação na comunidade era de até três horas de viagem para transportar o paciente até o Hospital Municipal de Santarém. Considerações finais: A organização dos serviços de saúde na comunidade ribeirinha requer olhar de avaliação e planejamento para melhorar a acessibilidade aos serviços de saúde. A melhoria na gestão do modelo assistencial da saúde pode ser a alternativa para ampliar a acessibilidade, diminuindo a distância entre o local de residência do usuário e a unidade de saúde. Embora as ações dos gestores públicos no enfrentamento da Covid-19 tenham sido positivas no curto prazo com envio de médico e medicamentos, no pós-pandemia as barreiras organizacionais podem voltar e se perpetuar no território. As recomendações de Cunha e Vieira-da-Silva (2010) parecem pertinentes para a realidade amazônica ribeirinha, que historicamente enfrenta dificuldades de acesso aos serviços de saúde, principalmente pela questão geográfica. Considerando essa realidade, o planejamento de políticas de saúde voltadas para a melhoria e facilitação do uso de serviços de saúde é um indicativo necessário para além da pandemia.