INTRODUÇÃO

O vírus SARS-CoV-2 foi detectado na cidade de Wuhan, na China, no final de 2019. Desde então, a alta transmissibilidade deste novo coronavírus e a elevada morbimortalidade relacionada à COVID-19, cresceu exponencialmente em todo o planeta, culminando, primeiramente, em uma emergência de saúde pública de importância internacional.

A transmissão do vírus ocorre tanto por vias respiratórias quanto extrarrespiratórias e durante o período de desenvolvimento da COVID-19 no organismo humano a apresentação clínica inclui sintomas relacionados a alterações no olfato, paladar e complicações gastrointestinais, além do acometimento de forma mais acentuada do sistema respiratório.

Em consequência dos sintomas, muitos pacientes precisam ser internados e, em alguns casos, são submetidos a procedimentos invasivos para garantir a condição fisiológica básica para a manutenção da vida. Durante o período de internação os pacientes desenvolvem condição clínica com debilitação fisiológica e a aptidão física geral reduz sensivelmente.

Ao receber alta hospitalar, muitos desses pacientes precisam buscar tratamentos que lhes possibilitem recuperar a condição física debilitada pela ação da doença. A Secretaria Municipal de Saúde de Campo Grande/MS, estruturou no Sistema Único de Saúde um serviço de reabilitação funcional destinado às pessoas que estiveram internadas por infecção pelo COVID-19 associados à doenças crônicas não transmissíveis e precisam de atenção especializada para restabelecer a capacidade de trabalho e de atividades da vida diária.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo, acerca da estruturação de um programa de reabilitação funcional, oferecido por meio do SUS, para pacientes acometidos por COVID-19.

O projeto foi estruturado na Rede Municipal de Saúde do município de Campo Grande/MS. Foi escolhida a Unidade Especializada de Reabilitação e Diagnóstico (UERD) para o desenvolvimento do programa de reabilitação funcional. Nesse local, uma equipe multiprofissional formada por fisioterapeuta, profissional de educação física, nutricionista e psicólogo, desenvolve Projetos Terapêuticos Singulares (PTS) para os pacientes encaminhados dos demais pontos da rede, seguindo critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos.

RESULTADOS

O projeto de reabilitação funcional foi elaborado pela equipe técnica do Serviço de Doenças e Agravos Não Transmissíveis e da Coordenadoria da Rede de Atenção Especializada da secretaria e consiste na oferta de intervenções profissionais de fisioterapia, educação física, nutrição e psicologia, para pacientes em condição de pós-internação decorrente de COVID-19.

Os atendimentos ocorrem na UERD, de segunda a sexta-feira, no período noturno. O encaminhamento dos pacientes é realizado por médicos dos três níveis de atenção à saúde, via Sistema de Regulação.

Foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão para pacientes neste programa: pessoas com 18 anos de idade ou mais, infectados pelo novo coronavírus, que evoluíram com limitações físicas e cardiorrespiratórias após alta hospitalar; associados a doenças crônicas, como: doença respiratória, hipertensão, diabetes e obesidade, aptos a realizar exercícios cardiorrespiratórios – comprovado com atestado de aptidão física; com encaminhamento contendo relato sucinto do quadro clínico atual, tempo de internação, doença de base, sequelas, limitações funcionais existentes e dependência de oxigênio.

Todos os atendimentos são registrados no sistema de informação próprio da secretaria, com o propósito de gerar relatórios diferenciados por usuário e por categoria profissional.

Descrição do fluxo de atendimento dos pacientes

No primeiro atendimento, cada paciente passa por um acolhimento dado pela equipe multiprofissional (fisioterapeuta, profissional de educação física, nutricionista e psicólogo) em uma consulta compartilhada. Nesta etapa a equipe faz uma triagem e identifica a condição clínica da pessoa atendida. Posteriormente, sem a presença do paciente, os profissionais constroem, de forma coletiva, um PTS.

Descrição do Projeto Terapêutico Singular

O protocolo do PTS consiste de intervenções com frequência de duas vezes por semana, com alternância entre os profissionais que desenvolvem as atividades. Os pacientes são atendidos, inicialmente, com um total de 10 sessões de 40 a 60 minutos cada, durante cinco semanas. Se a equipe identificar que há indicação de continuidade do tratamento, o paciente pode ser mantido no programa por mais sessões, com avaliação caso a caso. Após a alta, é realizado a contrarreferência para unidade de saúde à qual o paciente está vinculado na atenção primária, visando a integralidade do cuidado.

Descrição das ações da equipe multiprofissional

O programa de reabilitação funcional prevê uma abordagem multiprofissional, com longitudinalidade do cuidado e respeito às singularidades de cada paciente, considerando o impacto das sequelas da internação causada pela COVID-19 sobre sua funcionalidade, tendo como principal eixo a reabilitação cardiorrespiratória e musculoesquelética, aliviando os efeitos das disfunções musculares, respiratórias, efeitos deletérios do imobilismo após longo período de internação hospitalar, além de sequelas psicológicas e necessidades nutricionais, com objetivo de melhorar a saúde geral e a qualidade de vida das pessoas atendidas.

A Fisioterapia atua em duas vertentes: a) fisioterapia respiratória, com o objetivo de aumentar a capacidade pulmonar e recuperar disfunções referentes ao processo de respiração; b) fisioterapia motora, com o objetivo de corrigir e restabelecer as condições físicas do paciente.

A abordagem do profissional de Educação Física é voltada à melhora dos componentes cardiorrespiratório e neuromuscular, visando a promoção da autonomia funcional, o controle dos fatores de risco para comorbidades, correção postural e manutenção do peso ideal. O atendimento inclui o treinamento aeróbio, o treinamento resistido, ações de educação em saúde, além de incentivo à continuidade da prática de atividades físicas para manutenção e ampliação dos ganhos obtidos.

A Nutrição atua com o propósito de manutenção do bom estado do sistema imunológico dos pacientes e, para isso, realiza avaliação nutricional e orientações ligadas à promoção de uma alimentação saudável.

A Psicologia intervém com oferecimento de um espaço para que o paciente compartilhe seus sentimentos e necessidades, buscando a auto segurança. Com isso, objetiva-se minimizar o trauma psicológico decorrentes do período de internação, que pode ter gerado reações emocionais como medo, angústia, ansiedade e tristeza.

DISCUSSÃO

O comprometimento funcional pós-COVID-19 pode prejudicar a capacidade de realizar atividades da vida diária e a funcionalidade dos indivíduos que passaram por internação hospitalar, além de alterar o desempenho profissional e dificultar a interação social, com possibilidade de aumento de fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis.  Em função desta demanda, os serviços de saúde necessitam se readequar, com estratégias capazes de proporcionar recuperação físico-funcional e reintegração social dos indivíduos infectados pelo vírus SARS-CoV-2.

No âmbito do SUS, o PTS é abordado em duas perspectivas, uma delas centrada na clínica ampliada e outra na recuperação da autonomia da vida afetiva do sujeito.Em ambas as perspectivas sempre são considerados o sujeito, as equipes de saúde, o território e a família onde o PTS é desenvolvido.

Nota-se, portanto, que o processo de tratamento dos pacientes com COVID-19 é fundamental não apenas durante a fase hospitalar, como também após alta melhorada e com intervenções multiprofissionais, pode garantir a continuidade do acompanhamento, promovendo a recuperação de implicações provocadas pela doença, proporcionando mais qualidade de vida aos pacientes.

CONCLUSÃO

Considerando o contexto da pandemia de COVID-19, doença que frequentemente acomete o sistema cardiorrespiratório dos pacientes infectados, a oferta de serviços visando a assistência integral aos usuários, por meio de uma reabilitação funcional, potencializa as condições de melhora de saúde no período pós-internação.

Nesse sentido, o programa de reabilitação funcional, oferecido para pacientes acometidos por COVID-19 no município de Campo Grande/MS, se mostra promissor em função da estratégia adotada, com disponibilização de equipe multiprofissional, que desenvolvem intervenção por meio do PTS.