Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
“Drive fluvial”: a arte de “fazer saúde” na Amazônia.
Aline Pedroso, Franciclei Burlamaque Maciel

Última alteração: 2021-12-17

Resumo


Apresentação: Na Amazônia brasileira a região de várzea é caracterizada pela alternância de ciclos terrestres e aquáticos em decorrência das variações do nível do rio (PEREIRA, 2007), nesse tipo de região a natureza impõe certas limitações e dificuldades, como a questão do acesso aos serviços de saúde. O objetivo do trabalho é descrever o acesso a saúde na comunidade do Centro do Aritapera, em Santarém/PA. Esse território está localizado na área rural, e é marcado por características naturais decorrente da cheia e vazante do rio Amazonas. As populações que habitam nessa região de várzea encontram-se sobre condições desiguais, no que diz respeito à acesso ao serviço público de saúde, assim como muitas outras comunidades na Amazônia. Esse é um contexto em que a arte como invenção é necessária para transformar o cotidiano vivido, é “fazer saúde”. Desenvolvimento/Metodologia: O local da pesquisa ocorreu na comunidade do centro do Aritapera, localizada às margens do Rio Amazonas, cerca de 36 km de distância do município de Santarém, estado do Pará. O acesso se dá por via fluvial, de barco motor, com duração de aproximadamente três horas de viagem. Os dados foram coletados por meio de observação direta nos meses de março, abril e maio de 2021, e analisados na perspectiva crítica reflexiva. As populações da Amazônia, especificamente a população ribeirinha, vive em condições de insuficiência pelas limitações de oferta de serviços de saúde, associado a baixa renda, dispersão populacional e importantes distâncias geográficas peculiares da região amazônica. Geralmente, essa população carece de serviços básicos como saneamento e eletricidade, além de serem dependentes da área urbana para obtenção de bens de consumo e assistência à saúde. Esses fatores combinados, geram barreiras ao acesso aos serviços públicos de saúde, penalizando principalmente as populações rurais da Amazônia (GARNELO et al, 2018). A permanente dificuldade com a logística nas regiões de várzea no interior da Amazônia e a carência de políticas públicas, apontam para a insuficiente função efetiva do SUS na região. De acordo com Boas e Oliveira (2016), a cobertura de saúde é em torno de 20% mais baixa, quando comparada às demais regiões do Brasil. Mesmo que cidadãos tenham direito gratuito à saúde assegurado por lei, há indícios que o acesso ao serviço de saúde, seja um desafio para os usuários do SUS (GUIMARÃES et al, 2020). Para sanar essa dificuldade no acesso, uma das políticas de saúde que alcançam essas regiões na Amazônia é a Atenção Básica, entendida como uma oportunidade de inclusão da população ribeirinha e consequentemente uma forma de melhorar a qualidade de vida dessas pessoas (JUNIOR et al, 2020). A Política de Atenção Básica (PNAB) aprovada em 2006 pelo Ministério da Saúde (BRASIL,2006), é considerada um marco legal que define o objetivo da Atenção Primária no Brasil (APS). A PNAB considera a Atenção Primária como um termo equivalente a Atenção Básica que visa fortalecer a APS, percebida como a principal porta de entrada do SUS (BRANCO, 2019) e como centro de comunicação com toda a Rede de Atenção dos SUS. Para ampliar a assistência e alcançar as populações rurais, foi implementando a Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, da Floresta e das águas (PNSIPCFA). Carneiro et al (2014) destaca que essa política, é o resultado do reconhecimento de uma dívida histórica do Estado para com a saúde das populações que habitam nas regiões do campo, da floresta e das águas. A PNSIPCFA representa um novo modelo de política social que respeita a relação homem-natureza. Dito de outro modo, essa política é fruto do reconhecimento da necessidade de desenvolver políticas públicas que promovam a saúde e que atendam às necessidades e especificidades dessas populações. Assim, a PNSIPCFA objetiva a melhoria no nível de saúde das populações do campo, da floresta e das águas e tem como subsídio a relação existente entre saúde e ambiente, de modo que seja considerado o contexto vivido por essas populações (SCHLICKMANN; PREUSS; PAULETTI, 2019). Essa política é um plano estratégico que visa o enfrentamento das iniquidades históricas vividas por esses povos, além de uma maneira de reduzir as desigualdades, principalmente no que diz respeito ao acesso à saúde. Resultados e/ou impactos: Embora existam políticas de assistência à saúde voltadas para a realidade das regiões remotas da Amazônia, as características geográficas do território ribeirinho interferem diretamente no acesso ao serviço de saúde (GUIMARÃES et al, 2020). No caso da comunidade do Centro do Aritapera, o serviço de saúde é ofertado pela Unidade Básica de Saúde (UBS). Esses comunitário recebem apoio dos trabalhadores da saúde local, por meio de visita domiciliar, quando solicitado. O principal meio de transporte para acessar a UBS no período da enchente, são as canoas e/ou as rabetas. No período de seca, os sujeitos que moram nas proximidades da UBS a acessam através das estradas, os que moram mais distantes optam por se deslocarem através do rio. A assistência do serviço de saúde na UBS local, contempla, aferição de pressão arterial, verificação de glicemia, aplicação de vacinas da gripe e do Corona Vírus, medicamentos básicos como dipirona, paracetamol e medicamentos para pressão arterial. O atendimento médico ocorre uma vez por semana, quando a Secretaria municipal de Saúde encaminha um profissional. Serviços que não são oferecidos pela UBS local, são encaminhados pelos trabalhadores da saúde para a cidade de Santarém. Os custos com a viagem são de responsabilidade do paciente. Os sujeitos ribeirinhos, preferem não esperar para realizar os exames e consultas médicas agendadas pelo SUS, pela demora no agendamento da rede pública, optando pelo serviço da rede privada. Diante do cenário da pandemia, o município de Santarém realizou a vacinação contra a Covid-19, na população ribeirinha, com “drive fluvial”. O “drive fluvial” na comunidade ribeirinha, funcionou como um posto de vacinação volante no rio Amazonas, onde os moradores eram atendidos nas suas rabetas e canoas para serem vacinados. Os trabalhadores da saúde carregavam o sistema de refrigeração das vacinas em caixas térmicas com termômetros acoplados e gelox, um tipo de gelo artificial rígido, para atender os ribeirinhos. Mas a ausência de energia elétrica, impossibilitou a continuação do esquema de vacinação em grupos prioritários segundo cronograma nacional (CONASEMS, 2021). Para equacionar os problemas de logística, foi adotado mecanismo para agilizar a vacinação com suporte de helicóptero que transportou a vacina. Considerações finais: O ambiente da região de várzea da Amazônia possui características e peculiaridades que condicionam a estruturação do serviço de saúde e das práticas sanitárias. Embora existam políticas públicas pensadas para a realidade dessas regiões ribeirinhas, os serviços disponibilizados não abrangem as demandas de saúde dessas populações de forma plena. A realidade da comunidade do Centro do Aritapera, sinaliza a vulnerabilidade da população com a ausência dos serviços de assistência à saúde, agravadas pela sua localização geográfica. Durante a pandemia da Covid-19, os trabalhadores da saúde de Santarém, criaram a estratégia assertiva para “fazer saúde”, por meio do “drive fluvial”. Uma alternativa vacinal que alcançou a população ribeirinha, aqui entendida como política social necessária nessa região. Outras necessidades, como a assistência médica carece de atenção no processo da gestão da saúde ribeirinha. A PNSIPCFA representa uma importante diretriz para esse cenário, cuja recomendação é essencial para atender as populações de áreas remotas, que se encontram fragilizadas pela sua localização geográfica.