Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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DESAFIOS DO CUIDADO INTEGRAL À POPULAÇÃO TRANSEXUAL NA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA: PERCEPÇÕES DE ENFERMEIROS EM MUNICÍPIO NO INTERIOR PAULISTA.
Bárbara Cristina de Léo Spadim, Eliana Goldfarb Cyrino, Carolina Siqueira Mendonça

Última alteração: 2022-01-31

Resumo


Apresentação: O acesso e o cuidado à saúde da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros (LGBT) é marcado por inúmeros obstáculos, sinalizando aspectos desafiadores para a Saúde Pública brasileira. Apesar da construção de políticas públicas, que representam um importante avanço no reconhecimento dessas vulnerabilidades, demandas e direitos dessa população, o cenário atual denuncia que ainda existe um longo caminho a ser percorrido para a efetiva consolidação e implementação das diretrizes preconizadas. Agressões físicas, assassinatos, discriminação e adoecimentos, marcados pela resistência em buscar ajuda e  pelo uso de hormônios sem acompanhamento médico, agravamento da saúde mental, bem como complicações em aplicações corporais de silicone industrial, evidenciam a morte precoce e a presença de obstáculos a serem enfrentados por essa população na garantia de seus direitos fundamentais e humanos. A luta frequente pela garantia de cidadania e de direitos humanos é território do vivido para essa população. Nesse contexto, pesquisas recentes destacam o preocupante e alarmante cenário da população transexual, na busca pelo direito ao acesso à saúde, pelo SUS ( Sistema Único de Saúde). Os estudos indicam que a procura por assistência e cuidados médicos ofertados pela Atenção Primária nos serviços de saúde, são, frequentemente, marcados por olhares preconceituosos pelos próprios profissionais da saúde; condutas inadequadas; discriminação; não respeito pelo do nome social; falta de capacitação, dentre outros fatores que contribuem para as experiências negativas e traumáticas vivenciadas por esse público. Além disso, pesquisas adicionais evidenciaram que na estratégia de saúde da família (ESF), as relações de atendimentos dos usuários também foram limitadas e definidas como desafiadoras. Destaca-se que estas situações cotidianas contribuem para a manutenção de barreiras ao acesso e colaboram para o não reconhecimento dos serviços de saúde como espaços de garantia do direito à saúde. Diante desse cenário, os desafios existentes são grandes e urgentes, demandando investimentos em pesquisas, estratégias de investigação, capacitação e avaliação, que busquem a melhoria na qualidade do serviço ofertado e a inclusão do transexual como sujeitos de direitos. Objetivo: O estudo tem como objetivo investigar e reconhecer o cuidado ofertado a população Transexual, sob a ótica dos profissionais de enfermagem, de Unidades de Estratégia de Saúde da Família (USF), em munícipio do interior paulista.  Desenvolvimento: O trabalho é um Estudo de caso, quanti-qualitativo, realizado por meio de pesquisa de mestrado em Saúde Pública, realizado por meio de entrevistas semiestruturadas roteirizadas, composto por perguntas fechadas, buscando informações sociodemográficas para caracterização dos participantes, e perguntas abertas sobre a atenção a saúde ofertada pelos serviços, a formação e capacitação profissional e as potências e obstáculos da ESF no cuidado a pessoas trans. A análise dos dados é referenciada pela análise de conteúdo segundo Minayo, e por estatística descritiva. Os núcleos de sentido da análise, foram elaborados para melhor compreensão dos resultados da pesquisa. São eles: A demanda existe; O vazio formativo; Ecos da violência: preconceito e transexualidade, a gente precisa falar sobre isso! Resultados: A demanda existe: Foi possível observar que a oferta assistencial é acompanhada por uma trajetória de invisibilidade Trans, uma vez que esse público não comparece nos serviços de saúde, evidenciando o isolamento e a exclusão na busca por ajuda e no reconhecimento da cidadania. A ótica do estigma de não ser desejado ou possuir menor valor, ainda prevalece. Destaca-se, que a assistência foi associada à dores, curativos, testes sorológicos e/ou demandas pontuais. Nesse contexto, ressalta-se o estigma dessa população com a Doença Sexualmente Transmissível (DST). Nos relatos dos enfermeiros, observa-se que, independentemente de houver demanda e/ou necessidade da realização de testes sorológicos, o profissional da saúde recorre ou realiza o encaminhamento direto para o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) HIV/AIDS, associando o atendimento desse público à promiscuidade e soropositividade pelo HIV. De acordo com estudos da área, este aspecto favorece o afastamento da população Trans e contribui para o direcionamento de trajetórias de cuidados alternativos, como uso de silicone industrial, ou serviços particulares. O vazio formativo: O estudo possibilitou reconhecer que os conhecimentos dos profissionais enfermeiros, com relação a saúde da população Trans, são escassos. Os enfermeiros entrevistados relataram que não sabem como atuar, acolher e ofertar o cuidado diante das especificidades do atendimento a um transexual. Nos relatos dos profissionais, é possível notar ainda a falta de entendimento em aspectos que são de extrema relevância à qualidade do serviço, como a confusão para o uso de pronomes, ou até mesmo as diferenças que envolvem as identidades de gênero. (O que é trans? O que é gay?). Ecos da violência: preconceito e transexualidade, a gente precisa falar sobre isso! : O último núcleo de sentido refere-se às experiências relatadas pelos profissionais de preconceito e discriminação contra a população Trans, dentro e fora dos serviços de saúde. Segundo os entrevistados, episódios de chacota, no qual o profissional de saúde fez piada sobre o Trans; comentários preconceituosos; olhares julgadores e não aceitação do nome social do usuário, já foram vivenciados no interior do próprio serviço. Esses relatos denunciam a gravidade das atitudes éticas e a violência institucional que envolvem a população transexual. Evidências como estas se mostram contrárias ao acolhimento e a humanização o cuidado em saúde, além de reproduzirem a violência presente na sociedade e contribuírem para a segmentação, exclusão e adoecimento desse público. Considerações finais: A análise dos resultados, denuncia que as barreiras e desafios que essa população enfrenta são reais, e as transformações são necessárias. Os trechos relatados, evidenciam a persistência de estigmas e violência sociais, associado à população Trans. Também, permitem levantar hipóteses sobre as consequências dessas barreiras na saúde da população Trans. A invisibilidade, a carência de capacitação e a hegemonia da heteronormatividade, que se mantém vivo dentro dos serviços de saúde, contribuem para a subcidadania, o adoecimento e para morte precoce dessa população. O público transexual clama e luta por atendimentos integrais, humanizados, e sem discriminações, sendo a superação desses obstáculos necessária e urgente. Dar voz à população Trans e garantir a essa população o direito a saúde são representações e configuram materialidade dos princípios e diretrizes da universalidade, acesso, humanização, integralidade e equidade.