Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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CONSTRUÇÃO DE UM MODELO LÓGICO DAS AÇÕES DE REABILITAÇÃO NO ÂMBITO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
Roqueline Bárbara de Jesus Damasceno, Ítalo Ricardo Santos Aleluia

Última alteração: 2022-01-17

Resumo


Segundo a OMS (Organização das Nações Unidas), cerca de um bilhão de pessoas vivem com alguma deficiência. Isso significa uma em cada sete pessoas no mundo. Cerca de 80% dessas pessoas vivem em países subdesenvolvidos e estão entre os grupos mais vulneráveis do mundo e com menos autonomia.

No Brasil, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Censo Demográfico 2010, mais de 45,6 milhões de brasileiros declararam ter pelo menos uma deficiência, isso significa que 23,9% da população do país. Dessas pessoas, 84,36% se encontravam em áreas urbanas e 15,64%, em áreas rurais.

Em 2013, dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) caracterizou a prevalência de doenças crônicas não transmissíveis e quantificou a população com incapacidades físicas da população brasileira. Constatou-se que no país, a maioria da população adquiriu a deficiência em decorrência lesões ou traumas (decorrentes de quedas ou acidentes) ou derivada de enfermidades (como ACV e amputação de pé diabético), enquanto que a população com a deficiência congênita é menor.

Desde a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) de 2006 a Atenção Primária à Saúde (APS) é defendida no discurso normativo como a porta de entrada preferencial do SUS, o que significaria a resolutividade de 85% das demandas de saúde, sendo encaminhados para atenção de média e alta complexidade, somente problemas que não poderiam ser completamente resolvidos no âmbito primário.

A APS acolhe diversas situações de pessoas com deficiência e perda de funcionalidade, que necessitam de cuidados em reabilitação nas mais diversas condições e agravos de saúde. As fraturas e traumatismos, as amputações e lesões medulares, as dores crônicas, as alterações de linguagem, da fala e comportamento, os déficits auditivos, as instabilidades posturais, as disfagias e as alterações cognitivas, etc. Essas condições estão presentes na rotina de trabalho das equipes de APS e têm se mostrado crescentes em decorrência da transição epidemiológica, nutricional e demográfica.

Podemos entender reabilitação como um processo educativo, assistencial e multiprofissional, que prima pela busca compartilhada do desenvolvimento das capacidades remanescentes, prevenção do agravamento de incapacidades e do aparecimento de complicações. É um processo compartilhado porque envolve tanto o usuário, quanto a família e os profissionais de saúde.

Assim, as ações Habilitação e reabilitação são um conjunto de estratégias direcionadas a manter ou restaurar a funcionalidade (funções do corpo, atividades e participação social) e ajudar aqueles indivíduos com deficiências seja ela congênita, adquiridas na primeira infância ou na vida adulta, com vistas a maximizar sua independência e autonomia. A variedade das condições de deficiência e seus impactos requerem diferentes estratégias de intervenção. Tais demandas devem ser atendidas nos diversos âmbitos de atenção na Rede de Atenção à Saúde (RAS), inclusive o primário.

No Brasil, a APS é parte da Rede de Cuidados a Pessoa com Deficiência (RCPD) e pode potencializar a funcionalidade e a interação social das pessoas com deficiências e sua família. Apesar dessa posição privilegiada, ainda há diversas lacunas a serem preenchidas, sobretudo como se encontra a situação da atenção em reabilitação na APS de municípios brasileiros, embora as pessoas com deficiência representem uma parcela expressiva da população e em constante crescimento. Também cabe salientar que pouco se sabe sobre os determinantes do sucesso e insucesso da atenção em reabilitação na APS municipal, uma vez que raramente os estudos levam em consideração esse âmbito de avaliação dessas práticas e de propostas avaliativas nessa direção.

As políticas públicas são fruto de embates entre diversas forças sociais, na maioria das vezes imbuídas de orientações ideológicas variadas. Elas devem ser entendidas como o “Estado em ação”, ou seja, é o Estado implantando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade. De certa forma, as políticas públicas de saúde são como um Modelo Teórico de um plano de governo. Assim, o Estado cria através das normativas um Modelo Teórico daquilo que ele pretende colocar em prática. Entretanto, desenvolver programas em consonância com os princípios das normativas é processo desafiador devido à complexidade no planejamento, descrição, desenvolvimento, avaliação e comunicação das ações.

Desta forma, o presente estudo trata-se de uma pesquisa documental de cunho qualitativo e exploratório das políticas públicas do governo, tendo como objetivo propor um Modelo Lógico (ML) para avaliação das ações de reabilitação no âmbito da APS. Modelagem significa criar um modelo que explique as características de funcionamento e comportamento de uma política, programa ou intervenção de saúde, facilitando seu entendimento, através das características principais que evitarão erros de planejamento, gestão e funcionamento.

Para elaboração do ML, obedeceu-se às seguintes etapas: pré-análise (leitura flutuante dos documentos, escolha dos documentos e identificação dos objetivos dos documentos), exploração do material (categorização das informações no quadro-síntese) e tratamento dos resultados (organização do material documental em componentes essenciais e secundários das ações de reabilitação na APS). A partir do levantamento documental, no total, foram incluídos na construção do ML 36 documentos, entre cadernos de atenção básica, cartilha para pessoas com deficiência, decretos presidenciais, diretrizes assistenciais, Leis Federais, manuais instrutivos e manuais da OMS.

O ML proposto possui oito dimensões que direcionam gestores, profissionais e pesquisadores na avaliação do cuidado primário em reabilitação, a saber: infraestrutura, prevenção de deficiências, acolhimento, processo e ferramentas de trabalho, habilitação e reabilitação, encaminhamento a serviços de referência, ações de vigilância e ações intersetoriais.

Da análise das normativas percebeu-se que as ações de reabilitação na APS são estratégicas no SUS. Segundo as propostas do Ministério da Saúde (MS) brasileiro, visa-se priorizar as práticas de reabilitação na APS em função da sua capilaridade, para proporcionar maior abrangência das ações reabilitadoras, cuidado integral e melhor reorganização do acesso da população aos serviços especializados.

O Modelo Lógico proposto neste estudo deriva de uma ampla revisão documental, mas não se pretende esgotar todas as possibilidades de avaliação das ações de reabilitação na APS. Todavia, buscou-se construir uma modelização abrangente, que permeasse diferentes dimensões e aspectos da reabilitação no âmbito dos cuidados primários. Por fim, recomenda-se novos estudos para validação do modelo proposto, bem como outras pesquisas sobre a implantação do componente primário da RCPD e da Política Nacional da Pessoa com Deficiência, dada a sua complexidade de organização e gestão, ampla possibilidade de ações e importância político-sanitária para a população.