Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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JUDICIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS ONCOLÓGICOS NO BRASIL
Sinara Tomás Alves Tomás de Vasconcelos, Maria Salete Bessa Bessa Jorge

Última alteração: 2021-12-19

Resumo


1 INTRODUÇÃO

O direito à saúde tem sido reconhecido dentre os direitos humanos fundamentais (ONU, 1948). A garantia deste direito envolve o acesso aos serviços, à prevenção, ao cuidado e ao tratamento – o que inclui o acesso aos medicamentos. A garantia do acesso aos medicamentos essenciais é considerada como uma das responsabilidades essenciais do Estado.

Os medicamentos antineoplásicos são aqueles capazes de inibir o crescimento e processos vitais das células tumorais, porém não são específicos para estas células, podendo agir também em células sadias do organismo, desta forma, muitos fármacos possuem uma janela terapêutica estreita, ou seja, a dose usual é próxima da dose tóxica e muitos também podem ser considerados carcinógenos.

A Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na rede de atenção à saúde das pessoas com doenças crônicas no âmbito do SUS é definida pela Portaria GM/MS nº 874, de 16 de maio de 2013. A referida portaria assegura que os tratamentos especializados de alta complexidade e densidade tecnológica para as pessoas com câncer são oferecidos pelos hospitais habilitados pelo Ministério. Por isso, o Ministério da Saúde e as Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde não fornecem diretamente medicamentos contra o câncer. Ou seja, o fornecimento de medicamentos oncológicos não ocorre por meio de programas de dispensação de medicamentos do SUS, salvo exceções extremamente específicas em que o Ministério da Saúde realiza compra centralizada e distribui às Secretarias de Estado da Saúde.

A competência para custear as políticas públicas que visam o fornecimento de medicamentos oncológicos e de alto custo e complexidade é conferida à União, apesar disso os estados e municípios vem sendo demandados para esse fornecimento.

Os gestores públicos estaduais e municipais deparam-se diariamente com crescentes determinações judiciais associadas a esses medicamentos, esse fenômeno pode prejudicar a execução de políticas de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), uma vez que o cumprimento dessas demandas acarreta gastos elevados e não programados.

 

O crescimento dessas demandas prejudica a execução de políticas de saúde, uma vez que o cumprimento das mesmas acarreta gastos elevados e não programados.

 

O objetivo desse estudo é descrever o perfil das demandas judiciais para acesso a medicamentos oncológicos no Brasil.

 

2 METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que segundo Mendes (2008), é um método de pesquisa permite a síntese de múltiplos estudos publicados e possibilita conclusões gerais a respeito de uma particular área de estudo.

Como pergunta norteadora para a busca das pesquisas utilizamos: Qual o perfil dos processos judiciais para acesso a medicamentos oncológicos no Brasil? Como estratégia para recuperação das informações utilizamos o acrônimo PICo, onde consideramos a população, ou o paciente ou o problema abordado = Indivíduos/pacientes/usuários que necessitam de medicamentos nos sistemas de saúde, o fenômeno de interesse = Ações judiciais para acesso a medicamentos via sistemas de saúde e o contexto = medicamentos para câncer.

Os documentos foram recuperados no portal Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Foi estabelecido como critério de exclusão, os artigos não disponíveis na íntegra, artigos de revisão integrativa e/ou sistemática, monografias, dissertações e teses. Como critérios de inclusão, foram incluídos os artigos originais disponíveis online na íntegra, nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola e que respondessem à questão da pesquisa.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A revisão integrativa teve como amostra dezoito estudos primários, publicados entre os anos de 2011 e 2020, sete estudos foram excluídos na leitura do título e cinco foram excluídos após a leitura do resumo, quatro documentos foram excluídos por se tratarem de dissertações, teses, revisões ou relatórios. Após leitura do texto completo, três documentos foram incluídos na revisão.

No estudo descritivo de processos judiciais com demandas de medicamentos interpostos contra o Estado de Minas Gerais de julho de 2005 a junho de 2006 realizado por Machado (2011), conforme classificação do grupo anatômico principal do código ATC, 16,4% dos medicamentos eram agentes antineoplásicos e imunomoduladores.

Botelho e Pessoa (2017), que em seu estudo descritivo e retrospectivo analisou os processos judiciais onde a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará foi demandada entre os meses de janeiro de 2013 a dezembro de 2014. O estudo concluiu que dentre os dez princípios ativos mais prevalentes nos processos de 2013 e 2014, 48,32% e 68,56% respectivamente, tinham como indicação o tratamento do câncer.

No levantamento dos registros de compras por via judicial no Distrito Federal realizado por Silva (2017), entre setembro/2014 a agosto/2016, os medicamentos oncológicos foram responsáveis por aproximadamente 24,9% do gasto com medicação não padronizada demandada via judicial.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O crescente número de demandas judiciais para acesso a medicamentos para tratamento do câncer constitui grande desafio para as esferas municipais e estaduais por representarem grande impacto financeiro o que desestabiliza qualquer programação para aquisição de medicamentos padronizados, levando a uma desarticulação nas ações e serviços de Assistência Farmacêutica.

Ao se fornecerem medicamentos por ordem judicial, não está sendo avaliado se aquele tratamento realmente é o melhor em termos de relação custo/benefício, se o indivíduo realmente necessita do medicamento pleiteado e este não pode ser substituído por outro disponível nos programas de assistência farmacêutica do SUS, se o paciente tem condições financeiras de pagar o tratamento ou, até mesmo, o advogado e, ainda, se não estão sendo infringidos alguma lei ou algum princípio fundamental do sistema de saúde. Apenas se cumpre a ordem determinada pelo juiz.

Batistella (2019) pressupõe que o predomínio de ações judiciais por agentes antineoplásicos demonstra a necessidade de se discutir políticas públicas que atendam às necessidades terapêuticas da população, baseado nas mudanças geradas com o crescimento populacional e o aumento das doenças crônico-degenerativas.

É preciso que sejam pensadas e aplicadas estratégias, pelos entes federativos, judiciários e assistenciais, de forma a minimizar os danos da judicialização ao mesmo tempo em que visa o empenho de todos em prol dos que necessitam de tratamento para o câncer.