Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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VIOLÊNCIA INTERPESSOAL CONTRA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ESPÍRITO SANTO: FREQUÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS
Luíza Eduarda Portes Ribeiro, Francielé Marabotti Costa Leite

Última alteração: 2022-02-02

Resumo


Introdução

Na história relatam-se diversas situações de segregação social e discriminações relacionadas às pessoas portadoras de algum tipo de deficiência. Ao longo dos últimos anos, mecanismos de ação para a inserção e proteção destas pessoas vêm sendo incorporados por diversos países no mundo. No Brasil, com a Constituição da República Federativa instaurada em 1988, em seu artigo 23, capítulo II, determina-se que “é competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, cuidar da saúde e assistência públicas, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiências.” Outros instrumentos legais também foram sendo estabelecidos, merecendo destaque as leis: nº 7.853/89 (sobre o apoio às pessoas com deficiência e sua integração social) e nº 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde), bem como, a portaria nº 1.060 que instituiu em 2002 a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência. De acordo com está política, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que em caráter permanente, possui perdas ou anormalidades de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, culminando em incapacidade para o desempenho de suas atividades dentro do padrão considerado “normal” para o ser humano. Os diferentes tipos de deficiência existentes, como a mental, motora, auditiva, visual e múltipla, geralmente, surgem de aspectos relacionados a perda ou ausência; redução; aumento ou excesso e desvio em determinados sistemas do organismo. Em 2004 estimava-se que 15,3% da população mundial (cerca de 978 milhões de pessoas) possuíam algum tipo de deficiência grave ou moderada, sendo os maiores percentuais encontrados na Europa (16,4%) e Sudeste Asiático (16,0%), ficando as Américas com prevalência de 14,1%. No Brasil, tal prevalência se apresentava menor na relação mundial (6,2%) em 2013, mas ainda assim, corresponde à cerca de 12,4 milhões de pessoas, sendo mais prevalente entre indivíduos com idade mais avançada e entre moradores da zona rural. No estado do Espírito Santo a prevalência de pessoas portadoras de algum tipo de deficiência foi de 3,1% em 2013. Dentre as principais dificuldades encontradas por este grupo ao longo de sua vida destaca-se a exposição à acidentes e violências como um grave problema a ser enfrentado. A discussão da violência no campo da saúde pública vem sendo cada vez mais frequente mundialmente, devido a sua amplitude de impacto social e econômico e seu caráter complexo e multifatorial. É caracterizada pela OMS como um agravo de uso intencional da força física ou do poder, real ou sob ameaça, contra si próprio, outra pessoa, um grupo ou uma comunidade e que resulte, ou tenha grande possibilidade de resultar, em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento e privação, podendo ser dividida em três categorias distintas: a) violência autodirigida - comportamento suicida e agressão auto-infligida, cometidas contra si próprio; b) violência interpessoal - violência de família e de parceiros íntimos, e violência na comunidade entre indivíduos sem relação parenteral que podem ou não se conhecer; e, c) violência coletiva - violência social, política e econômica. Em 2019, foram registrados no Brasil, 7.613 casos de violência interpessoal contra pessoas com deficiência no sistema VIVA-SINAN, considerando as pessoas que apresentavam pelo menos um dos quatro tipos de deficiência – física, intelectual, visual, auditiva, presentes na ficha de notificação. Os casos se concentraram entre as mulheres, faixa etária de 10 a 19 anos, com destaque para a violência doméstica. O estabelecimento de informações sobre a violência contra a pessoa com deficiência é de extrema importância para trazer discussão sobre a temática em meios sociais e populares.Além disso, é importante salientar que os profissionais de saúde, na maioria dos casos, são a porta de entrada das vítimas de violência aos serviços de apoio. Sendo assim, é através destes profissionais que se promovem o acolhimento da vítima em seu momento de sofrimento, estabelecimento de apoio psicológico e social-jurídico, bem como prevenção deste agravo e fomento das bases de dados, através da realização da notificação da violência.Objetivo: Identificar a frequência de notificação de violência interpessoal contra pessoas com deficiência no estado do Espírito Santo no período de 2011 a 2018 e os fatores associados às características das vítimas. Metodologia: Estudo transversal realizado com os dados notificados de violências interpessoais contra pessoas com deficiência, disponibilizados pela Vigilância Epidemiológica do estado do Espírito Santo e registrados no Sistema de Informação de Agravos e Notificação (SINAN), entre anos de 2011 e 2018. O ano de 2011 foi escolhido como corte inicial devido ao fato de ter sido o ano em que a violência passou a integrar a lista de agravos de notificação compulsória, tornando universal a notificação deste agravo nos serviços de saúde. Foi realizada uma análise exploratória descritiva para qualificação das variáveis de interesse e correção dos possíveis erros ou inconsistências no banco de dados, seguindo as diretrizes do Instrutivo de Notificação Interpessoal e Autoprovocada.  Também foram verificados, e, posteriormente excluídos, os casos duplicados. As duplicidades foram analisadas a partir da organização dos registros por data de notificação, comparando-se a data de ocorrência, nome da vítima e da mãe e data de nascimento. As variáveis referentes às características da vítima em estudo foram – sexo (feminino ou masculino), faixa etária (0 a 9 anos; 10 a 19 anos; 20 a 59 anos, 60 anos ou mais), raça/cor (branca e preta/parda) e a zona de residência (urbana ou rural/periurbana). Os dados foram processados no programa estatístico Stata versão 13.0 e analisadas por meio da estatística descritiva em frequência bruta e relativa e intervalos de confiança de 95%. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo, sob parecer de número 2.819.597 respeitando todas as normas e diretrizes da Resolução 499/2012. Resultados: Os dados mostram que 65,3% (N=1065) das notificações cometidas contra pessoas com deficiência eram referentes a notificações de violência interpessoal. A faixa etária das vítimas se mantiveram associadas à exposição à violência. As crianças apresentaram 1,64 (IC95%: 1,0-1,79) vezes mais chance de sofrer violência e os idosos 1,52 (IC95%: 1,40-1,64) vezes mais chance quando comparado a indivíduos adultos, apresentando a maior vulnerabilidade deste público dentre as pessoas com deficiência. Considerações finais: O estado Espírito Santo apresentou alta frequência de notificações de violência interpessoal contra as pessoas com deficiência. É possível observar a importância da notificação de agravos para os serviços de saúde, sobretudo a notificação de violência interpessoal e autoprovocada, pois através deste instrumento se torna possível a identificação de fatores importantes associados a este agravo. Isso estabelece subsídios para a formulação de estratégias de enfrentamento e prevenção, bem como desenvolvimento de ações programáticas que possam garantir maior equidade e cuidado humanizado as pessoas com deficiência vítimas de violência.