Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Relato de experiência: exercitando o Controle Social do Sistema Único de Saúde com discentes do primeiro período de Nutrição da UFRJ-Macaé
Júlia Martins Maltez, Amábela de Avelar Cordeiro, Paulo Ricardo Costa de Melo

Última alteração: 2022-02-21

Resumo


A disciplina “Saúde da Comunidade I” compõe a grade curricular do primeiro período da graduação em Nutrição do Centro Multidisciplinar da Universidade Federal do Rio de Janeiro Campus Macaé e tem como principal objetivo apresentar o Sistema Único de Saúde (SUS) aos ingressantes, dispondo de carga horária teórica, prática e extensionista. A carga de extensão permite que os estudantes vivenciem o Controle Social do SUS através de uma atividade elaborada pelo projeto de extensão “Promoção da participação social da comunidade atendida pela APS do município de Macaé”, que é vinculado à disciplina. A equipe do projeto é composta por docentes, monitores e integrantes da Liga Acadêmica de Saúde Coletiva de Macaé (LASCOM) - Núcleo Cebes Macaé. Em 2019, foi realizado um piloto do projeto nos bairros Horto e Barreto do município de Macaé, com a promoção do diálogo entre a academia e as lideranças comunitárias. Em 2021, em função da pandemia do COVID-19, as atividades acadêmicas foram adaptadas ao ambiente virtual, e o projeto criou o “Conselho Local de Saúde da Comunidade”, que passou a constituir o módulo de extensão da disciplina. O presente relato abordará minha experiência enquanto estudante de Medicina e membro da LASCOM na elaboração e participação dessa atividade.

Para a atividade, a turma foi dividida em 4 grupos de trabalho (GTs), de acordo com a localização de moradia dos estudantes, sendo todos os municípios pertencentes ao estado Rio de Janeiro, a saber: Cabo Frio, Campos dos Goytacazes, Cantagalo, Conceição de Macabu, Conceição de Mato Dentro, Cordeiro, Duque de Caxias, Itaocara, Macaé, Magé, Niterói, Nova Friburgo, Nova Iguaçu, Rio Bonito, Rio das Ostras, Rio de Janeiro, São Gonçalo, São João de Meriti, São Sebastião do Alto e Seropédica. A cada grupo foi designado um eixo temático de acordo com os temas desenvolvidos na 16ª Conferência Nacional de Saúde, que ocorreu em Brasília, DF, de 4 a 7 de agosto de 2019, sendo eles: I) Democracia e Saúde; II) Saúde como Direito; III) Consolidação do SUS e IV) Financiamento do SUS. Além dos discentes, estimulou-se a participação da comunidade, com divulgação em mídias locais. Eu participei do GT 3, composto por 07 estudantes moradores de municípios próximos à Macaé (Campos, Rio das Ostras e Nova Friburgo), uma docente, uma monitora e um integrante da LASCOM. Nosso eixo temático foi a Consolidação do SUS. Realizamos 8 encontros síncronos, com duração de 2 horas cada, pela plataforma Google MeetⓇ. Em nosso primeiro encontro, para sensibilização, recorri ao livro “Pacientes que curam: o cotidiano de uma médica do SUS”, da autora e médica de família e comunidade Júlia Rocha, escolhendo um conto intitulado “Para que serve um médico de família?”. Através de palavras carregadas de afeto, Júlia relata a história de Dona Flor, uma idosa que mora em uma comunidade do Rio de Janeiro e enfrenta dificuldades em seu acesso integral à saúde. A partir da leitura, propus que fossem identificadas potências e desafios para a Consolidação do SUS presentes na história, com ênfase no território em que Dona Flor estava inserida. Algumas potências encontradas foram: rede de apoio dos vizinhos, visita domiciliar realizada pela equipe de saúde e alta resolutividade da atenção primária à saúde. Já como desafios, destacam-se a falta de acessibilidade, a não coordenação do cuidado e a desigualdade social. Os encontros seguintes foram dedicados ao compartilhamento de impressões sobre os territórios de cada estudante, suas necessidades em saúde e as formas de organização social local para direcionamento de reivindicações. Como materiais de apoio para o debate, utilizamos o Documento Orientador, disponibilizado na 16ª Conferência Nacional de Saúde, e o “Mapa Falante”, ferramenta construída pelos discentes durante o módulo teórico da disciplina. Os principais desafios identificados pelo GT3 foram: esgoto à céu aberto próximo a áreas residenciais, iluminação precária, sobrecarga de funcionários da Estratégia de Saúde da Família (ESF), dificuldade em encontrar informações sobre o funcionamento dos Conselhos Locais de Saúde, sobretudo durante a pandemia, e falta de interesse da população diante das questões locais de saúde. Posteriormente, os integrantes foram estimulados a elaborar propostas que pudessem contribuir para a solução das situações identificadas e auxiliar na Consolidação do SUS em seus municípios. Para auxiliá-los nessa construção, compartilhamos o Relatório Nacional Consolidado da 16ª CNS a fim de exemplificar a estruturação de uma proposta.

Foram elaboradas, ao todo, 9 propostas, que abordaram importantes pontos como a implementação de ações de saneamento básico; a criação de uma unidade móvel de saúde; o desenvolvimento de um canal virtual para marcação de consultas da ESF; dentre outros. A culminância se deu pela apresentação das propostas em plenária online, com a participação de todos os grupos, o que permitiu que fossem reveladas similaridades e diferenças entre as situações sanitárias dos diversos territórios investigados. A maioria das propostas foi considerada aplicável e algumas tiveram característica inovadora, com a possibilidade de serem levadas aos respectivos Conselhos Locais de Saúde. Ao final da disciplina, foi elaborada uma nuvem de palavras utilizando as respostas dos estudantes para a pergunta “Como saio da disciplina Saúde da Comunidade I?”, dentre as quais destaco “empática”, “consciente”, “crítico” e “humanizada”, que demonstram o impacto positivo da atividade no processo de ensino-aprendizagem. Além disso, mesmo após o fim da disciplina, alguns estudantes deram continuidade ao interesse pela temática, a exemplo de uma discente que participou da Conferência Municipal de Saúde do seu município.

Participar ativamente dessa atividade me proporcionou a aproximação com discentes e docentes de outra graduação, bem como a possibilidade de refletir e aprofundar meus conhecimentos sobre o Controle Social no SUS de outros municípios a partir da visão dos seus respectivos cidadãos. Além disso, foi interessante exercitar a escuta ativa e a mediação de atividades, habilidades comunicativas que contribuirão de forma inimaginável para o meu crescimento não só enquanto indivíduo, mas também enquanto uma futura profissional de saúde defensora de uma saúde pública, gratuita e de qualidade, isto é, da continuidade do SUS. Entendo que projetos como esse, que envolvem graduandos da área da saúde, possuem propostas diferenciadas, porém complementares, confluindo-se a partir da percepção de que desde o início da formação do futuro profissional de saúde, ele já entenda as potencialidades da sua e das demais profissões no desenvolvimento do cuidado, bem como o valor da interprofissionalidade na prática cotidiana do trabalho em saúde, com ênfase na experiência de coletividade e colaboração. Assim como a disciplina “Saúde da Comunidade” da graduação em Medicina me marcou positivamente, mostrando-me a importância do SUS e me incentivando a compartilhar esse conhecimento, torço para que essa atividade também seja uma semente frutífera na vida dos demais participantes.