Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2022-01-03
Resumo
INTRODUÇÃO
Este estudo é parte da pesquisa “Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a população em situação de rua frente à pandemia da COVID-19”, coordenado pelo Grupo de Pesquisa em Políticas de Saúde e Proteção Social do Instituto René Rachou Fiocruz – Minas, financiado pelo edital INOVA: Territórios Saudáveis e Sustentáveis. Um dos objetivos centrais da pesquisa é compreender a organização da rede de cuidados para população em situação de rua (PSR) durante a pandemia, sendo os Consultórios de Rua (CdR) um dos principais equipamentos neste cuidado. Os CdR foram instituídos por meio da Política Nacional de Atenção Básica que em 2011 os integrou como equipamentos de saúde voltados à redução de danos, prevenção e ao cuidado. Foram incorporados também à Política Nacional da População em Situação de Rua a fim de garantir um cuidado à saúde da PSR. Os CdR são compostos por equipes multiprofissionais, com no mínimo seis profissionais de nível superior e médio, com diferentes formações determinadas pelos gestores locais. São financiados pelo Ministério da Saúde e as atividades realizadas de maneira itinerante. Também atuam conjuntamente com outros equipamentos de saúde, como as Unidades Básicas de Saúde (UBS), Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e serviços de urgência e emergência. Na pandemia é possível observar que grupos vulneráveis foram atingidos de forma mais aguda, considerando não apenas seu impacto sobre a doença, mas também os desdobramentos econômicos e sociais causados por ela. Sendo a PSR um grupo de risco para a COVID-19, torna-se fundamental compreender a atuação do CdR em relação a estes usuários, enquanto uma das linhas de frente do cuidado continuado da rede de saúde durante esse período.
OBJETIVO
Descrever a atuação dos Consultórios de Rua durante a pandemia da COVID-19 no cuidado à PSR.
METODOLOGIA
Um levantamento da literatura considerando as experiências dos Consultórios de Rua no Brasil e sua atuação na pandemia levou à identificação de 4 cidades: São Paulo, Maceió, Belém, e Macaé. Estas experiências são descritas a partir de dados secundários disponíveis, que indicam que todos estes CdR implementaram estratégias específicas para a PSR. Somou-se a essas cidades o município de Belo Horizonte, para o qual foram utilizadas as entrevistas semi-estruturadas de gestores e trabalhadores dos CdR, relatos das visitas de campo, bem como atas do comitê de acompanhamento da pesquisa realizadas no período de junho a novembro de 2021.
RESULTADOS
Dentre as cidades selecionadas para o estudo da atuação dos CdR durante a pandemia, no que diz respeito às especificidades municipais dos CdR descritos, destaca-se que os CdR de São Paulo contam com 25 equipes formadas por 595 profissionais, sendo eles médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, auxiliares de enfermagem, agentes de saúde e sociais, administrativo e motorista. Os agentes de saúde são pessoas que superaram a situação de rua, o que gera proximidade no atendimento e cuidado a PSR, considerando a necessidade de vínculos para o trabalho das equipes ser realizado. Atualmente, realizam entre cinco a seis mil atendimentos diários e, apesar de nenhum dos serviços prestados pelo CdR ter sido interrompido na pandemia, houve um enfoque maior na triagem dos sintomas gripais. Enquanto o CdR de Maceió é composto por uma equipe de 40 trabalhadores, dentre eles agentes sociais, artistas, técnicos de enfermagem, terapeutas ocupacionais, psicólogos e técnicos em saúde bucal, atende aproximadamente 60 pessoas por dia. Para além do trabalho itinerante, contam com o “Consultório na sala", um ponto fixo onde fazem o cadastro das pessoas atendidas pelo CdR, administrando melhor a redução de danos e aumentando o apoio social e na pandemia realizaram testes de COVID-19 na PSR que apresentava sintomas gripais. O CdR de Macaé também é composto por uma equipe, formada por 12 profissionais: enfermeiros, médicos, agente comunitário de saúde e assistente social, e atende aproximadamente 50 pessoas por dia, destacando-se o acolhimento nos serviços de saúde e direcionamento dos usuários para o mercado de trabalho. Durante a pandemia, o território coberto pelas equipes foi ampliado. Já o CdR de Belém possui três equipes que totalizam 18 profissionais, formadas por técnicos de enfermagem, psicólogos, enfermeiros e médicos, que atendem aproximadamente 125 vulneráveis por dia. Para além da prestação de serviços, apoiaram a prefeitura no cadastro dos usuários para o recebimento do benefício de distribuição de renda mínima “Bora Belém”(2021), criado durante a pandemia e realizaram também a aplicação de testes rápidos de COVID-19 nos pacientes com sintomas. Por fim, o CdR de Belo Horizonte conta com quatro equipes, compostas por sete profissionais: enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, educadores, redutores de danos e motoristas. Propõe estratégias para uma saúde integrativa que priorize o protagonismo da PSR. No entanto, devido à pandemia, as intervenções e eventos coletivos como passeios culturais, oficinas e outros eventos de aglomeração foram suspensos. O trabalho é realizado em constante contato com outros equipamentos de saúde e assistência da rede de cuidados de BH, em especial com as Unidades de Pronto Atendimento, UBS, CAPS, Defensoria Pública e com o Programa BH de Mãos Dadas. Na pandemia, as equipes realizaram rodízio entre os profissionais alocados nas vans, permitindo menor exposição dos trabalhadores, sem interromper o atendimento aos usuários. Essa estratégia criou um suporte de trabalho fixo para as equipes, nos demais equipamentos da regional, garantindo a manutenção da continuidade e longitudinalidade do cuidado e espaço de trabalho para os profissionais que não estavam em campo. O CdR de Belo Horizonte também fez parte da estratégia de vacinação da PSR, apoiando no planejamento, busca ativa e vacinação in loco, que ocorreu tanto nos equipamentos da saúde e da assistência social, como nas ruas. Observa-se que mesmo com as restrições dos protocolos da COVID-19, todos os CdR mantiveram uma rotina de atendimento, de segunda a sexta-feira, e adicionaram atividades diretamente relacionadas à pandemia como a implementação de protocolos para os pacientes que apresentam sintomas gripais e de COVID-19, encaminhamentos para isolamento social e aos equipamentos de saúde, e contribuição direta para a aplicação das vacinas. Somado a isso, algumas ações específicas de prevenção da COVID-19 foram realizadas por todos os CdR descritos, sendo elas: distribuição de máscaras, água, álcool, lanches e kits de higiene. Realizaram também parcerias com o setor da assistência social, organizações do terceiro setor e sociedade civil, através da distribuição de cestas básicas, de itens de prevenção a COVID-19 e no trabalho de informação da PSR ao cuidado com a pandemia.
CONCLUSÃO
Os casos estudados indicam que os CdR cumpriram um importante papel na rede de cuidado da PSR durante a pandemia. As equipes realizaram um trabalho de linha de frente, de maneira itinerante no território, possibilitando o acesso aos seus serviços e cuidados imediatos, assim como o encaminhamento dos usuários para outros equipamentos da rede. Mesmo com os desafios, mantiveram a sua atuação na rua e, adicionalmente, auxiliaram no processo de vacinação da população, no mapeamento de demandas e nos cuidados preventivos à COVID-19. Este levantamento instiga um estudo mais aprofundado da atuação do CdR com a PSR e sua relação com a rede de cuidado durante a pandemia.
Palavras chaves: Consultórios de Rua, Cuidado, População em Situação de Rua, Pandemia, Vulnerabilidade.