Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
A POLITICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO E A METODOLOGIA LEAN
Maria Helena Teixeira da Silva, Laryssa Carvalho de Amaral, Nilra do Amaral Mendes Silva, Robisom Damasceno Calado, Gabriel Nascimento Santos

Última alteração: 2022-01-11

Resumo


Este resumo é fruto do Projeto de Reestruturação e Implantação da Humanizaçãono Fluxo de Atendimento de Pacientes em Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) -24horas, projeto firmado entre a Universidade Federal Fluminense (UFF) e o Ministérioda Saúde, em 2019 e executado em 2020. Nossa finalidade neste resumo é relatar umapesquisa cujo objetivo foi encontrar interseções de ideias entre a Política Nacional deHumanização e a Metodologia Lean.O que significa humanizar quando estamos nos referindo aos seres humanos? Oque é humanizar o agir humano? O que afinal expressa este verbo? Ele deriva do verbofrancês humaniser, do humano. E humano, por sua vez, deriva do latim, humanus, quepossui dois sentidos: o próprio: relativo ao homem, próprio do homem, que convém oupertence ao homem; e o sentido moral: culto, civilizado, instruído, amável, afetuoso,benevolente, cliente, humanitário. Com certeza, é se aproximando desse segundo sentidoque o verbo humanizar entra no campo dos serviços ligados à saúde. Na área da saúde, aideia da humanização envolve o agir e o pensar do conjunto dos envolvidos no processode saúde e ganhou força com o movimento antimanicomial, no final dos anos 60, nosEUA. Em seguida migrou para a Itália, onde ganhou força com o trabalho desenvolvidopelo psiquiatra Franco Basaglia, nos anos 70 e, posteriormente, se estendeu para váriospaíses, dentre esses, o Brasil em 1978. Nesse contexto, humanizar envolvia reconhecer odireito do paciente psiquiátrico, principalmente o internado, de ser visto e tratado comouma pessoa, com os direitos reconhecidos desde 1946 na Declaração Universal dosDireitos do Homem.
Com o tempo, o conceito de humanização ultrapassou as fronteiras da área dapsiquiátrica e foi adotado em políticas de saúde em vários países e hoje faz parte dadiscussão sobre qualidade no serviço em saúde. No Brasil, em 2003, foi criada a PolíticaNacional de Humanização (PNH), também conhecida como HumanizaSus. Trata-se deuma política para orientar e a viabilizar princípios presentes na fundamentação do SistemaÚnico de Saúde (SUS), quando da sua regulamentação, em 1990. Seu foco é oacolhimento e inclusão do usuário do Sistema no processo de saúde, entendendo-o comouma pessoa e não só como um corpo doente. Segundo a PNH, o usuário do Sistema temdireitos e obrigações no processo de tratamento, como os demais atores deste processo(profissionais de saúde e gestores). Implantar tais orientações não se dá em curto prazo,pois trata-se de um processo educativo e formativo e do desenvolvimento de uma cultura.Manter, desenvolver e incrementar uma política, como a PNH, é uma tarefa que exigetempo e não se extingue com o tempo. Por isso mesmo, ao longo do tempo, essas políticassofrem altos e baixos, que são consequências de vários aspectos, tais como, as mudançasde governo, as políticas de corte de recursos, de mudanças nas relações de trabalho, demudanças na gestão do trabalho e dos trabalhadores, no aumento da população usuária,além de outros aspectos ou acontecimentos, como as pandemias. Por isso mesmo, estapolítica, que hoje tem 20 anos, é ainda atual.Com o passar do tempo, o setor público brasileiro passou a experimentarferramentas direcionadas à gestão do trabalho usadas no setor privado. Este foi o caso daMetodologia Lean, conhecida na saúde como Lean Healthcare. A Metodologia Lean éum sistema de gestão, cujo objetivo é melhorar o processo adotando pequenas e contínuasmelhorias. Foi nesse sentido que a UFF assinou com o Ministério da Saúde a realizaçãodo projeto para aplicar ferramentas da Metodologia Lean em 50 UPAs, visando diminuiro tempo improdutivo da permanência dos usuários nas UPAs.O presente resumo relata uma das pesquisas desse projeto, cujo objetivo foiidentificar as intersecções, as coincidências, entre a PNH e a Metodologia Lean. O estudoteve como base a análise dos princípios de ambas. Esta análise resultou em um conjuntode oito intersecções de princípios. A primeira foi o foco no usuário. Na Metodologia Leanaplicada à saúde o cliente é o paciente ou usuário do serviço e este é o foco de qualquerserviço público de assistência à saúde e, portanto, da PNH.A segunda intersecção se refere à importância da ação do coletivo. Tanto na PNHquanto na prática da Metodologia Lean o coletivo exerce um papel central. Na PNH tal
princípio está presente na importância do protagonismo dos principais atores envolvidosna saúde, entendidos como os gestores, os profissionais e os usuários dos serviços dasaúde pública. Na ferramenta Lean também o coletivo é o espaço das reflexões e decisões.A terceira interseção está associada ao princípio de indissociabilidade entre agestão e a atenção a saúde, presente na PNH. Este princípio defende a ideia de que asdecisões da gestão interferem diretamente na atenção à saúde, em outras palavras, noresultado final. Ele encontra espaço no pensamento Lean na importância dada às conexõesentre macro e micro, no planejamento e execução de projetos que levem em conta o todo,onde sistemas e subsistema são partes de uma unidade que deve funcionar como um todo.Por isso a comunicação deve fluir.A quarta interseção se relaciona a diretriz de gestão participativa e cogestão,presente na PNH. Sua interface com a Metodologia Lean pode ser exemplificada no usoda ferramenta Kaizen, que estabelece espaços comuns de discussão e planejamento dedecisões coletivas para a eliminação de desperdícios.A quinta interseção refere-se à valorização do local do trabalho. Na PNH estápresente em uma ideia maior que é o conceito de ambiência. Na Metodologia Lean, emdiversas ideias, em particular, na própria ferramenta 5S, que trabalha com a melhoria eaproveitamento desses espaços.A sexta interseção refere-se à ideia de acolhimento presente na PNH que traz emsi a ideia de inclusão, de ouvir o que é valor para o outro. Na Metodologia Lean tal ideiaaparece como a importância da identificação do que o cliente valoriza, lembrando que ovalor deve ser definido pelo cliente e não pela empresa. No pensamento Lean o foco estáno cliente, logo ele está incluído no processo.A sétima refere a transversalidade. Em ambas, PNH e Lean, para que seusobjetivos sejam obtidos devem se tornar culturas que perpassam de cima a baixo aorganização.A oitava interseção, ressaltamos que ambas, PNH e Lean, se constituem comopropostas para modos de pensar e que interferem no agir. São filosofias que, quandoaplicadas adequadamente, apostam e apontam no crescimento dos envolvidos por meioda intervenção (participação) no processo de trabalho.
Tais intersecções de princípios revelam o potencial para se trabalharconjuntamente a cultura da humanização e o modo de pensar Lean, quando aplicado aosserviços públicos de saúde. Tais coincidências apontam para oportunidades para setrabalhar a cultura da humanização e a cultura Lean utilizando para tal as ferramentaspropostas por ambas. A Metodologia Lean é mais do que um conjunto de ferramentaspara gerar produtividade em seu sentido restrito e acreditamos que associada à PNH podecontribuir para a melhoria de um serviço público fundamental para à população brasileira,especialmente a menos favorecida da sociedade, além e principalmente, de ir ao encontroda Constituição Cidadã de 1988, segundo a qual a saúde é um direito de todos e dever doEstado.