Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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ORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE EM UM MUNICÍPIO RURAL REMOTO NO ESTADO DO PARÁ
Cristiano Gonçalves Morais, Lucas Manoel da Silva Cabral, Marcia Cristiana Rodrigues Fausto, Helena Seidl, Juliana Gagno Lima

Última alteração: 2022-01-16

Resumo


Introdução: As populações que residem em áreas rurais enfrentam dificuldades no acesso à serviços de saúde, em geral concentrados nos centros urbanos. No Brasil, os Municípios Rurais Remotos (MRR) estão localizados em todo o território nacional e nesse contexto a Atenção Primária à Saúde (APS) desempenha papel crucial para viabilizar acesso a saúde dessas populações. Diante disso, o objetivo deste estudo é caracterizar a organização da APS e suas interfaces com os demais serviços da rede assistencial, vis a vis às características contextuais em um MRR da região amazônica, no estado do Pará. Metodologia: Trata-se de estudo de caso, descritivo, com abordagem qualitativa, realizado no MRR de Jacareacanga, pertencente ao estado do Pará, Brasil. Foram realizadas 9 entrevistas semiestruturadas em visita in loco ao município em agosto de 2019. Os roteiros de entrevistas aplicados para cada tipo de informante-chave, permitiram mapear a organização, oferta e disponibilidade de serviços de saúde no município, como também captar as nuances do trabalho e assistência em saúde no contexto rural remoto. Dois grupos de informantes participaram do estudo: (i) gestores (2) (secretário municipal de saúde e coordenador de atenção básica); (ii) profissionais (agente comunitário de saúde (2), técnico de enfermagem (1), enfermeira (3) e dentista (1)). As entrevistas com profissionais foram realizadas em duas Unidades Básicas de Saúde (UBS), uma localizada na sede do município (área urbana) e a outra na área interior (rural).  A análise temática das entrevistas está organizada a partir das seguintes categorias: organização da APS; disponibilidade e distribuição de medicamentos, realização e coleta de exames nas UBS; territorialização/cobertura e estratégias para garantia da força de trabalho em saúde. Resultados e Discussão: O município apresenta grande extensão territorial, baixa densidade demográfica e quase metade de sua população reside dispersamente ao interior do município. A população do município, , constituía-se de índios, brancos e “não brancos”; preponderante os indígenas representavam a maior parte da população do município, residindo nas áreas mais afastadas, se deslocando a sede do município esporadicamente, para questões pontuais como atendimentos em saúde. Nesse mesmo contexto encontra-se os garimpeiros que residem em áreas mais distante, onde realizam o garimpo de ouro, que demonstrou ser uma forte atividade empregatícia que ocorre de forma informal e ilegal na região; a gestão do município também destaca a presença da população ribeirinha, que é atendida na sede do município. Devido a expressiva quantidade de pessoas que residem nas áreas mais afastadas e insuficiente quantitativo de agentes comunitários de saúde, existe uma baixa cobertura da APS. A dispersão populacional contribui para maiores dificuldades na efetivação das ações de saúde no controle de doenças endêmicas, .A questão financeira se torna um ponto chave no município, que recebe royalties de hidrelétricas que atuam na região. Entre os problemas elencados, como típicos da região, destacaram-se as doenças endêmicas: dengue, malária e leishmaniose, também foi possível identificar a ocorrência de problemas envolvendo doenças crônicas não transmissíveis, doenças de veiculação hídrica e respiratória. Na sede do município, existem duas unidades básicas de saúde, um hospital e o laboratório para análises de casos de doenças endêmicas na região (dengue, malária e leishmaniose). Na APS as equipes da estratégia saúde da família: são compostas por médico, enfermeira, técnico de enfermagem, odontólogo e agente comunitário de saúde, na unidade o atendimento ocorre nos cinco dias úteis, fora deste expediente e dependendo da gravidade a população se direciona para o hospital. No interior, os postos de saúde realizam os principais atendimentos, com a equipe formada por técnico de enfermagem, agente comunitário de saúde e um microscopista, os atendimentos também ocorrem durante os cinco dias da semana, no entanto, caso a população precise ocorre, independente da gravidade, atendimentos no posto fora do expediente; e dependendo das circunstâncias e da necessidade há o encaminhamento dos usuários do posto para unidade de saúde na sede, com o acompanhamento feito pelos profissionais do posto. Cabe ressaltar, que nessas áreas costumam ser feitas ações itinerantes descentralizadas que ocorrem periodicamente, além disso a população indígena é atendida pelos profissionais da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI). A falta de profissionais médicos é um problema para o município, gerenciado através de incentivo financeiro oriundo, também, dos royalties de hidrelétricas; nesse contexto o programa mais médico, foi um ponto positivo pois ajudou a fixar o profissional e ampliar o escopo de práticas na APS. Em linhas gerais, na sede há a concentração tecnologias, insumos e materiais dos serviços de saúde do município, que apesar de serem distribuídos aos postos de saúde do interior, persistem disparidades entre a sede-interior. Na sede, ocorrem a maioria dos serviços preconizados pelo Ministério da Saúde e os exames de sangue são realizados no hospital ou laboratório. No interior, a falta de profissionais e estrutura dos postos (que não possuem energia elétrica ou internet constantemente), limita os materiais e serviços de saúde disponíveis, um exemplo disso é a falta de vacinação continua no interior, devido a impossibilidade de manter o acondicionamento de vacinas. Devido às dificuldades para manter equipes completas no interior, o escopo de práticas é, de certa forma, complementado, nas ações itinerantes, onde ocorre os atendimentos do dentista e médico. Uma das estratégias utilizadas pelo município para garantia da força de trabalho em saúde é o emprego de profissionais do município e o incentivo financeiro para os profissionais que trabalham no interior, seja os que atuam fixamente no posto, através do sobreaviso ou os profissionais que participam das atividades itinerantes, que contam com acréscimo no salário. Considerações Finais: A exploração mineral, vegetal ou de recursos hídricos tem marcas espalhadas por todo município de Jacareacanga, tornando-se evidente a relação degradante que o homem pode ter com a natureza e o quanto isto contribui para o adoecimento humano e estragos irreversíveis ao ecossistema local. Os efeitos dessa relação são nítidos no município e se refletem na organização dos serviços de saúde, principalmente, quando considerado que o incentivo financeiro, uma das principais fontes de atração/fixação profissional e de aquisição de recursos, é complementado pelos royalties de hidrelétricas. O extrativismo mineral também influência a economia do município através do garimpo na região que de forma direta ou indireta contribui para a circulação de capital no município, ambas as atividades têm como base a exploração de recursos naturais finitos, o que lança dúvidas quanto às perspectivas futuras de financiamento da saúde no município que ainda sofre com dificuldades de cadastro das pessoas. Na sede, o fato de o hospital ser a referência para a população no que diz respeito à resolução de problemas de saúde, demonstra lacunas na atuação da APS. No interior, mesmo diante de estratégias para facilitar o acesso a serviços de saúde, as fragilidades estruturais, falta de recursos humanos e insumos comprometem a execução das atividades dos programas comuns da APS, também se evidencia a ênfase nas ações de caráter curativista. Apesar do protagonismo do agente comunitário de saúde e do técnico de enfermagem, profissionais que são fixos nessas áreas, se torna evidente a sobrecarga de trabalho e a prática de múltiplas funções com fins de prover assistência em saúde para a população.

 

Palavras-chaves: APS, Município Rural Remoto, Amazônia