Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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PROPOSTA 2: DILEMAS ENTRE DESINDUSTRIALIZAÇÃO E O SETOR SAÚDE
Dorival Fagundes Cotrim Junior, Lucas Manoel Da Silva Cabral, João Daniel Daibes Resque, Felipe Dutra Asensi

Última alteração: 2022-01-20

Resumo


Apresentação. A crise global provocada pela pandemia da Covid-19 despertou o resgate dos debates referentes à falta de capacidade produtiva e às deficiências da indústria nacional do setor de saúde. Ainda que essas deficiências possam parecer um problema recente, dada a emergência da crise no contexto atual, na realidade remontam há pelo menos três décadas, onde se verifica o começo do declínio da participação da indústria nacional no Produto Interno Bruto (PIB), acompanhada de um acentuado desmonte da planta industrial brasileira, que até então parecia ser uma questão mais recente, o que vem se demonstrando falso à medida que se progrediu nas leituras. O Brasil, até precisamente 1980, detinha o oitavo maior parque industrial entre os países capitalistas do globo, mas,a partir de então, ocorreu uma série de mudanças macroeconômicas que acabaram transformando radicalmente todo esse cenário. Dentre as razões estão (i) a década perdida de 1980, verdadeiro desastre econômico, ainda sob a pressão da Ditadura Militar; (ii) os anos de hiperinflação e crise econômico-política, marcados pelos anos do Governo Collor e sua saída; (iii) em seguida, tivemos as políticas relacionadas ao Plano Real, caracterizadas por juros exorbitantes, câmbio fortemente valorizado, dívida pública e baixo investimento. Além disso, outros fatores contribuíram para a desidratação do planejamento econômico desenvolvimentista empreendido no país ao longo de muitas décadas, dentre os quais: (i) fortes choques externos, que acabaram demonstrando as possíveis fragilidades da economia nacional (os dois choques do petróleo, 1973 e 1979); (ii) as dificuldades fiscais, beirando a falência; (iii) e as pressões provenientes dos países capitalistas centrais. Métodos. A pesquisa foi desenvolvida a partir de uma metodologia histórico-estruturalista, baseada na ideia da relação centro-periferia, com dois eixos (ou áreas) temáticos: análise da inserção internacional (dependência como condicionante externo) e análise dos condicionantes estruturais internos (dependência como condicionante nacional – o chamado Padrão de Reprodução do Capital, do crescimento e do progresso técnico; e das relações entre estes, o emprego, a distribuição de renda, o bem-estar coletivo e a saúde), considerando o plano da análise das necessidades e possibilidades de ação estatal (refundar o estado desenvolvimentista e fornecer subsídios técnicos). Em seguida, apresentamos uma reflexão-critica com base na literatura existente em torno da temática da refundação do Estado desenvolvimentista, apresentando os dilemas entre o neoliberalismo, a desindustrialização brasileira e os efeitos da pandemia de Sars-CoV-2 (novo coronavírus). Resultados. O estudo investigou as causas do processo de desindustrialização do País e em que medida o neoliberalismo contribuiu para esse processo. Analisou em que medida essa desindustrialização afetou negativamente o enfrentamento da pandemia de Covid-19 e as consequências para o complexo industrial da saúde, tendo como hipótese que a situação atual permite apontar que não há observância de direitos fundamentais pelo país, quais sejam, o direito à soberania sustentável e o direito ao desenvolvimento. Resumiu-se o projeto desenvolvimentista em quatro eixos estruturais: (i) a industrialização integral é a via de superação da pobreza e do subdesenvolvimento brasileiro; (ii) não há meios de alcançar uma industrialização eficiente e racional através da espontaneidade das forças de mercado, apenas com planejamento do Estado; (iii) este planejamento deve definir a expansão desejada dos setores econômicos e os instrumentos de promoção dessa expansão; e (iv) o Estado deve ordenar também a execução da expansão, captando e orientando recursos financeiros e promovendo investimentos diretos e indiretos nos setores, juntamente com a iniciativa privada. O desenvolvimentismo é central para o trabalho de refundação republicana do Estado, entendido como o processo de retomada dos valores fundacionais do corpo político que se encontram em processo de corrosão e desgaste, atualizando-os em face da nova realidade. A partir dos estudos empíricos trazidos, avaliou-se a possibilidade e a necessidade de construção de uma política econômica industrial soberana no País voltada para a promoção do bem-estar social e do direito à vida, a partir da proposição de uma agenda de desenvolvimento soberano, inovador e sustentável, com ênfase no setor saúde, mobilizando o conceito de Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS). A formulação e a implementação dessa política soberana devem romper as constrições da ideologia neoliberal, uma das causas do processo de desindustrialização brasileira, muito danoso ao País, especialmente em tempos pandêmicos. A pandemia torna patente o fato de que o Estado brasileiro, especificamente o SUS, precisa estar alinhado com a agenda do desenvolvimento produtivo, uma vez que maiores investimentos no setor de saúde produzem melhores resultados em termos de desenvolvimento. Considerações Finais. A industrialização se mostra relevante, especialmente no setor saúde, para que seja possível diminuir o grau de dependência estrangeira, e consequentemente fortalecer a soberania nacional (entendida como um valor e um direito a ser forjado politicamente) e ainda cortar custos na produção. Percebem-se, assim, os sólidos vínculos entre desenvolvimentismo, industrialização e soberania, só alcançada a partir do aperfeiçoamento dos dois primeiros fatores aqui mencionados. É imperioso subordinar o setor produtivo industrial às estratégias desenvolvimentistas, de bem-estar social e do direito à vida. Ou seja, a nova política industrial socioeconômica orienta-se no sentido da produção e reprodução da saúde, da integridade física, psíquica, emocional, beneficiando concretamente a vida da população. Deve ainda considerar os potenciais produtivos de cada região do País, compreendidas a partir de estudos com dados concretos, garantindo maior eficiência no campo de CT&I. A integração com o setor de serviços é condição essencial para o sucesso da nova política desenvolvimentista, mas sem perder a particularidade do setor industrial, qual seja, a inovação, tanto para o aperfeiçoamento de bens já existentes quanto para a criação do novo. É ainda imprescindível a superação da falsa dicotomia entre economia e saúde, especialmente em tempos de pandemia de Covid-19, que se expressa na possibilidade de o País produzir em larga escala máscaras, testes de detecção, respiradores (equipamentos de saúde no geral) e medicamentos, além da possibilidade de licenciamento compulsório para a produção escalonada de medicamentos contra a Covid-19. Por fim, com base em toda a discussão fática e adicionando o elemento de filosofia política republicana, demonstrou-se a possibilidade/necessidade de refundação do estado desenvolvimentista sob a orientação de quatro grandes direitos: direito à vida, ao bem-estar, ao desenvolvimento e à soberania.
Palavras-chave: Industrialização; desindustrialização; neoliberalismo; Covid-19; setor saúde.