Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Diagnóstico epidemiológico e assistencial do câncer infantojuvenil no Brasil.
Michele Gonçalves da Costa, Carolina Steinhauser Motta

Última alteração: 2022-01-28

Resumo


No Brasil, a incidência de câncer infantojuvenil (0 a 19 anos), de acordo com os dados do Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva para o triênio 2020-2022, é de 8.460 casos novos por ano, com a taxa de 138,4 por milhão. O câncer infantojuvenil é a primeira causa de morte por doença entre 1 e 19 anos no país.

Considerado um problema de saúde pública, o câncer infantil requer diagnóstico e tratamento em tempo oportuno, por ser mais raro e, em geral, mais agressivo, a principal aposta é o diagnóstico precoce e tratamento de qualidade para melhorar as chances de cura, que em países desenvolvidos podem chegar a até 80%.

No contexto nacional, em um país com dimensões continentais, as informações regionais e estaduais sobre o perfil do câncer infantojuvenil e o acesso ao tratamento são primordiais para a compreensão do estágio em que estamos. O objetivo deste trabalho é consolidar os dados sobre incidência, mortalidade e morbidade no Brasil, para utilizá-lo como ferramenta nacional de advocacy.

Trata-se de um trabalho de caráter descritivo, transversal, documental com abordagem quantitativa. As análises foram realizadas com os dados mais atuais disponibilizados nos sistemas de informação sobre mortalidade, os dados populacionais, dados de estabelecimento de saúde, registros de câncer de base hospitalar e populacional. As informações analisadas são até o ano de 2019, extraídas dos bancos de dados no primeiro semestre de 2021 e tabulados no software Excel.

As taxas de mortalidade foram calculadas a partir das informações dos óbitos por câncer infantojuvenil extraídas do Sistema de Informação sobre Mortalidade e de projeções populacionais. Para as taxas segundo raça/cor, em razão de não existirem projeções populacionais estratificadas para essa variável com a faixa etária adotada, consideramos os dados populacionais do Censo Demográfico 2010, multiplicando-o para os anos analisados. Todos os dados são referentes a população de 0 a 19 anos. As informações dos Estados Unidos foram coletadas do National Center for Health Statistics. As taxas de mortalidade foram ajustadas por idade, pelo método direto, usando como referência a população padrão mundial.

Construído de forma colaborativa com especialistas em câncer infantojuvenil, a proposta da pesquisa se estrutura em três etapas: 1) avaliação do material prévio, bases de dados, publicações disponíveis, regulamentos e normas em oncologia e saúde infantil; 2) extração e análise de informações, integrando conteúdos contextualizados e comentados; 3) lançamento bienal e divulgação em reuniões, palestras e outros eventos para stakeholders, fornecedores, pesquisadores e gestores.

Dos resultados encontrados, cabe destacar a taxa de mortalidade por câncer infantojuvenil, que se mantém estagnada. No período de 2000 a 2019, a redução foi ínfima, em 2000 a taxa era de 43 óbitos por milhão, em 2019 de 42 óbitos por milhão de crianças e adolescentes. Nos Estados Unidos, a redução da taxa é mais expressiva, de 28 para 22 óbitos por milhão no mesmo período. Apesar das diferenças econômicas, políticas, culturais e históricas entre os dois países, a comparação das taxas demonstra a possibilidade de melhorar o cenário, reduzindo a mortalidade a partir do diagnóstico e tratamento precoce.

Quanto à mortalidade específica, consideramos para cálculo o período de 2015-2019. Na análise por idade, a taxa é mais elevada entre os adolescentes, de 15 a 19 anos, (51,1/milhão), seguida de crianças de 0 a 4 anos (46,9/ milhão). Nas faixas etárias de 5 a 9 e 10 a 14, os valores são próximos: 37,9 e 37,1 por milhão, respectivamente.

Na análise segundo raça/cor, as disparidades raciais se refletem nas taxas mais altas entre crianças e adolescentes indígenas: 67,7 por milhão. Na região Norte, a taxa chega a 86,8 óbitos por milhão, o dobro, da mortalidade geral de câncer infantojuvenil do país, que no período analisado é de 43,4 por milhão.

Em termos de classificação por tipo de câncer, segundo a Classificação Internacional de Câncer na Infância -CICI-3, o diagnóstico preciso ainda é um desafio com 8,1% dos casos classificados como neoplasias não especificadas, segundo os dados do Registro de Câncer de Base Populacional de 2008 a 2016. Nos Estados Unidos, esse valor é inferior a 1%.

Na análise dos dados disponíveis nos Registros Hospitalares de Câncer (RHC) de 2010 a 2017, cabe destacar o alto índice de tratamento de adolescentes em hospitais não habilitados, 43% dos pacientes entre 15 e 19 anos foram tratados em hospitais sem habilitação em oncologia pediátrica, contrariando as orientações nacionais e internacionais, que indicam o tratamento em centros especializados para esse público. Sobre o diagnóstico histopatológico, um importante indicador positivo do grau de certeza de um tumor, o cenário nacional é melhor: 88,9% dos casos do Registro Hospitalar de Câncer tiveram a confirmação microscópica – sendo o maior percentual na região Norte (91,4%) e o menor no Centro-Oeste, (81,5%). Entre os estados, o percentual mais baixo foi observado em Goiás (36,7%) e os maiores (100%), em Amapá e Roraima.

O acesso ao tratamento oncológico é um aspecto que merece destaque. A partir dos dados do RHC, observamos que nas regiões Norte e Centro-Oeste, o deslocamento de usuários em busca de assistência em estados fora da região de residência é maior. As regiões também possuem o menor número de serviços habilitados em oncologia pediátrica (de acordo com a Portaria nº 1399 de 17 dezembro de 2019) e de médicos com habilitação em oncologia pediátrica registrados no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Destas mesmas bases de dados, temos que a região sudeste concentra maior número de serviços em oncologia pediátrica e profissionais. Em consonância, São Paulo é o estado que mais recebe crianças e adolescentes vindos de outros estados para o tratamento de câncer, 70,4%.

Quanto à qualidade da informação, a maioria (75%) das variáveis obrigatórias para preenchimento no Registro Hospitalar de Câncer apresentaram completude considerada excelente no âmbito nacional. O acesso à informação de qualidade é fundamental na formulação de estratégias em prol do aumento das chances de cura para crianças e adolescentes brasileiros. Neste sentido, o Panorama de Oncologia Pediátrica é um instrumento que pode orientar a formulação de políticas públicas equânimes que oferecem maiores chances de cura para todas as crianças e adolescentes.