Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
BARREIRAS DE ACESSO E SEUS IMPACTOS NOS CAMINHOS DO CUIDADO DE PESSOAS QUE VIVEM COM HIV/AIDS
Talita Miranda Pitanga Barbosa Cardoso, Ana Beatriz Barros Ferreira da Silva, Rocío Andrea Cornejo Quintana, Caroline Raíza Dourado Lima, Magno Conceição das Mercês, Silvana Lima Guimarães França, Marcia Cristina Graça Marinho, Marcio Costa de Souza

Última alteração: 2022-02-23

Resumo


INTRODUÇÃO

A compreensão das barreiras de acesso é essencial para entender os itinerários terapêuticos e produção do cuidado em qualquer processo que envolva questões relacionadas à saúde. Vale ressaltar que o conceito de acesso à saúde é complexo e multidimensional, visto que não se restringe exclusivamente ao uso, mas à liberdade em acessá-lo em tempo oportuno e a capacidade de atender às necessidades singulares de cada indivíduo.

Estas barreiras podem ser de natureza geográfica que se expressam no desafio do deslocamento; organizacionais, relacionadas à oferta de serviço e processos de trabalho; estruturais, ou seja, envolvidas com o acesso arquitetônico aos serviços de saúde comprometendo a acessibilidade a pessoas com deficiência; econômicas, custos/despesas relacionados ao processo de cuidado; comunicacionais, existentes quando não há informações e publicização de fluxos terapêuticos e caminhos na rede; relacionais, que se revelam por meio da produção dos encontros entre trabalhador/usuário proporcionando múltiplos afetos e afecções durante a construção de trilhas e/ou itinerários terapêuticos que podem ser agravadas pelas questões raciais e de identidade de gênero.

Há, ainda, trabalhos que descrevem barreiras de acesso decorrentes da discriminação em consequência da vulnerabilidade da vida de qualquer outro que há uma relação de poder e dominação a partir de uma visão de autonomia individual ou soberania irrestrita. O não reconhecimento da precariedade da vida de todos dá lugar ao desenvolvimento da violência. Nesse contexto, tanto o racismo estrutural e o preconceito quanto à identidade de gênero e orientação sexual, evidenciam-se como importantes barreiras de acesso.

Para entender melhor os caminhos trilhados, alguns pesquisadores têm utilizado estudos que revelam os itinerários terapêuticos (IT) que investigam sobre as doenças, os sofrimentos e aflições enfrentadas por pessoas em cada experiência. Ele tem se mostrado importante ferramenta para a avaliação da integralidade e resolubilidade da rede de atenção à saúde, as quais contribuem para revelar os tensionamentos resultantes da experiência do adoecimento e a busca pelo cuidado por usuários e suas famílias.

O estudo sobre os caminhos do cuidado podem conceder uma compreensão singular e/ou coletiva acerca do processo de adoecimento em toda a sua longitudinalidade, desde o aparecimento dos primeiros sinais/sintomas, em seu diagnóstico, até a maneira pela qual a doença é interpretada pelo enfermo e seus familiares, e sobre como lidam com tal situação.

Assim, este estudo tem como objetivo descrever as implicações das barreiras de acesso à saúde aos caminhos de cuidado trilhados por pessoas que vivem com HIV/AIDS (PVHA) .

Metodologia

Este estudo trata-se de uma revisão de literatura, com período de coleta realizado entre julho e dezembro de 2021. A pesquisa abrange artigos científicos publicados em revistas indexadas com os mais diversos delineamentos, publicados nos últimos 10 anos, nos idiomas português e inglês.

As buscas dos artigos foram realizadas nas bases de dados eletrônicas: Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), PubMed e SciELO (Scientific Electronic Library Online). Foram utilizadas as palavras-chave: Barreiras de Acesso ao Cuidado de Saúde; Continuidade da Assistência ao Paciente; HIV, e suas respectivas traduções em inglês (acrescidas dos operadores booleanos “AND” e “OR”), escolhidas mediante consulta prévia aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). O rastreamento foi realizado por meio das palavras encontradas nos títulos, assuntos e resumos dos artigos.

Alguns filtros disponíveis nas bases de dados foram adicionados para delimitação da pesquisa - textos completos; intervalo de ano de publicação: últimos 10 anos. Os artigos coletados foram selecionados por rastreio dos títulos (primeira etapa), resumos (segunda etapa) e leitura integral (terceira etapa). Posteriormente, foi realizada uma leitura exploratória dos estudos selecionados e, em seguida, leitura seletiva e analítica. O diagrama de fluxo PRISMA foi usado para identificação e seleção dos artigos.

O processo de seleção e extração de dados dos artigos, assim como a identificação dos aspectos metodológicos foi realizado por dois revisores independentes. Quando ocorria algum desacordo entre eles, os revisores liam novamente o artigo na íntegra para reavaliação. Se a divergência persistisse, um terceiro revisor poderia decidir quais estudos deveriam ser selecionados, entretanto, não houve necessidade.

RESULTADOS DA PESQUISA

A implementação das Políticas Nacionais de saúde integral da população negra e LGBT tem se demonstrado serem importantes estratégias de combate ao preconceito e discriminação estruturais em nossa sociedade dessas populações. Diante dessas barreiras, o itinerário, portanto, torna-se não linear, não seguindo os processos formais, as quais se resolvem às vezes com a construção de redes informais desencadeadas a partir das necessidades do sujeito e suas relações. Os privilégios não institucionais podem se aflorar nesse contexto, dando lugar a arbitrariedades de priorização de acesso sem ter a equidade como guia.

Quanto ao impacto dessa realidade, as análises apontam para perdas proporcionalmente maiores entre mulheres na cascata do cuidado. Assim, o acesso ao diagnóstico entre elas é maior, mas a vinculação e retenção nos serviços, a retenção em terapia e a supressão viral são menores em relação aos homens. Além disso, pessoas com idade jovem, cor da pele não branca, profissionais do sexo, privados de liberdade, identidade transgênero, analfabetos, residência rural, uso de álcool/ drogas injetáveis, falta de seguro de saúde, relação insatisfatória com profissionais dos serviços de saúde, dificuldade de transporte e saúde psicológica prejudicada também tendem a ter uma dificuldade de adesão ao tratamento antirretroviral, prejudicando assim a produção integral do cuidado.

Portanto, a consequência da imposição dessas diversas barreiras é a não efetivação do cuidado integral. Como estratégia a formação interprofissional, colaborativa e com o conhecimento dos trabalhadores ampliado sobre a linha de cuidado, podem facilitar o acesso, e reduzir os encaminhamentos desnecessários e as demandas reprimidas. Ademais, estimular o efetivo trabalho em rede através da articulação entre os trabalhadores dos diferentes níveis de atenção e otimização do apoio matricial por meio de especialistas consultores.

Outro caminho a ser trilhado é na publicização de fluxos assistenciais e o estímulo ao fortalecimento de uso de tecnologias leves relacionais e fortalecimento dos vínculos trabalhador-usuário e usuário-família-comunidade permitindo um alavancar da produção de cuidado. Tais estratégias permitem o estímulo da autonomia para o autocuidado, valorizando os encontros ocorridos, afetos e afecções desencadeadas no cotidiano como processo micropolítico para a qualificação deste e redução das iniquidades.

Importante ressaltar que, fatores ligados à gestão dos serviços também interferem nos IT como agendas lotadas, falta de tempo, estrutura deficiente com número reduzido de consultórios, pouco espaço, ventilação inadequada, número de profissionais insuficiente, elementos interligados que denotam uma deficiência importante no planejamento das ações e nos serviços para a atenção das PVHA.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, é preciso considerar a perspectiva de valorização do cuidado abrangendo a vida e os modos de viver de cada indivíduo, criando ambiente de confiança e empatia com mais fluidez nas relações que possibilitem a visibilização de uma dimensão subjetiva no cuidar.

Além disso, a construção de ações efetivas de acolhimento para acolher as PVHA e consequentemente vencer a barreira da continuidade do tratamento e prevenção ao abandono também foi um fator apontado por usuários de serviços de saúde como algo que afasta o ser vivente do seu cuidar. Dessa maneira, percebe-se o quanto os itinerários terapêuticos sofrem intervenções diretas por fatores ligados às fragilidades apresentadas na RAS e suas articulações, além de questões imanentes aos processos subjetivos de cada ser. Essas tessituras precisam estar imbricadas num mesmo propósito para se alcançar a resolubilidade das necessidades singulares de saúde.