Este relato visa compartilhar a experiência de uma ação de promoção e prevenção de saúde na atenção primária, por meio da inserção de um Programa de Estimulação da Fala e da Linguagem (PEFL) para crianças com queixas de atraso de fala e linguagem, enquanto aguardam a assistência especializada.

Considerando que o indivíduo se insere na linguagem por meio das interações sociais, a pandemia da COVID-19 trouxe prejuízos significativos no desenvolvimento infantil, decorrentes da restrição social, que impossibilita o acesso a creches ou escolas presencialmente. Isso resulta na inserção destas crianças no ambiente doméstico em tempo integral, gerando um aumento no tempo de telas, sobrecarga de pais e responsáveis, e ainda a fragilização da rede de apoio.

Em 2021, são retomadas as atividades paralisadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), Escolas e Organizações Sociais Civis (OSC), e como reflexo das medidas restritivas, surge a elevada demanda de crianças com atraso no desenvolvimento.

Desse modo, os equipamentos de saúde, sobrecarregados, encontram dificuldades em acolher e avaliar os casos com agilidade para propiciar uma intervenção precoce. Foram identificadas demandas não apenas de queixas fonoaudiológicas, mas sim do desenvolvimento global infantil, necessitando de avaliação e intervenção multidisciplinar, entre residentes multiprofissionais da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em conjunto com os profissionais da UBS, resultando na idealização e implantação do PEFL na Atenção Primária à Saúde (APS).

Este programa tem o propósito de oferecer assistência para famílias de crianças com queixas de atrasos de fala e linguagem, sem diagnósticos prévios e com suspeitas diagnósticas já encaminhadas para serviços especializados. Ademais, auxiliar e instruir os pais sobre o brincar, acolher suas angústias, abordando as temáticas: compreensão do diagnóstico, inclusão social, desenvolvimento geral da criança e culpa parental.

O programa foi estruturado para atender aproximadamente 5 crianças (18m-4a) e seus responsáveis em cinco sessões semanais consecutivas, divididas em duas partes sendo inicialmente um diálogo entre representantes da equipe multiprofissional e responsáveis, enquanto os filhos participavam das atividades lúdicas, e em seguida os responsáveis e crianças simultaneamente, com os profissionais para instruir e orientar a atividade.

A programação foi elaborada para contemplar os pilares mais relevantes sobre o desenvolvimento infantil, sendo eles: desenvolvimento neuropsicomotor, estímulos sensoriais táteis, auditivos, alimentação, jogos simbólicos, e atividades extra grupo, com a aplicação das orientações e atividades de cada sessão, registrando os avanços e desafios e propondo reflexões sobre a criança e seus responsáveis, e estes entre si.

Como resultado, houve ampliação do olhar do desenvolvimento como algo “global”, alcançando expectativas coerentes, diminuindo frustrações parentais, melhorando a comunicação, concentração, interação, experiências sensoriais e repertório motor das crianças. Os responsáveis se mostraram mais confiantes para brincar com seus filhos, com um maior repertório lúdico, utilizando materiais do cotidiano, e ainda houve diminuição na oferta de telas.

A experiência relatada demonstrou a importância de ações de promoção e prevenção na APS, que possibilitam uma avaliação e atendimento qualificado dos casos, de acordo com a demanda de cada família, refinando os encaminhamentos para os serviços especializados e ainda fortalecendo o vínculo das famílias com a UBS.